
Espírito Santo, escultura de João Cutileiro no Hospital do Espírito Santo (Évora). Foto © Manuel Vieira, cedida pelo autor.
“Na vasta obra de João Cutileiro, há uma intermitente, mas persistente, pegada de religiosidade que deixou plasmada em poemas de pedra”, escreve o padre Mário Tavares de Oliveira, cónego da diocese de Évora, num texto que evoca a arte do escultor que morreu no passado dia 5.
No artigo, publicado na agência Ecclesia, Mário Oliveira recorda que se deixou captar pela obra de Cutileiro quando viu, num corredor do Hospital de Évora, “uma singela escultura, um Espírito Santo, esculpido em mármore puro, de alvura feminina”. E comenta: “A simplicidade e a espiritualidade intrínseca desta obra foram um sobressalto inesperado que ainda hoje recordo. Certamente, não será a vertente da religiosidade a que mais sobressai na obra do mestre com origens em Pavia, mas é indisfarçável que há uma espiritualidade clandestina e subterrânea que está presente na obra de João Cutileiro.”
O padre de Évora conta ainda que, há 25 anos, convidou Cutileiro para esculpir um outro Espírito Santo para a igreja de Nossa Senhora de Fátima, do bairro das Corunheiras, nos arredores da cidade. O artista respondeu com uma pergunta: “- Padre: quantos espíritos santos é que há? – Um só, claro! – retorqui. Esboçando um sorriso afável, muito ao seu jeito, lá me foi dizendo: – Pois, o meu já está feito. E como só há um… já não há nada a fazer!”
Cutileiro ainda perguntou sobre a hipótese de fazer um Cristo. Mas essa peça estava encomendada. Mas justificou a razão “É por causa do abraço. Alguém que morre de braços abertos e fica a abraçar a humanidade para sempre, atrai-me muito. É um abraço universal e precisamos disso. E depois…eu também sou JC!…”

Espírito Santo, escultura de João Cutileiro no Hospital do Espírito Santo (Évora). Foto © Manuel Vieira, cedida pelo autor.
Apesar disso, conta ainda, Cutileiro ainda esculpiu uma Nossa Senhora do Ó ou o São João Baptista, da Ribeira do Porto, bem como, afinal, um Cristo, o altar e a via-sacra para a capela do Solar das Bouças, no Minho. “À pedra fria, comunicava-lhe o calor e o afecto, a paixão e o compromisso com todos nós como quem acena, sem impor”, comenta o padre Mário Oliveira, no texto que pode ser lido na íntegra na página da Ecclesia.