
No dia 14 de dezembro, será descerrada uma lápide à porta da Capela do Rato, evocativa da vigília de 1972, a que se seguirá um debate entre organizadores e participantes da iniciativa. Foto © Agência Ecclesia.
A Vigília da Paz que teve lugar nos dias 30 e 31 de dezembro da 1972 será recordada através de várias iniciativas organizadas pela Comissão das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, que vão ter lugar durante o mês de dezembro e janeiro, em Lisboa. “É fundamental dar a conhecer momentos como este, em que aquilo que era essencial no regime, as colónias e a guerra colonial, foi posto em causa por vozes católicas”, explicou ao 7MARGENS a comissária, Maria Inácia Rezola.
“Em plena época marcelista, esta tomada de posição de jovens católicos e a sua abertura a uma colaboração mais estreita com outras organizações abriu perspetivas novas ao desenvolvimento do próprio catolicismo português, na sequência do Concílio Vaticano II”, refere Rezola, assinalando que, “50 anos depois, são muito poucos os portugueses que conhecem estes acontecimentos. Para quem se habituou a reconhecer a estreita aliança entre a Igreja Católica e o regime do Estado Novo, é fundamental dar a conhecer momentos como este”, em que o regime foi abertamente posto em causa no interior de um templo católico.
As comemorações dos 50 anos da Vigília pela Paz começam no dia 8 de dezembro com a inauguração (às 15h00) de uma exposição evocativa na Igreja de São Domingos (entre o Rossio e a Praça da Figueira, em Lisboa), local escolhido por ter sido ali que a 31 de dezembro de 1968 um grupo de católicos realizou uma vigília pela paz motivada pela situação de guerra em que o país vivia e pela mensagem de Paulo VI para esse Dia Mundial da Paz, intitulada “A Promoção dos Direitos do Homem, Caminho para a Paz”.
Seguir-se-á um colóquio moderado pela jornalista Cândida Pinto, em que intervêm Marcelo Rebelo de Sousa, a ministra da Defesa, Helena Carreiras, o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, o professor Luís Moita e o padre António Janela, atual pároco da Igreja de Sagrado Coração de Jesus e um dos padres presos na Capela do Rato no dia 1 de janeiro de 1973.
A paz é possível

Há 50 anos, a Vigília pela Paz na Capela do Rato respondia à afirmação do Papa Paulo VI de que a paz é possível. Foto © Agência Ecclesia.
Há 50 anos, a Vigília pela Paz na Capela do Rato respondia à afirmação do Papa Paulo VI de que a paz é possível. Os participantes naquele colóquio procurarão responder às interrogações: “E hoje, ainda podemos afirmar que ela é não apenas desejada, mas possível? E concluir, como escrevia Paulo VI, ‘se a paz é possível, [então] ela é obrigatória’? Como construir essa paz que não seja apenas ‘uma transação, um acomodamento frágil e parcial’, aceitando que ‘os homens não seriam capazes de instaurar uma paz melhor’. Ou podemos aspirar a uma verdadeira paz? Torná-la possível e verdadeira?”
No dia 14 de dezembro, às 17h30, será descerrada uma lápide à porta da Capela do Rato (Calçada Bento da Rocha Cabral, 1B) evocativa da vigília de 1972, a que se seguirá, no interior da capela, um debate entre organizadores e participantes da iniciativa com Isabel do Carmo, Francisco Cordovil e Jorge Wemans. O debate, moderado pelo jornalista António Marujo (diretor do 7MARGENS,) incidirá sobre os moldes em que foi planeada a iniciativa que viria a ser brutalmente interrompida pela polícia de choque, bem como elucidar as razões da escolha da Capela do Rato, sucedendo a São Domingos (1969). Os participantes serão também convidados a avaliar até que ponto aquele ato levou a que a denúncia da guerra e a luta anticolonial saltassem para o espaço público, consumando a rutura de muitos católicos com o regime e aumentado as fraturas dentro da Igreja em Portugal.
Na Capela, será também inaugurada uma pequena exposição sobre a comunidade que ali se reunia nos anos setenta do século passado, contendo algumas peças relativas aos acontecimentos de 30 e 31 de dezembro de 1972.
A Fundação Calouste Gulbenkian será o palco para os historiadores António Matos Ferreira, António Araújo, João Miguel Almeida e Rita Almeida de Carvalho situarem a Vigília pela Paz de 1972 no quadro da movimentação anticolonial dos grupos católicos e no contexto do retrocesso da primavera marcelista. O colóquio terá lugar às 10h00 do dia 15 de dezembro e será moderado pelo historiador Paulo Fontes.
Ainda em dezembro, muito provavelmente na noite de dia 30 desse mês, a atual comunidade da Capela do Rato realiza uma vigília recordando essa outra de há 50 anos. Já em janeiro, será inaugurada uma escultura de grandes dimensões da autoria de Cristina Ataíde, no Jardim da Amoreiras, perto da Mãe de Água, o jardim mais próximo da Capela do Rato. A Comissão das Comemorações dos 50 anos do 25 de Abril promete editar um livro reunindo as principais peças destas comemorações, mas o seu programa completo, além de vária documentação sobre a vigília, irá sendo progressivamente acessível no sítio da Comissão.