Aos 101 números, “Le Monde des Religions” deixa de se editar em papel

Capa do último número de Le Monde des Religions em papel, cujo tema de capa é o “regresso das sabedorias da natureza”
“Nas nossas sociedades em que o religioso é constantemente tema de debate, em que a busca de sentido se torna cada dia mais premente, Le Monde des Religions propõe uma descodificação das religiões, espiritualidades e sabedorias da humanidade, numa abordagem laica e não confessional”. A constância e a premência referidos no início do texto agora em destaque no site da revista francesa poderiam indiciar um reforço do trabalho editorial, mas na realidade anunciam apenas o fim da publicação da revista em papel.
No último editorial, a chefe de redacção Virginie Larousse explica genericamente que são as dificuldades enormes com que a imprensa escrita se encontra confrontada desde há anos que impedem que a publicação em papel prossiga. Le Monde des Religions anuncia que os “dossiers temáticos, inquéritos, análises, reportagens, debates e entrevistas com os melhores especialistas” poderão doravante ser encontrados em formato digital no site do Monde. E, garante Virgine Larousse ao 7MARGENS, esta página continuará a apresentar “o mesmo tipo de conteúdos que a revista”, com a diferença de que a versão digital tenderá a ser “enriquecida” com mais frequência. A partir de Setembro, anuncia-se também uma newsletter quinzenal.
Em Portugal, a revista vendia uma média de 150 exemplares por cada número, de acordo com a chefe de redacção da publicação. No total, eram cerca de 20 mil os leitores que pagavam para comprar a revista, de dois em dois meses.
O filósofo André Compte-Sponville, o escritor Christian Bobin e o jornalista e escritor Kamel Daoud foram alguns dos colunistas regulares da revista, que, além dos 101 números bimestrais, publicou números especiais sobre temas como “Os cristianismos esquecidos”, “Mestres de sabedoria”, “O corpo e o sagrado”, “Os mitos” e “Compreender a Bíblia”.
Le Monde des Religions, que se apresentava com o lema “conhecer as religiões para conhecer o mundo”, culmina uma história, recordada por Virginie Larousse no número 100, que começa em 1953 com a revista L’Actualité Religieuse dans le Monde, editada pelos dominicanos franceses. A publicação passa a chamar-se ICI – Informations Catholiques Internationales dois anos depois. Cerca de três décadas depois é retomado o título original que muda em 1998, passando a Actualité des Religions até 2003, ano em que passa para as mãos do grupo Le Monde. A mudança de título para Le Monde des Religions faz-se acompanhar de uma mudança de orientação editorial. A revista confessional católica, que já dava muita atemção ao noticiário sobre outras religiões, torna-se laica de informação sobre as religiões.
“O regresso das sabedorias da natureza” é o tema principal do último número, que ainda é possível encontrar nos quiosques. Nele, pode ler-se ainda uma grande entrevista ao grande rabino de França Haïm Korsia e uma reportagem sobre os muçulmanos da China.
O “mestre de sabedoria” apresentado é o teólogo Maurice Zundel (1897-1975). Entre as afirmações dele em destaque, encontra-se a que fala sobre a presença de Deus no quotidiano: “Não encontro nada de mais simples nem de mais profundo que esta contemplação que de manhã à noite percebe uma presença divina no coração das coisas”. Como que complementando, o monge budista Matthieu Ricard, numa entrevista a propósito do seu livro Émerveillement (“Maravilhamento”) observa que, “quando alguma coisa nos encanta, nós não a degradamos nem a estragamos”.
O monge budista preconiza que se cultive o discernimento, a sabedoria e a benevolência e que se aja em conformidade. Le Monde des Religions oferecia uma boa ajuda para que isso sucedesse.
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