Os escritores que o Papa Francisco mais aprecia são, de um modo geral, amplamente conhecidos e encontram-se editados em Portugal. É o caso de, por exemplo, Friedrich Hölderlin, Fiódor Dostoievski e Jorge Luis Borges. Mas há um autor que raros sabiam existir até Jorge Mario Bergoglio falar dele: Nino Costa, um italiano do Piemonte, que viveu entre 1886 e 1945. Escreveu um dos poemas que mais comove o Papa Francisco: “Rassa nostran-a”. Citado pelo Papa em 2015 numa homilia em Turim, o texto é dedicado aos piemonteses que trabalham fora da Itália e homenageia o pai do poeta, que emigrou para a Argentina, onde morreu. Também os avós e o pai de Jorge Mario Bergoglio rumaram do Piemonte para a Argentina. O navio Regina Mafalda, em que embarcariam, se não tivesse sido adiada a data agendada para a partida, afundou-se. Marilù Simoneschi, autora de um livro sobre Rosa Margherita Vassalo, a avó do Papa, explica que esta ocorrência seria por si só suficiente para compreender a enorme atenção e sensibilidade de Francisco para com os migrantes.
Quando há poucos meses, em Novembro do ano passado, Francisco foi a Asti para se encontrar com Carla Rabezzana, uma prima que celebrava o 90.º aniversário, a jornalista Almudena Martínez-Bordiú, da ACI Prensa, lembrou que o Papa tinha aprendido com a avó Rosa, em piemontês, dois poemas de Nino Costa: “Rassa nostran-a” e “La Consolà”, dedicado a Nossa Senhora da Consolata.
“Muitas vezes repito mentalmente dois poemas de Nino Costa e isso comove-me”, afirmou Jorge Mario Bergoglio, contando que o piemontês, ensinado pelos avós, é a “sua língua” desde a infância.
Carla Rabezzana disse que era em piemontês que falava frequentemente com o primo e testemunhou o afecto de Francisco pelo Piemonte, considerado por ele como terra sua e não apenas dos pais e dos avós. A valorização das raízes familiares, designadamente as dos avós, é algo que, em diversas ocasiões, Francisco tem recomendado.
Num texto sobre a referência a “Rassa nostran-a”, de Nino Costa, na homilia do Papa em Torino, Albina Malerba e Giovanni Tesio assinalam que o escritor nunca visitou os piemonteses da Argentina, mas o poema consegue fazer o retrato “mais lúcido e certamente apaixonado” pelo fenómeno migratório do Piemonte – “uma história até recentemente quase desprovida de uma narrativa, ao contrário das migrações de outras partes da Itália”.
Os autores notam que, quando se conheceu a notícia da eleição do Papa Bergoglio, se registou uma “explosão de alegria que ‘uniu’ num instante duas partes do mundo, a piemontesa e a argentina”, o que não teria sucedido “sem a persistência de uma memória ainda não obscurecida e conquistada pelo esquecimento”.
Os versos de “Rassa nostran-a” concorreram para que se mantivesse a “luz memorável da verdade”.