
O presidente dos bispos alemães, Georg Bätzing, com o cardeal Parolin. Atrás, o cardeal Marx. Foto © Bischofskonferenz.
Ao dirigir-se hoje, dia 19 de novembro, aos jornalistas reunidos no Vaticano para a conferência de Imprensa em que deu conta da visita ad limina de cinco dias dos bispos alemães que ontem terminou, o presidente da conferência episcopal, o bispo Georg Bätzing, declarou: “As nossas discussões em Roma foram duras, mas civilizadas, e sentimos que é desta forma que o diálogo pode ser proveitoso.”
Na sua declaração, Bätzing sublinhou que “estes encontros foram – como disse um de nossos bispos – ‘um sério teste à sinodalidade’: ouvir, pesar e aceitar que o outro tenha a sua opinião. Não se trata de decidir quem tem o privilégio da interpretação [única], mas sim de prosseguir uma reflexão honesta sobre onde estamos como Igreja e entender o ponto de vista da outra pessoa”. Reconhecendo que “as preocupações e opiniões da nossa Conferência Episcopal sobre um amplo conjunto de temas foram ouvidas”, o bispo mostrou-se reconhecido pelo facto de que “as reservas que existem em Roma tenham sido abertamente expressas” o que lhe permite esperar que “apesar de termos pontos de vista contraditórios, iremos continuar o nosso caminho juntos”.
Em resumo: “Todas as questões foram discutidas, sobretudo a questão de como a evangelização pode ser bem-sucedida diante do desafio de uma época secularizada”, mas constatou-se, mais uma vez, que: “não compartilharmos um ponto de vista uniforme sobre importantes questões teológicas, especialmente no que diz respeito ao caminho sinodal”.
Embora não se tenha alongado sobre quais seriam essas “importantes questões teológicas”, basta ter presente os documentos votados durante o caminho sinodal alemão, bem como as polémicas por eles originados [ver 7MARGENS] para que não sobrem dúvidas sobre quais os temas em questão: o poder na Igreja e a participação de todos os batizados nas decisões eclesiais, o ministério presbiteral; o papel da mulher, incluindo o seu acesso aos ministérios e serviços; e a vida afetiva e sexual com revisão da doutrina sobre a homossexualidade e os divorciados recasados.
O presidente da Conferência dos Bispos Alemães afirmou ainda que não deixava Roma “desanimado”, mas sim “aliviado e preocupado”. Alívio e preocupação que conformam uma “tensão boa”. Alívio, porque todos os “assuntos foram levantados e ninguém pode dizer que não os ouviu nada ou não teve oportunidade de sobre eles se pronunciar”. Preocupação por não “saber dizer que tipo de dinâmica os processos sinodais vão desenvolver.”
Uma coisa é certa: “A Igreja na Alemanha não segue seu próprio caminho e não tomará decisões que só são possíveis no contexto da igreja universal”. Mas, por outro lado, “a Igreja na Alemanha quer e deve proporcionar respostas às perguntas feitas pelos fiéis”, deste modo “vai iniciar as tarefas que os bispos podem concretizar na Igreja local e alimentar as questões relativas ao magistério no processo sinodal global.
A perda de credibilidade e a crise de confiança
O bispo Georg Bätzing foi bem mais incisivo na sua intervenção inicial no encontro que ontem, 18 de novembro, reuniu os bispos alemães com os dirigentes máximos de vários dicastérios do Vaticano na qual sentiu necessidade de referir “o escândalo devastador do abuso sexual de menores” como resultado do clericalismo autoritário, do uso indevido do poder e da exploração da subordinação, confessando-se bastante surpreso por “algumas das conversas tidas durante os últimos dias terem deixado a impressão de que nem todos os interlocutores [no Vaticano] compartilham dessa opinião”.
Já a mesma surpresa tinha surgido “pelo facto de a ‘Carta do Papa ao Povo Peregrino de Deus na Alemanha’ de 29 de junho de 2019 não ter nenhuma referência ao verdadeiro ponto de partida do caminho sinodal: a questão do abuso sexual, do seu tratamento inadequado pelas autoridades da Igreja, do encobrimento pelos bispos e também da contínua falta de transparência demostrada pelas autoridades romanas ao lidar com os abusos”.
Taxativo, o presidente da Conferência dos Bispos Alemães, afirmou depois: “Todos os esforços de evangelização darão poucos frutos se a honestidade radical sobre os erros e as faltas da nossa Igreja não levarem primeiro a uma busca consistente de conversão e renovação em termos estruturais e também na prática eclesiástica. Porque foram as estruturas anteriores que conduziram ao escândalo devastador do abuso sexual de menores.” A saída de “uma das mais graves crises da Igreja e ao mesmo tempo uma das mais graves crises do ministério sacramental dos sacerdotes e dos bispos” só será entreaberta “ganhando uma nova confiança” obtida através “de uma grande mudança na forma como exercemos o nosso ministério, passando a envolver forma séria e tangível, clérigos, religiosos e leigos na tomada de decisões. Isto não se aplica apenas à Igreja” na Alemanha, “mas também na Igreja universal.”
Por memória, Bätzing relembrou as resoluções do caminho sinodal alemão: o textos de orientação “No caminho da conversão e da renovação. Fundamentos Teológicos do Caminho Sinodal da Igreja Católica na Alemanha”; os textos fundadores “Poder e separação de poderes na Igreja – Participação conjunta e envolvimento na missão” e “Mulheres em ministérios e serviços na Igreja”; e os textos de implementação “Participação dos fiéis na nomeação do cargo diocesano bispo”, “Fortalecimento sustentável da sinodalidade“, “Uma reavaliação da homossexualidade no Magistério ” e “Ordem básica do serviço na igreja”. Mas não deixou de referir que “a questão de como podemos viver a fé e ser Igreja hoje é a questão central para o futuro”, porque a sociedade atual ,“por mais secular que seja”, “precisa do testemunho público da fé cristã e de novos impulsos para tornar Deus presente”.