
Leitores não acreditam que possa haver mudanças, mas estão disponíveis para participar no processo sinodal. Foto © Antenna | Unsplash
Uma larga maioria superior a dois terços (69,82%) dos leitores do 7MARGENS pensa que o caminho que levará ao Sínodo dos Bispos em 2023 não vai modificar de forma radical a Igreja em Portugal. Este ceticismo é tão mais surpreendente quanto, em cada cinco respostas, quatro (81,08%) exprimem interesse quer pela convocação quer pelo modelo em que vai decorrer o Sínodo e a mesma percentagem (81,46%) se afirme disponível para participar no debate e na formulação de respostas aos seus documentos preparatórios.
Mais céticos ainda se mostram os clérigos sobre o impacte da iniciativa do Papa Francisco na Igreja em Portugal: 85,45 por cento descrê que alguma mudança advenha daí, ainda que igual percentagem concorde com a convocação e o processo sinodal desenhado e 88,14 por cento se afirme disponível para nele intervir. Bem revelador da descrença existente entre o clero na renovação é o facto de um cada dez (11,86%) não manifestar sequer disponibilidade para participar no processo preparatório do Sínodo da Igreja Católica 2021-2023.
A diferença de expectativas é também significativa segundo o género, existindo uma disparidade superior a 10 pontos percentuais entre os homens e as mulheres que responderam ao inquérito lançado pelo jornal. Aqueles são mais incrédulos do que estas quanto ao impacte que o Sínodo venha a ter na mudança da Igreja em Portugal: enquanto 61 por cento das respostas femininas vão no sentido de que nada de relevante acontecerá, as respostas masculinas que partilham desta opinião atingem os 72,64 por cento.
Sinodalidade em causa

Momento de oração de jovens com o Papa. Foto © Vatican Media 2021
Maior discrepância existe ainda entre grupos etários. Mais de 12 pontos percentuais separa a descrença dos que têm menos de 25 anos daqueles que já passaram dos 67 anos. Definitivamente, os mais jovens não vêm quaisquer perspectivas de mudança decorrentes do Sínodo. São 84,29 por cento na faixa etária até aos 24 e 84,44 por cento entre os jovens adultos (25-34 anos). Depois, a percentagem de incrédulos na renovação começa a descer até atingir o valor mínimo (68,09%) nos que têm mais de 67 anos. Mas, mesmo neste grupo etário mais velho, mais de dois em cada três não esperam mudanças radicais na Igreja em Portugal durante e após o Sínodo que terminará no final de 2023.
Com tanta certeza de que nada mudará, parece difícil concretizar com sucesso em Portugal a inédita dinâmica proposta para este sínodo: durante dois anos, o Papa quer colocar toda a Igreja Católica a refletir e debater a sinodalidade – ou seja, como se dá a participação de todos os batizados na vida e nos processos de decisão da comunidade crente em que estão inseridos.
Os resultados da consulta organizada pelo 7MARGENS apontam, para além do ceticismo aqui evidenciado, para o facto de quase metade dos inquiridos (46,38%) discordar (pouco, muito ou frontalmente) das práticas que a sua Igreja Católica em Portugal adota para facilitar a participação de todos (ver 7MARGENS).
A falta de confiança nos mecanismos de auscultação e participação aliada à pouca ou nenhuma esperança de que no final do processo algo mude, constitui, sem dúvida, um enorme desafio para os católicos que, tal como o Papa Francisco, sentem a necessidade de renovação da sua Igreja.
Leigos e clérigos: obstáculos à mudança

Cardeal Mario Grech cumprimenta uma das participantes na abertura do Sínodo. Foto © Vatican Media 2021
A reduzida formação teológico-pastoral dos leigos e o excessivo protagonismo do clero são os dois principais obstáculos que impedem a Igreja Católica em Portugal de viver em constante processo sinodal. No entendimento dos leitores do 7MARGENS, essas barreiras à mudança desejada pelo Papa Francisco não têm, porém, o mesmo peso. A pouca formação dos leigos surge muito destacada, sendo referida em 42,66 por cento das respostas, enquanto o protagonismo excessivo do clero é apontado como principal obstáculo por 38 por cento dos leitores.
