3ª de 3 pequenas crónicas sinodais

E se a Jornada Mundial da Juventude for um vazio?

| 7 Set 2022

jmj lisboa americo aguiar mapa mundo foto antonio marujo 7M

“O bispo português responsável pela Fundação JMJ Lisboa 2023 diz-nos algo do domínio do impensável: a JMJ será ‘um desígnio nacional’ e Portugal irá ‘de novo dar novos mundos ao mundo’ (sendo precisamente a nossa pobre Igreja tão carente de mundo).” Foto © António Marujo/7M.

 

Antecedentes. A minha vida de cristão foi sobretudo moldada pela família, pela catequese tradicional – felizmente menos –, e sobretudo pela vertiginosa passagem pela Acção Católica estudantil (Juventude Escolar Católica/Movimento Católico de Estudantes – JEC/MCE) na transição da década de 1970 para 80, instâncias fundamentais no meu processo de socialização e integração religiosa. Para este efeito, interessa-me o caso da JEC/MCE, simultaneamente um incomum espaço de livre expressão das angústias e esperanças juvenis e um estímulo à reflexão cristã e social. Através do método de revisão de vida (ver, julgar e agir, uma saudável e permanente inquietação instalada em cada um de nós), conhecemos melhor o mundo em que vivíamos e alimentámos a esperança militante de o transformarmos para melhor; aprendemos o Evangelho e a gostar de Deus, tido já não como uma ameaça à liberdade (vincada marca trazida da catequese tradicional) mas como libertador. Ali conversávamos sobre as nossas vidas a partir dos eixos da condição juvenil e estudantil, ou seja, da nossa identidade, aprendendo que ser cristão implicava auto-descentramento e compromisso com o mundo (escola, movimentos estudantis, participação política e social), dando testemunho dos valores de Jesus e da Igreja. Foi uma magnífica aventura que, vejo-o hoje, perdura no pensamento do Papa Francisco.

Jornada Mundial da Juventude. Pensando na JMJ, não esperaria que ela reproduzisse as preocupações da minha juventude mas legitimamente esperaria encontrar um pequeno conjunto de ideias arrebatadoras que funcionassem como motivação e mobilização dos jovens.

Temos que compreender a JMJ como um evento de massas mas, ainda assim, não é razoável que ela se quede pela competição dos números (estabelecer recordes de presenças: 2 milhões, 2 milhões e meio, como temos ouvido ao bispo responsável) ou por uma triste insipiência de conteúdos.

Através do site oficial e do boletim (que assinei) e outras fontes, seria expectável conhecer uma metodologia de trabalho de reflexão-acção, um ponto de partida, propostas de trajectos, pontos de chegada. Quase nada se encontra.

Traços do retrato da actual geração de jovens, expectativas, anseios, preocupações, pensamentos, realizações? Nada.

Eixos temáticos, ideias para o projecto sinodal, sinais de esperança e de mobilização de consciências e corações, interpelações, testemunhos de fé, sugestões para uma melhor relação da Igreja com os jovens do nosso tempo? Nada.

Manifestações de Deus vivo, a centralidade da mensagem de Jesus Cristo, exemplos de fraternidade, justiça e do bem, um (um, ao menos) texto do Evangelho e sua exegese, um link para encíclicas ou documentos de reflexão produzidos para a caminhada? Nada.

Estímulos à reflexão e acção, ligação da fé ao mundo real, ideias de fraternidade, exemplos de construção de novas mentalidades preocupadas com a injustiça social, a pobreza, os nacionalismos e as autocracias emergentes, a misoginia, o desrespeito pelos direitos humanos, a emergência climática (plantar umas árvores obrigatórias no recinto da JMJ não conta), a discriminação das minorias? Nada.

Face às guerras actuais e às perseguições religiosas aos cristãos em tantas partes do mundo, sinais de comprometimento com mudanças e acções urgentes pela paz, acções de solidariedade? Nada.

Estimulado por terceiros incrédulos nas minhas apreensões, procuro de novo, agora com fervor de investigador. E encontro, finalmente, alguns conteúdos na discreta pasta Rise Up, incluindo um interessante guia metodológico no meio do que é designado Estrutura de cada encontro, um pequeno capítulo perdido no meio de materiais confusos e que deveria ser axiomático.

Mas continuo em crer que, basicamente, há um vazio de conteúdos relevantes e uma reduzidíssima participação.

Vazio será, talvez, um exagero injusto. Nos materiais disponíveis é possível avistar uma burocracia e alguns tópicos etéreos ou vago-simbólicos, como a deambulação de cruzes de madeira. Pergunto-me o que dirá esta ideia aos milhões de jovens do mundo inteiro, mesmo aos já crentes, e que noção de Igreja ela veicula?

Aproveitando o título de um belo artigo recente de Pedro Vaz Patto, onde estarão ao menos os indícios d’A revelação ética mais importante da história humana?

Aliás, no limite: na JMJ, onde estão os jovens?

Nada do descrito é uma fatalidade, mas uma escolha. Por oposição à desgraça, atente-se no exemplo da Obra Católica Portuguesa das Migrações que, numa brevíssima publicação na sua página no Facebook, tão bem sabe aliar espiritualidade, e acção concreta, enunciando um plano:

A Peregrinação do Migrante e do Refugiado a Fátima [13 de agosto] é um convite a rezar a realidade, com base em todo o itinerário espiritual buscarmos inspiração e razões para aprofundar o compromisso com a transformação do mundo, contando com a voz e a participação ativa dos migrantes e refugiados.

Na JMJ, parece desconhecer-se a mensagem cristã comprometida com o mundo e alinhada com o Papa; tudo se resume a vagos clichés e burocracia. A surpresa deste cenário tenderá a desaparecer ao perceber os equívocos da liderança existente, ao menos entre nós. O bispo português responsável pela Fundação JMJ Lisboa 2023, que esperávamos ver como o pastor que orienta e interpela, que propõe e anuncia a mensagem cristã, diz-nos, todavia, algo do domínio do impensável: a JMJ será “um desígnio nacional” e Portugal irá “de novo dar novos mundos ao mundo” (sendo precisamente a nossa pobre Igreja tão carente de mundo). A mensagem cristã é aqui ostensivamente evaporada e inadmissivelmente substituída por uma ideologia profana, nacionalista e serôdia. Confirmando o bafio onde vive, não resiste o prelado em apimentar a nulidade da sua comunicação com a subtil provocação de evocar Ratzinger e o “saudoso João Paulo II”, desconsiderando Francisco (mesmo que o nomeando, mas nem todos dormem na fila pelo que percebemos muito bem a mensagem implícita). Portanto: tem à mão o mais extraordinário Papa em centenas de anos, mas isso não lhe serve ou chega; precisa de ir buscar referências passadas para falar do futuro que deveria decorrer de um processo lançado pelo Papa Francisco.

Sobre isto, várias pessoas me disseram, sem que eu lhes perguntasse nada: “que tristeza! Onde está a mensagem cristã?”

Sobre isto, pergunto eu: qual sínodo?

 

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