
A pandemia agravou o fosso ente os países mais ricos e mais pobres. Foto © Pexels
A Amnistia Internacional (AI) publicou na noite desta segunda-feira, 28, o seu relatório anual, acusando os países mais ricos de não protegerem a igualdade entre países durante a crise pandémica. A forma como os países geriram a distribuição de vacinas, diz a organização, foi uma “forma de acumularem poder e lucro”.
O “Relatório Amnistia Internacional 2021/22: O Estado dos Direitos Humanos no Mundo” conclui que estes Estados, em conjunto com as grandes empresas, “aprofundaram a desigualdade global”. O relatório detalha as causas fundamentais, como a “ganância corporativa prejudicial e o egoísmo nacional abusivo, bem como a negligência da saúde e das infraestruturas públicas por parte dos governos de todo o mundo”. “O ano de 2021 deveria ter sido de cura e recuperação. Em vez disso, tornou-se terreno fértil para desigualdades mais profundas e maior instabilidade, um legado cáustico para os próximos anos”, afirmou Agnès Callamard, secretária-geral da AI.
Esta responsável defendeu que “líder após líder prometeu ‘reconstruir melhor’ para fazer face às desigualdades enraizadas que agravaram o impacto da pandemia. Em vez disso, desempenharam uma trágica fábula de traição e ganância, num secreto plano conjunto com grandes empresas. Enquanto o mundo inteiro foi afetado, foram as comunidades mais marginalizadas, incluindo as da linha da frente da pobreza endémica, que suportaram o peso das consequências”.
O relatório denuncia ainda os “lucros assombrosos” da Pfizer, BioNTech e Moderna, de “até 54 mil milhões de euros”, tendo apenas fornecido “menos de 2% das suas vacinas a países de baixo rendimento”.
Quem também não escapa às críticas são as empresas de redes sociais, que “proporcionaram espaço para a desinformação sobre a covid-19, permitindo o crescimento da hesitação das pessoas em vacinar-se. Alguns líderes políticos também disseminaram informação falsa, alimentando a desconfiança e o medo para seu próprio ganho político”, pode ler-se no comunicado que sintetiza o relatório, enviado ao 7MARGENS.
Conflitos mundiais e condicionamento da liberdade de expressão
Mas não é só de pandemia que fala o relatório. No que diz respeito aos conflitos mundiais, a AI traça um retrato de “danos colaterais, milhões de deslocados, milhares de mortos, centenas sujeitos a violência sexual, e os sistemas de saúde e económicos já frágeis foram levados ao limite”.
Perante isto, acusa a organização de defesa dos direitos humanos, “esta inércia vergonhosa, a paralisia continuada de órgãos multilaterais e a ausência de responsabilização de Estados poderosos, ajudaram a abrir o caminho para a invasão da Ucrânia pela Rússia, que tem violado, de forma flagrante, o Direito Internacional”. “Muito poucos casos geraram a necessária resposta internacional; muito poucos viram a justiça e a responsabilização ser providenciadas. Em vez disso, os conflitos expandiram-se. Prolongando-se no tempo, os seus impactos agravaram-se. Os números e a diversidade de partes intervenientes aumentaram. Abriram-se novos cenários de conflito. Foram testadas novas armas. Aumentou o número de pessoas mortas e feridas. A vida foi desvalorizada. A estabilidade global foi levada ao limite”, explica Agnès Callamard.
Sobre a liberdade de expressão, o relatório dá nota de que “a tendência global para silenciar vozes críticas e independentes ganhou fôlego em 2021”. “Defensores de direitos humanos, ONG, meios de comunicação social e líderes da oposição foram alvos de detenções ilegítimas, tortura e desaparecimento forçado, muitos deles sob a cortina de fumo da pandemia”, afirma o relatório, que mostra que, “em 2021, pelo menos 67 países introduziram novas leis para restringir a liberdade de expressão, de associação ou de reunião”.
E Portugal?
O relatório traça um retrato global de cada país, e Portugal está também na lista, com destaque para a polémica que envolveu as autoridades municipais de Lisboa, lideradas por Fernando Medina, que enviaram dados pessoais de manifestantes que haviam protestado contra a Rússia à frente da sua embaixada.
Além disso, a AI refere medidas como a “nova lei que reforça a proteção das crianças que assistem ou são expostas à violência doméstica” e a condenação de três inspetores do Serviços de Estrangeiros e Fronteiras por “ofensa à integridade física grave qualificada, agravada por ter resultado na morte de um cidadão ucraniano sob custódia do SEF”, bem como o “acolhimento de 764 afegãos que procuravam segurança” como mais positivas.