
Rolando Álvarez encontrava-se em prisão domiciliária desde 19 de agosto de 2022, dia em que foi detido pela polícia da Nicarágua. Foto: Direitos reservados.
Após ter recusado o exílio nos Estados Unidos da América e sido condenado a 26 anos de prisão por traição à pátria, o bispo de Matagalpa (Nicarágua), Rolando Álvarez, foi colocado em La Modelo, uma prisão onde se encontram vários presos políticos do regime de Daniel Ortega. Segundo o jornal nicaraguense Despacho 505, fontes da Igreja Católica informaram que o bispo está numa cela de segurança máxima, conhecida como El Infiernillo, em permanente escuridão e com temperaturas que rondam os 40 graus.
Rolando Álvarez encontrava-se em prisão domiciliária desde 19 de agosto de 2022 e tinha julgamento marcado para o passado dia 15 de fevereiro, mas este foi antecipado depois de, no dia 9 de fevereiro, o bispo ter sido forçado ao exílio para os Estados Unidos juntamente com outros 222 presos políticos, e recusado embarcar no avião. Álvarez não é visto desde a madrugada desse dia.
“As pessoas da prisão [La Modelo] disseram que ele foi levado para lá, e que está detido na cela 300, isolado”, revelaram as fontes, acrescentando que o bispo se encontra em isolamento porque o regime não quer que ele tenha contacto com nenhum outro preso político. Aquela cela, conhecida como local de castigo onde vários presos têm sido torturados, é um espaço de dois por três metros, sem ventilação nem iluminação.
O Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh) publicou uma declaração em que repudia as ações contra Álvarez, alertando para o facto de a sua segurança e vida estarem em risco.
📢🇳🇮COMUNICADO URGENTE| Repudiamos acciones delictivas del régimen Ortega Murillo contra Monseñor Rolando Álvarez. Su seguridad y su vida están en riesgo.#LibertadParaMonseñorÁlvarez#EsInocente#SOSNicaragua pic.twitter.com/QxxIY1VWMw
— Cenidh (@cenidh) February 11, 2023
Bispo Silvio Báez e mais 93 opositores perdem nacionalidade
Já esta quarta-feira, 15 de fevereiro, outros 94 opositores do governo de Ortega, entre os quais o bispo que se encontrava no exílio Silvio José Báez, assim como padres, políticos, escritores, jornalistas e defensores dos direitos humanos, viram ser-lhes retirada a nacionalidade nicaraguense.
Segundo avançou esta quinta-feira a revista Vida Nueva, tratou-se de “um processo expresso e sem julgamento” que levou o Tribunal de Apelação de Managua a declarar, na noite de 15 de fevereiro, estes 94 cidadãos como “traidores da pátria”.
Silvio Báez reside atualmente nos Estados Unidos, depois de a 23 de abril de 2019 se ter visto forçado a sair da Nicarágua ao receber um aviso por parte da embaixada norte-americana de que iria ser assassinado.
“Deus da vida e da libertação! Dou-te graças por ser nicaraguense, um orgulho que ninguém jamais poderá arrebatar-me. Peço-Te que nos guies no caminho até à libertação do nosso país, onde o povo oprimido e a Tua santa Igreja é perseguida”, partilhou o bispo na sua conta de Twitter, após saber da condenação.
+¡Dios de la vida y de la liberación! Te doy gracias por ser nicaragüense, un orgullo que nadie jamas podrá arrebatarme. Te pido que nos guíes en el camino hacia la liberación de nuestro país, en donde el pueblo es oprimido y tu santa Iglesia perseguida. Por Cristo, Nuestro Señor pic.twitter.com/0c6jrbVXSK
— Silvio José Báez (@silviojbaez) February 16, 2023
Solidariedade e uma proposta: Álvarez candidato ao Nobel da Paz
De todas as partes do mundo, continuam a chegar mensagens de solidariedade para com Rolando Álvarez e a Igreja na Nicarágua. Os bispos venezuelanos divulgaram um comunicado onde dizem seguir com “atenta preocupação” os últimos acontecimentos: “expulsão de padres, diáconos, seminaristas e religiosos, entre eles as Irmãs da Caridade, assim como o julgamento e prisão do querido irmão Rolando Álvarez, bispo de Matagalpa”, que com “a sua coerência, decisão profética e acompanhamento ao povo é uma luz que mantém viva a Palavra da Verdade, a única que liberta os seres humanos”.
Já os bispos católicos do Equador lançaram um apelo ao governo da Nicarágua para que “faça uso do poder político em benefício do povo nicaraguense e não para dominar e impor o seu pensamento único”. “É necessário que respeite os direitos de pensar e expressar-se de modo diferente, tal como são reconhecidos pela comunidade internacional e inclusive pelo Estado nicaraguense”, escreveram, lançando duras críticas ao governo de Ortega: “Ontem lutaram contra uma ditadura assassina e hoje imitam o mais vil e ruim daquilo que prometeram erradicar”.
Das conferências episcopais do México, El Salvador, Guatemala e Honduras chegaram também, nos últimos dias, manifestações de forte “indignação” e “preocupação”.
Da parte do historiador Enrique Sáenz, coordenador da plataforma de comunicação #VamosAlPunto, surgiu a ideia de propor o bispo Álvarez como candidato a Prémio Nobel da Paz 2024. A ideia já colheu apoios junto de organizações da sociedade civil e de defesa dos direitos humanos, como o Centro de Assistência Legal Interamericano de Direitos Humanos ou a Nicaraguenses Livres.
Sobre tal proposta, esta última afirmou: “Seria uma mensagem clara nossa contra a tirania, uma mensagem clara do mundo civilizado, o reconhecimento do valor da coerência entre a pregação e a prática e, sobretudo, uma lição: a luta não violenta representa uma cúspide da moral, porque significa que quem a pratica aceita o sofrimento para nos motivar a resistir ao mal”.