
Daniel Faria. Foto: Direitos Reservados
Devemos ao bispo Carlos Azevedo, hoje delegado no Conselho Pontifício da Cultura, a primeira edição dos primeiros livros de Daniel Faria, cujo 50.º aniversário de nascimento se assinala neste sábado, 10 de Abril, com a realização de diversas iniciativas promovidas pela Casa de Daniel, com o alto patrocínio do Presidente da República.
A história é sabida: o poeta tinha perdido uma disquete onde se encontravam os poemas de Explicação das árvores e outros animais e Homens que são como lugares mal situados. Receando que alguém a encontrasse e se apropriasse do seu conteúdo, fazendo-se passar por autor da obra desaparecida, Daniel Faria aconselhou-se junto de D. Carlos Azevedo, seu director espiritual. O resultado foi a rápida publicação das duas obras pela Fundação Manuel Leão, numa colecção expressamente criada para as acolher.
Ao bispo Carlos Azevedo somos ainda devedores de um amplo e significativo trabalho de divulgação da obra de Daniel Faria, realizado em grande medida a partir da Casa Daniel, a cujo Colégio de Fundadores o delegado no Conselho Pontifício da Cultura preside. D. Carlos é também um profícuo estudioso da obra do poeta, tendo publicado, por exemplo, “‘Soubesse eu morrer iluminando’: o sentido da morte em Daniel Faria”, publicado na Revista Interdisciplinar sobre o Desenvolvimento Humano.
A releitura dos versos de Daniel Faria “cresce em sentido”, diz D. Carlos Azevedo, que considera que o poeta “tem a arte de criar amigos”. A propósito da série de iniciativas que começa este sábado, o 7MARGENS dirigiu-lhe três perguntas.

Daniel no traço de Siza Vieira: “A simplicidade pura e a fulgurante timidez conjugavam-se em sensibilidade interior”, diz Carlos Azevedo.
Quais são as impressões mais fortes que retém de Daniel Faria?
Como professor de teologia e orientador da sua tese de licenciatura, padre espiritual, companheiro de férias estivais, hóspede por três anos na casa paroquial da Senhora da Conceição, sonhador de um eremitério em São Pedro das Águias, onde íamos com o Francisco Jorge diversos anos, guardo a serenidade sábia de um amigo ímpar.
A simplicidade pura e a fulgurante timidez conjugavam-se em sensibilidade interior, criativa de expressões surpreendentes de poesia e de gestos concretos.
Presumindo que a leitura que foi fazendo da obra de Daniel Faria se foi modificando ao longo dos anos, em que sentido foi ela evoluindo?
À medida que o tempo avança, a releitura dos seus versos cresce em sentido. A profundidade dos seus poemas escapa a uma primeira e segunda leitura e exige muito silêncio para chegar ao nível da inspiração que os gerou.
Conhecer um operário do silêncio e um místico intenso ilumina a nossa interioridade com as variações das estações da nossa alma. De uma admiração formal dos primeiros textos, que li nos seus 17 anos, aos dias de hoje vai uma larga distância. Cada vez ganha mais energia a delicadeza interior que comunica e nos habita. Como ele escreveu: “deixa-me conhecer a caligrafia da palavra / onde farei a casa” (Poesia, ed. Quasi, p. 248).
Como interpreta o interesse e entusiasmo que a obra de Daniel Faria suscita em tantos leitores – que, desde logo, se traduz em a sua obra estar permanentemente acessível, sendo certo que muitos poetas, após a morte, não gozam de idêntico privilégio?
Adivinho que a revolução da sua escrita ocasione, no leitor atento e disposto a implicar-se na busca da claridade, uma sede inesgotável. O trabalho da sua escrita resulta de um processo capaz de acolher muitas leituras além da bíblica e carrega uma sabedoria muito aberta.
A sua obra conquista indagadores pois entra em comunhão com o leitor para o inquietar e fazer crescer a sua humanidade. O Daniel tem a arte de criar amigos. Assim foi nos dias breves do seu itinerário entre nós e assim continua nos leitores.
(Dia 9/4 às 12h30 foi corrigida a data de nascimento de Daniel Faria e a ligação da Casa Daniel)