As igrejas vazias podem esconder o vazio de algumas respostas cristãs, diz Tomáš Halík

| 4 Mai 20

Tomáš Halík em 2018, em Lisboa: “Não fomos já avisados pelo que aconteceu quando as igrejas, mosteiros e seminários se esvaziaram?” Foto © Maria Wilton/Arquivo 7MARGENS

 

Os cristãos têm de fazer “uma séria tentativa de mostrar ao mundo um rosto do cristianismo completamente diferente”, se não quiserem que este tempo de igrejas vazias coloque “simbolicamente em evidência o vazio escondido nas igrejas e o seu possível futuro”, escreve o padre e teólogo checo Tomáš Halík, num texto a propósito da pandemia, que as edições Paulinas divulgaram em formato de livro electrónico, que pode ser descarregado gratuitamente.

No breve ensaio O Sinal das Igrejas Vazias, Halík diz que os cristãos andaram “demasiado preocupados em converter o ‘mundo’ (o ‘resto’), e menos preocupados” em converter-se a si mesmos. E isto não significa apenas melhorar-se, “mas passar radicalmente de um estático ‘ser cristãos’ a um dinâmico ‘tornar-se cristãos’.

O texto desenvolve-se em cinco títulos: A Igreja como hospital de campanha; Igrejas vazias como sinal e desafio; Uma exigência de reforma; Onde é a Galileia de hoje?; e Procurar Cristo entre os que procuram.

Logo no início, o autor de Paciência Com Deus escreve: “O nosso mundo está doente. Não me refiro apenas à pandemia do coronavírus, mas ao estado da nossa civilização que este fenómeno global revela. Em termos bíblicos, é um sinal dos tempos.”

No seu diagnóstico, Tomáš Halík diz que a actual abstinência de celebrações e actividades na Igreja deveria ser entendida “como uma oportunidade” para parar e fazer “uma reflexão profunda e empenhada diante de Deus e com Deus”. As igrejas vazias podem ser um sinal e um desafio de Deus e mesmo uma premonição: “Não fomos já avisados, várias vezes, pelo que aconteceu em muitos países, em que as igrejas, os mosteiros e os seminários se esvaziaram ou foram encerrados? Porque atribuímos este fenómeno a influências externas (o ‘tsunami secular’) ao longo de tanto tempo, e não nos demos conta de que se encerrava um capítulo da história do cristianismo, e que era tempo de nos prepararmos para outro capítulo?”

Um “remédio rápido” como a transmissão das missas pela televisão ou internet não será boa solução, acrescenta: “Uma passagem à ‘devoção virtual’, à ‘comunhão à distância’, de joelhos diante de um ecrã, é algo sumamente bizarro. Creio que devíamos, sim, pôr à prova a veracidade das palavras de Jesus: ‘Onde estão dois ou três reunidos no meu nome, aí estou Eu no meio deles.’

Esta premissa permite a Halík sugerir que a ideia de resolver a falta de clero na Europa através da importação de “peças sobresselentes” a partir “de armazéns, aparentemente infinitos, na Polónia, Ásia e África” tão pouco é a solução. Os caminhos são outros, diz: “Devemos obviamente tomar a sério as propostas do Sínodo amazónico, mas, ao mesmo tempo, há necessidade de aumentar o alcance do ministério dos leigos na Igreja (não nos esqueçamos que, em muitos territórios, a Igreja sobreviveu sem clero por muitos séculos).” E a descoberta da contemplação pode mesmo sugerir um “percurso sinodal”, em ordem a “um novo concílio reformador”…

Respostas tradicionais não bastam, defende. “A teologia da libertação ensinou-nos a procurar Cristo nas pessoas que estão à margem da sociedade” e hoje a sociologia mostra que os que se identificam com a religião tradicional ou o ateísmo dogmático estão em diminuição. Pelo contrário, aumenta o número dos que estão “à procura” e dos “apáticos” e é para esses que se devem ensaiar novas respostas.

O teólogo checo é responsável pela paróquia universitária de Praga e professor de Sociologia na Universidade Charles, além de presidente da Academia Cristã Checa. Durante o regime comunista foi um membro destacado da “Igreja subterrânea” e sobre essa experiência escreveu o livro Diante de Ti os Meus Caminhos, a propósito do qual deu uma entrevista ao 7MARGENS.

Halík defende que a Igreja deve continuar a ser um “hospital”, oferecendo “a mesma assistência sanitária, social e filantrópica” que oferece desde o início, identificando os sinais dos tempos, ajudando a criar imunidade contra “os vírus malignos do medo, do ódio, do populismo e do nacionalismo e a ultrapassar “os traumas do passado com o perdão”.

No texto agora editado Tomáš Halík diz: “Estou convencido de que chegou o momento de reflectir sobre como continuar o necessário caminho de reforma, indicado pelo Papa Francisco: não tentar regressar a um mundo que já não existe e, também, não confiar apenas em meras reformas estruturais exteriores, mas ir ao centro do Evangelho, fazer uma viagem ao interior.”

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