Dor, perda, insulto, violação: as reações à transformação de Santa Sofia em mesquita

| 13 Jul 20

Hagya Sophia. Istambul

Hagya Sophia. Istambul. Mosaicos cristãos e símbolos muçulmanos. Foto © António José Paulino

 

Do Papa aos líderes da Igreja Ortodoxa, passando pelo Conselho Mundial de Igrejas e sem esquecer o Governo grego, não se fizeram esperar as reações ao anúncio feito na passada sexta-feira, 10 de julho, pelo Presidente turco Recep Tayip Erdogan, de que a Basílica de Santa Sofia será transformada numa mesquita. E nenhuma delas está perto de ser positiva.

O Papa Francisco, que vinha sendo criticado por não expressar a sua opinião relativamente à já anunciada intenção de Erdogan, quebrou este domingo o silêncio. “O meu pensamento dirige-se a Istambul. Penso em Santa Sofia e sinto-me muito magoado”, disse o Papa logo no início da saudação que dirige sempre aos fiéis após a oração dominical do Angelus.

Um sentimento partilhado pelo secretário-geral interino do Conselho Mundial de Igrejas, o padre ortodoxo romeno Ioan Sauca, que expressou no sábado “dor e consternação” com a decisão de converter a basílica numa mesquita. Numa carta enviada ao Presidente da Turquia, o representante da instituição que agrupa cerca de 350 igrejas cristãs não católicas (sobretudo protestantes e ortodoxas) de todo o mundo assinalou que, desde 1934, Santa Sofia é “um local de abertura, encontro e inspiração para pessoas de todas as nações e credos”. Referindo-se à data em que o templo foi secularizado e passou a funcionar como museu e atração turística, Ioan Sauca considera que a basílica era um exemplo do compromisso da Turquia “com o secularismo, a inclusão e o desejo de deixar para trás os conflitos do passado”.

A decisão de transformá-la numa mesquita, na sua opinião, “reverteu a imagem positiva de abertura da Turquia, alterando-a para exclusão e divisão”, e desacredita também o valor universal deste monumento classificado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), instituição que aliás alertou para o risco de perda desse valor num comunicado emitido na passada sexta-feira.

O Conselho de Igrejas do Médio Oriente não tem dúvidas: esta decisão de Erdogan é “uma violação da liberdade religiosa”, liberdade essa que é “protegida por leis internacionais”, afirma num comunicado divulgado este sábado, exortando as Nações Unidas e a Liga dos Estados Árabes a apelar ao Supremo Tribunal turco.

 

Relações com Rússia e Grécia comprometidas

Hagya Sophia. Istambul.

Hagya Sophia, em Istambul, vista do exterior. Foto © Margarida Paulino

 

Da parte da Igreja Ortodoxa Russa, foi manifestado o receio de que este passo possa “ter sérias consequências para toda a civilização humana”, e em particular para a paz inter-religiosa e o entendimento entre os povos, incluindo os da Rússia e Turquia”, avançou o Religión Digital.

O arcebispo metropolita Hilarión, porta-voz do patriarcado de Moscovo, considerou a decisão turca “um golpe” para os cristãos ortodoxos de todo o mundo, sublinhando que para eles “o templo de Santa Sofia representa o mesmo que a basílica de São Pedro para os católicos”. Apesar de não ter ficado surpreendido com a decisão, confessou que. “até ao último momento” teve esperança de que as autoridades turcas mudassem de planos. “Esta decisão, sem dúvida, afetará de uma forma negativa a relação da Turquia com o mundo cristão”, concluiu.

Já esta segunda-feira, o Presidente russo, Vladimir Putin, transmitiu diretamente ao seu homólogo turco “a importante desaprovação que provocou na Rússia a decisão de mudar o estatuto da igreja de Santa Sofia em Istambul”, avançou o Expresso.

Na Grécia, o arcebispo de Atenas, Jerónimo II, qualificou por seu lado a decisão de Erdogan como um “insulto à ortodoxia, ao cristianismo em geral e a todo o ser pensante”. “A instrumentalização da religião para a busca de conveniências partidárias, geopolíticas e geoestratégicas caracteriza quem tenta fazê-lo”, expressou o primaz da Igreja Ortodoxa grega num comunicado divulgado este domingo, citado pelo Religión Digital.

Também o primeiro-ministro grego, o conservador Kyriakis Mitotakis, considera que esta decisão, depois de Santa Sofia ter funcionado como museu durante 85 anos e sendo Património da Humanidade, é uma “afronta ao seu caráter ecuménico” e um “lamentável” passo atrás do Presidente turco. Segundo Mitsotakis, isto afetará não só as relações da Turquia com a Grécia, mas também com a União Europeia, a UNESCO e a comunidade internacional em geral.

Numa mensagem televisiva à nação, o Presidente turco respondeu às críticas, assegurando que “Santa Sofia, que é património comum da humanidade, com o seu novo estatuto, continuará a abraçar todos de forma muito mais sincera e de forma muito mais original”.

Erdogan recordou que existem 435 igrejas e sinagogas abertas ao culto no país. “Este panorama é uma manifestação da compreensão que vê as nossas diferenças como uma riqueza”, defendeu, convidando todos a respeitar a decisão que foi tomada pelos órgãos executivo e judicial da Turquia e anunciando que  templo deverá ser reaberto ao culto islâmico no próximo dia 24 de julho.

Reproduz-se a seguir a mensagem do Presidente turco (legendada em inglês) sobre a alteração do estatuto da antiga basílica de Santa Sofia:

 

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