
Funeral de um dos menores vítima dos ataques em Gaza. Foto © Ali JadallahAnadolu Agency via Getty Images.
O Tribunal Penal Internacional (TPI) deve investigar os “ataques ilegais” de Israel à Faixa de Gaza cometidos no passado mês de agosto, defendeu a Amnistia Internacional esta terça-feira, 25. A organização divulgou as conclusões da investigação que levou a cabo nos últimos meses, em que foram examinados três desses ataques e encontradas provas de que os mesmos constituem crimes de guerra.
O relatório, enviado ao 7MARGENS e intitulado “Eram apenas crianças: As provas de crimes de guerra durante a ofensiva israelita de Agosto de 2022 em Gaza”, expõe as razões pelas quais esta pode equivaler a crimes de guerra e as circunstâncias em que foram executados três ataques à Faixa de Gaza, dois dos quais levados a cabo pelas forças israelitas, e um, alegadamente, por grupos armados palestinianos.
De acordo com a AI, os dois ataques israelitas provocaram seis vítimas mortais entre os civis palestinianos, sendo que entre as vítimas se incluíam uma criança de 4 anos e um jovem de 22. Quanto ao terceiro ataque, a organização revelou que um míssil lançado por grupos armados palestinianos matou sete civis palestinianos.
“A última ofensiva de Israel em Gaza durou apenas três dias, mas foi tempo suficiente para desencadear novos traumas e a destruição sobre a população sitiada. Os três ataques mortais que examinámos devem ser investigados como crimes de guerra e todas as vítimas de ataques ilegais e as suas famílias merecem justiça e reparações”, afirma Agnès Callamard, secretária-geral da Amnistia Internacional, citada no comunicado divulgado pela instituição.
“As violações que documentámos foram perpetradas no contexto do bloqueio ilegal de Israel a Gaza, um instrumento-chave do seu regime do apartheid. Os palestinianos em Gaza são dominados, oprimidos e segregados, presos num pesadelo de 15 anos em que ataques ilegais recorrentes pontuam uma crise humanitária cada vez mais grave. Para além de investigar os crimes de guerra cometidos em Gaza, o TPI deveria considerar o crime contra a humanidade do apartheid no âmbito da sua investigação em curso nos Territórios Palestinianos Ocupados”, sublinhou ainda a secretária-geral.
Para a realização deste estudo, a AI entrevistou 42 indivíduos, incluindo sobreviventes de ataques, familiares dos mortos ou feridos, testemunhas oculares e médicos. Dado que as autoridades israelitas negaram o acesso da Amnistia Internacional à Faixa de Gaza desde 2012, a organização trabalhou com um investigador no terreno, que visitou 17 locais de ataques e recolheu provas, tais como fotografias e armas destruídas.
Uma casa, um cemitério e um campo de refugiados atingidos
A organização considera ter provas suficientes para avaliar a legalidade de três dos 17 ataques que documentou, sendo por isso estes o foco do estudo. Aquele que a AI acredita ter sido o primeiro destes ataques foi o que matou Duniana al-Amour, uma estudante de artes plásticas de 22 anos, que vivia com a sua família numa aldeia perto de Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza.
O relatório refere que o ataque aconteceu por volta das 15h55 do dia 5 de agosto, quando um projétil disparado por um tanque israelita atingiu a casa al-Amour, matando Duniana e ferindo a sua mãe, Farha, e a sua irmã Areej, de 25 anos. Fotografias de restos de munições permitiram ao especialista em armas da Amnistia Internacional identificar o projétil, uma bala de 120mm, M339, atualmente fabricada pela empresa israelita IMI Systems, propriedade da Elbit Systems.
A Amnistia concluiu que as forças israelitas parecem ter visado deliberadamente a casa da família al-Amour e não encontrou provas de que qualquer membro da mesma pudesse ser considerado como estando envolvido em combate armado.
O segundo ataque reportado ocorreu por volta das 19h do dia 7 de agosto, quando um míssil atingiu o cemitério Al-Falluja em Jabalia, no norte da Faixa de Gaza. O ataque matou cinco crianças: Nadhmi Abu Karsh, 15 anos; e os primos Jamil Najmiddine Nejem, de quatro, Jamil Ihab Nejem, 14, Hamed Haidar Nejem e Muhammad Salah Nejem, ambos com 16 anos. Amir Abu al-Mi’za, de oito anos, foi gravemente ferido.
A Amnistia Internacional não conseguiu encontrar qualquer prova de atividade militar da parte de grupos armados perto do cemitério no momento do ataque e as imagens de satélite dos 10 dias anteriores não mostravam qualquer alvo militar aparente nas proximidades. A ausência de alvos militares aparentes indica que este terá sido um ataque deliberado a civis ou estruturas civis, podendo, portanto, constituir um crime de guerra.
Por fim, o relatório refere o ataque que aconteceu às 21h02 horas do dia 6 de agosto, quando um projétil atingiu uma estrada no campo de refugiados de Jabalia, matando sete civis palestinianos: Momen al-Neirab, com seis anos, e o seu irmão Ahmad al-Neirab, 12; Hazem Salem, oito; Ahmad Farram, 16; Khalil Abu Hamada, 18; Muhammad Zaqqout, 19; e Nafeth al-Khatib, 50.
A Amnistia Internacional acredita que existem provas suficientes para indicar que o ataque ao campo de refugiados de Jabalia foi o resultado de um míssil lançado por grupos armados palestinianos, aparentemente direcionado para território israelita. Os investigadores identificaram vários pontos em comum entre este e ataques anteriores que foram atribuídos a grupos armados palestinianos.
As conclusões do estudo foram já enviadas às autoridades israelitas e à Jihad Islâmica Palestiniana no passado dia 30 de setembro, fornecendo um resumo das suas principais conclusões e solicitando comentários. Até ao momento da sua publicação, a Amnistia Internacional não obteve qualquer resposta das autoridades questionadas.