Foi por causa do presépio do último Natal que esta ideia nasceu: um presépio (o nascimento) no centro do globo, a nossa casa comum. Foi isso que a paróquia de Valongo do Vouga (Águeda, diocese de Aveiro) quis marcar com essa proposta, depois retomada em cada um dos domingos da Quaresma. Uma reflexão animada por Manuel José Marques, que fez o curso de animador Laudato Si’, do Movimento com o mesmo nome da encíclica do Papa Francisco sobre o cuidado da casa comum. O 7MARGENS publica essas reflexões durante a Semana Laudato Si’, que se prolonga até ao próximo domingo, 28, também como forma de desafiar outros grupos, comunidades e paróquias a debater a encíclica do Papa e agir em favor da Criação e da casa comum. Publicamos a seguir a reflexão correspondente ao IV Domingo da Quaresma (19 de Março).

“Dá-me de beber” é também o grito de tantos irmãos e irmãs que não têm água para viver. Foto António Marujo/7MARGENS
Na Eucaristia do III Domingo da Quaresma ouvimos falar de um poço, da água, da vida e pudemos reflectir sobre a mensagem de Jesus como água viva, exprimindo sobretudo a sede do nosso amor. Recordando o mesmo evangelho, também o Papa Francisco na sua homilia, lembrou-nos que o “Dá-me de beber”, é também o grito de tantos irmãos e irmãs que não têm água para viver, enquanto se continua a poluir e a destruir a nossa casa comum, e também ela, exausta e seca, “tem sede”.
De facto, água é vida. Não se conhece qualquer ser vivo que viva sem água. Assim como o ar, é um dos elementos essenciais.
Mas somente menos de 1 % da água existente é água doce disponível e está nos rios, lagos e subsolo. No entanto, segundo a Organização das Nações Unidas, essa quantidade seria mais do que suficiente para suprir as necessidades de toda a população mundial, não fossem as más práticas que conduzem a um elevado desperdício e à poluição deste recurso em todo o mundo. A água pode acabar. De facto, nalgumas regiões, a água ou está imprópria ou já acabou.
Aqui, também podemos verificar essa tendência assustadora. Além da seca que começa a atingir-nos, reparem como exemplo: muitas e muitos de nós já ouviram relatos de pessoas mais antigas sobre a quantidade e variedade de peixes que existiam nos nossos rios. Era tal a abundância que os apanhavam com um cesto, diziam eles. Porventura, muitas e muitos de nós ainda conseguem ter memória de ver robacos e enguias nos rios e ribeiras.
Hoje, em sua substituição vemos plásticos, latas, tecidos, e todo o tipo de lixo, sem falar na qualidade da água. No entanto, os rios são a principal fonte de água potável para as populações humanas.
A água das nascentes que outrora abasteciam as fontes da nossa terra, tornou-se imprópria para consumo. A dos poços, desconfiamos dela e não a consumimos na maior parte dos casos. E a dos furos, embora captada a uma maior profundidade, o que lhe poderia conferir maior segurança e potabilidade, precisa no entanto de ser analisada para nossa garantia.
Em alternativa, optámos por utilizar água captada a grande distância, tratada e bombeada através de uma gigantesca e complexa rede de condutas, novamente sujeita a elevados investimentos.
Não generalizando, também optamos por consumir água engarrafada, que sendo proveniente de locais distantes, tem de ser obrigatoriamente transportada, mais uma vez usando combustíveis fosseis. É um contra-senso. Descuramos os recursos locais.
Não é difícil perceber a origem desta degradação. No entanto, apesar de óbvio, há necessidade de voltar a esclarecer. De tal forma que na carta encíclica Laudato Si’ (LS 29), o Papa Francisco reafirma que, “em muitos lugares, os lençóis freáticos estão ameaçados pela poluição produzida por algumas actividades extractivas, agrícolas e industriais. Não são apenas descargas provenientes das fábricas; os detergentes e produtos químicos que a população utiliza em muitas partes do mundo continuam a ser derramados em rios, lagos e mares”. Acresce a aplicação de agrotóxicos sintéticos, nocivos, tais como insecticidas, fungicidas, pesticidas, além dos danosos herbicidas.
Alterar a qualidade da água é prejudicar a vida do homem e dos outros seres vivos.
Felizmente, há alternativas e meios para termos uma existência equilibrada e de nos respeitarmos a nós mesmos.
Nós somos todos os seres e organismos vivos, somos todo o planeta, somos vida, dom de Deus.
Manuel José Marques é animador de encontros sobre a encíclica Laudato Si’ na paróquia de Valongo do Vouga (Águeda). Textos já publicados:
I Domingo da Quaresma
II Domingo da Quaresma
III Domingo da Quaresma