Dois autores, ambos presbíteros com profundas experiências e preocupações pastorais – Valdés é biblista argentino, Bermejo é especialista na pastoral da saúde em Espanha – oferecem em Peregrinar a Jesus um contributo notável para aprofundar as difíceis e exigentes questões relacionadas com a saúde, o sofrimento e a relação de fé. Num livro escrito a quatro mãos, os autores debruçam-se sobre um texto evangélico – nove, no total – para o apresentar como uma Boa Notícia para o crente de hoje. Temas como o mal e a morte, os milagres, a cura, o perdão, a homossexualidade ou o amor aos inimigos são lidos em chave de libertação, quer no comentário atento dos textos proporcionado por Valdés, quer na reflexão psicoespiritual proposta por Bermejo.
Em textos curtos, numa linguagem simples e direta – ambos os autores se dedicam com notabilidade à formação cristã de adultos nos respetivos países, realidade infelizmente muito limitada em Portugal –, Peregrinar a Jesus transporta o leitor para o núcleo evangélico da mensagem do Reino de Deus, uma mensagem de libertação de tudo o que oprime o ser humano. Em questão está a conversão das imagens de Deus que povoam as experiências dos crentes, quer no tempo de Jesus, quer hoje: “Quanto sofrimento humano atribuímos a uma estranha vontade divina e a um raro merecimento humano! Cuidar da interpretação do mal no mundo ainda é uma tarefa inacabada para os cristãos.”
Os comentários bíblicos de Valdés são permeados por uma compreensão das linguagens bíblicas e dos contextos próprios do seu tempo, que ajudam o leitor a acolher os paradoxos evangélicos; as propostas de reflexão pessoal e espiritual de Bermejo, feitas a partir do tema evangélico, conduzem o leitor pelo caminho do desenvolvimento pessoal, da cura interior e das relações que tecem uma comunidade humana.
Não se trata de encontrar argumentos teóricos ou conceptuais diante dos paradoxos do mal, do sofrimento e da morte: “A responsabilidade cristã perante o mal tem mais que ver com renunciar a interpretações sobre a origem da doença e situar-se na esfera das energias individuais e comunitárias para cuidar daquele que sofre.” Peregrinar a Jesus constitui um exemplo, belo quanto arriscado, de que existe um caminho viável e atrativo entre uma linguagem catequética ou teológica – fechada em quadros teóricos ou morais – e as buscas espirituais desvinculadas de uma tradição fecunda, de uma sabedoria ancestral, de uma comunidade viva. Os autores mostram como é possível falar de Jesus de Nazaré e dos textos evangélicos (sobretudo dos mais paradoxais) transportando-os para as experiências concretas de sofrimento e de cura que permeiam o presente. A proposta está feita: cabe ao leitor acolhê-la e frutificá-la na sua leitura.
Peregrinar a Jesus, de José Carlos Bermejo e Ariel Álvares Valdés
Edição: Paulus
136 páginas, € 9,50