
“Terminar algo que nos deu satisfação ou algo que é a concretização dos nossos sonhos pode ser difícil.” Foto © Aron Visuals / Unsplash
Não quero ser ousada ao referir que Cristiano Ronaldo tem um problema. Mas a sua situação sobre o eventual fim de carreira relembra-me que todos nós temos o problema de saber quando terminar bem. Terminar algo que nos deu satisfação ou algo que é a concretização dos nossos sonhos pode ser difícil. Uma realização pessoal conta a nossa história da resiliência e de perseverança. Cada conquista pessoal é o resultado do tempo que investimos nela, em detrimento de outras coisas porventura mais prazerosas de se fazerem. Um prémio ou uma carreira bem sucedida foi escrita com lágrimas, com suor, e até com um esforço cruel que é desconhecido por muitos. E, após tanta dedicação, tudo acabará a certa altura?
A situação de Ronaldo lembra-nos que somos seres finitos e vulneráveis ao ritmo do senhor tempo. Numa geração podemos ser os melhores: o empregado do ano, o aluno mais inteligente, o empresário mais bem pago. Na geração seguinte ou em duas gerações, o nosso nome passará apenas a estar no meio de uma lista com tantos outros nomes. Os nossos prémios ou recordes serão ultrapassados por alguém que tinha como objetivo superá-los. Assim, não é razoável termos dificuldade em sair de cena? A situação de Ronaldo é o problema de todos nós. Não queremos admitir que chega ou chegará um tempo em que o que somos e fazemos é prescindível para o mundo continuar a girar. Pode ser o fim de uma carreira ou apenas o término de um projeto que nasceu nos nossos sonhos. O nosso tempo está contado. Somos frágeis, e outros tomarão o nosso lugar.
Há pouco tempo estudava sobre as emoções de Moisés. Moisés, o grande líder de Israel, que tirou uma nação da escravatura do Egito, não conseguia conceber a ideia de não entrar na Terra Prometida. Ele, que com tantas adversidades e também murmuração de uma nação inteira, aceitou a tarefa de os conduzir pelo deserto até Canaã. E agora “morreria na praia”? Sim. Ele até veria essa terra, mas não entraria lá. O mais fantástico é que a Bíblia não esconde o ressentimento de Moisés. Terminar a carreira não é uma emoção fácil. No entanto, é um passo essencial para que outros possam também ter a sua oportunidade. Nesse mesmo texto, no livro de Deuteronómio, capítulo 3 (3:28), Deus diz a Moisés: “Dá ordens a Josué, e anima-o, e fortalece-o; porque ele passará adiante deste povo e o fará possuir a terra que tu apenas verás.”
Só terminamos em tristeza quando não preparamos outros para tomar o nosso lugar. Moisés poderia não entrar na terra, mas a conquista seria feita de qualquer maneira. Não seria pelas suas mãos, mas pelas mãos de quem ele preparou. Assim, podemos acabar bem se soubermos confiar os nossos talentos e experiência naqueles que escolhemos investir. Paulo, o apóstolo, no final da sua carreira, diz com convicção “Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé.” (Segunda epístola de Paulo a Timóteo, 4:7). Ele pôde dizer isso porque nessa mesma carta não se inibe de dar conselhos ao seu discípulo Timóteo. O ministério de Paulo iria acabar, mas a sua obra iria continuar com Timóteo e com muitos outros depois deste. E continuou até aos dias de hoje, os quais muitos somos participantes agora, e também muitos outros virão após nós, orientados pelo legado que quereremos deixar.
Débora Hossi é gestora de redes sociais; integra a Missão Evangélica Intercultural e considera-se peregrina e apaixonada por Jesus e pelos seus ensinamentos. Contacto: deborahossi@gmail.com