Os clérigos são, contudo, mais conscientes do excessivo protagonismo que eles e os seus pares detêm e não têm dúvidas quanto ao bloqueio à mudança que esse excesso representa. Dão-lhe exatamente a mesma importância do que à reduzida formação teológico-pastoral dos leigos: 41,67 por cento das suas respostas referem um ou o outro e uma resposta em cada dez menciona ambos.
A pergunta sobre os principais obstáculos que impedem a Igreja Católica em Portugal de viver em constante processo sinodal permitia aos leitores escolherem dois de seis itens: Reduzida formação teológico-pastoral dos leigos; Vivência infantilizada da fé por parte dos leigos; Pouco interesse dos leigos em assumirem responsabilidades; Entendimento errado do exercício da autoridade na Igreja; Excessivo protagonismo do clero; e Incapacidade de as comunidades entenderem os problemas e os desafios do mundo atual. Para efeitos de apuramento contabilizámos as vezes que cada um destes itens surge nas respostas dos leitores, isto é, sempre que surge como um dos dois termos da resposta.
De entre eles, clérigos e leigos estão de acordo em classificar a vivência infantilizada da fé por parte dos leigos como o terceiro obstáculo à vida sinodal da Igreja, e o entendimento errado do exercício da autoridade na Igreja como quinto impedimento. Mas, se os clérigos dão pouco relevo ao pouco interesse dos leigos em assumirem responsabilidades, só o referindo num quinto das respostas e colocando-o na última posição, já no conjunto dos inquiridos esse obstáculo surge em quarto lugar, sendo referido em 32 por cento das respostas. Finalmente, a incapacidade de as comunidades católicas entenderem os problemas e os desafios do mundo atual é, para os clérigos, um obstáculo bem mais importante (referido em 35 por cento das respostas) do que para o geral dos leitores do 7MARGENS que a escolhe apenas em 23,84 por cento das respostas.
Os leitores foram ainda chamados a aplicar a mesma chave de leitura aos obstáculos que impedem a comunidade católica a que estão mais diretamente ligados de viver em ambiente sinodal. E a ordenação dos principais obstáculos surge bem diferente do que quando o que está em causa é a Igreja Católica em termos gerais. Desta forma, o pouco interesse dos leigos em assumirem responsabilidades (43,92%) e a reduzida formação teológico-pastoral dos leigos (42,37%) são apontadas quase ex-aequo como os dois principais obstáculos à renovação da comunidade próxima, muito distantes de quaisquer outros que apenas são referidos em uma de cada quatro respostas. A exceção é a incapacidade de as comunidades católicas entenderem os problemas e os desafios do mundo atual que recolhe 31,66 por cento das escolhas enquanto obstáculo à vida sinodal da comunidade de proximidade.
O inquérito do 7MARGENS
Este artigo foi escrito a partir da análise de 1036 respostas válidas ao questionário enviado aos assinantes do 7MARGENS e recebidas entre 24 de setembro e 4 de outubro de 2021. O questionário esteve também acessível a partir do próprio site do 7MARGENS. As percentagens aqui referidas relativas a respostas na gradação “discordo totalmente” até “concordo totalmente” foram calculadas sobre o total excluído da escolha “não se aplica” existente em todas as perguntas. Na maior parte da análise destas respostas agrupámos toda a discordância (itens de 1 a 3) e toda a concordância (itens de 4 a 6).
Na análise das respostas às perguntas em que era exigida a escolha de dois itens relevámos a presença de um desses itens em qualquer resposta, dado que nesses pares nenhuma hierarquia era proposta.
A estrutura etária e de género, a distribuição espacial, a relação com a religião e os indicadores da participação na celebração da eucarística e em movimentos ou estruturas eclesiais, foram objeto de análise em artigo antes publicado no 7MARGENS.
Num outro texto, demos conta das respostas sobre os processos de decisão na Igreja.