
A pobreza afetava, em 2020, 345 mil crianças, correspondente a 20 por cento (uma em cada cinco) da população infantil em Portugal. Foto: Direitos reservados.
O país e as políticas públicas devem prestar uma maior atenção às crianças e aos idosos, se quiserem combater a pobreza. Esta é uma das mensagens fortes que decorre do relatório “Portugal, Balanço Social 2022”, que foi apresentado esta terça-feira, 16 de maio, em Lisboa.
Coordenado por Susana Peralta, Bruno P. Carvalho e Miguel Fonseca, da Nova SBE, o estudo refere-se ao ano de 2022, tendo trabalhado dados de 2021 (e também 2020), incluindo um capítulo sobre o impacto da pandemia.
Os dados de 2020 apontam para a existência, em Portugal, de quase 1,9 milhões de pobres (mais rigorosamente: 1.893 milhares). Este número corresponde a 18,4 por cento de pessoas que, nessa altura, se encontram em “risco de pobreza” (tecnicamente, a taxa de risco de pobreza é a proporção da população que vive com rendimentos abaixo do limiar de pobreza, depois de transferências sociais; em 2020, este limiar equivalia a 6 653 € anuais, ou 554,4 € por mês, um aumento de 14 € relativamente ao ano anterior). Essa taxa representava, então, um aumento de 2, 2 pontos face a 2019, marcando uma inversão de tendência.
Se olharmos para a pobreza infantil, ela afetava, em 2020, 345 mil crianças, correspondente a 20 por cento (uma em cada cinco) da população infantil.
Em comentários a estes números, veiculados pela Antena 1, a economista Susana Peralta sublinhou que nascer e crescer na pobreza “condiciona toda a vida adulta” das crianças e adiantou que a educação pré-escolar é “essencial, apesar de, neste aspeto, o país estar muito mal”.
Susana Peralta explicou porquê: “Ainda não há cobertura universal nem sequer das crianças de quatro anos, quanto mais das de três. É uma coisa que é um completo absurdo no contexto da União Europeia. Não devia ser assim. Todas essas crianças deveriam ter um lugar garantido na escola”.
“O pior disto tudo – acrescentou – é que há mais frequência nos filhos dos ricos do que nos filhos dos pobres, quando devia ser ao contrário: uma vez que não conseguimos chegar a todos, devíamos dar prioridade àqueles que não têm capital humano e condições em casa para desenvolverem as suas competências”.
Relativamente às pessoas idosas, com 65 anos ou mais, a taxa de risco de pobreza em 2020 foi de 20,1 por cento, 1,7 pontos percentuais acima da média nacional. “É neste grupo etário que a taxa de pobreza mais subiu entre 2019 e 2020 (+2,6 pontos percentuais)”, sublinha o relatório. Isto significa que havia, em 2020, mais de 465 mil pobres com 65 ou mais anos em Portugal, a esmagadora maioria dos quais ( 90 por cento) têm como rendimentos o que recebem das pensões.
Muitos deles vivenciam problemas graves de insegurança alimentar, o que, no dizer de Susana Peralta, “deveria criar um alarme social”. Além disso, denunciou, “mais de um terço dos idosos pobres não conseguem aquecer a casa. Isso causa mortes todos os invernos, não podemos ter ilusões quanto a isso”.
O relatório “Portugal, Balanço Social 2022” chama a atenção para o facto de o risco de pobreza não atingir da mesma forma todos os grupos da população. E dá dados que são significativos, sempre tomando o ano de 2020 como referência e os 18,4 por cento de taxa nacional:
- O risco de pobreza é muito mais elevado para pessoas com menor escolaridade (24,5 por cento para pessoas com escolaridade completa até ao ensino básico);
- É bastante mais acentuado em famílias monoparentais (30,2 por cento) e residentes em regiões rurais (26,2 por cento);
- É naturalmente muito mais significativo entre pessoas desempregadas (33,3 por cento em 2019 e uma subida para 40,5 por cento, em 2020, por causa da pandemia);
- Há trabalhadores que são afetados pela pobreza (12,1 por cento), assim como reformados (18,5 por cento);
- A precariedade do trabalho surge também como fator relevante associado à pobreza, com 17,5 por cento.
- Finalmente, os trabalhadores do setor primário (agricultura, produção animal, caça, floresta e pesca) e os indivíduos que apenas completaram o ensino básico tinham taxas de risco de pobreza significativamente superiores às de outros setores de atividade ou a graus de ensino mais elevados, respetivamente.