
António Assunção e Beatriz Zoccoli no debate na Antena 1. Francisco Ferreira interveio à distância. Foto: Direitos reservados
O último mês foi o Outubro mais quente desde que há registos, o que acontece pela quinta vez consecutiva, já que Junho, Julho, Agosto e Setembro também bateram o mesmo recorde. E 2023 pode vir a ser o ano mais quente desde que há registos: estamos 1,43ºC acima da média pré-industrial e a três semanas do início da Conferência das Partes (COP), da Convenção das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, que decorre no Dubal entre 30 de Novembro e 12 de Dezembro.
Este foi o ponto de partida para o debate do programa 7MARGENS na Antena 1, emitido nesta noite de sexta para sábado, à volta do tema “Estamos à beira de um desastre que não queremos ver?”
O debate contou com a participação de três activistas que têm privilegiado estratégias diferentes na sua acção: Francisco Ferreira, presidente da Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável, e professor no Departamento de Ciências e Engenharia do Ambiente da Universidade Nova de Lisboa; António Assunção, que começou a fazer activismo pela justiça climática aos 15 anos (tem 20), participando em manifestações da Greve Climática Estudantil e integrando o Climáximo – tendo esta semana comparecido em tribunal por causa de algumas das acções em que se envolveu; e Beatriz Zoccoli, licenciada em Ciência Política e Relações Internacionais, com uma tese de mestrado sobre o movimento lixo zero em Portugal e que cresceu “numa casa onde a sustentabilidade esteve sempre presente”.
Com as más notícias da última semana, dos últimos meses e dos últimos anos, ainda é possível ter esperança nos resultados da COP? Francisco Ferreira, que há anos participa nas COP, admite que “a esperança é sempre limitada e o que se consegue é sempre muito pouco em relação ao que é necessário”. Mas, acrescenta, “também é preciso reconhecermos que estas conferências são essenciais: temos um problema global, que diz respeito a todos os países, com grandes desigualdades entre eles para além das desigualdades dentro de cada um dos países”. E se não houver “decisões tomadas por todos, não conseguiremos construir as políticas, as medidas, as acções, o financiamento” necessários.
O conhecido ambientalista diz ainda que podemos colocar a pergunta inversa: “E se não tivéssemos estas conferências e o Acordo de Paris, que tem impulsionado alguma mudança?” É preciso, acrescenta, “reconhecer o pouco êxito” destas iniciativas, mas também olhar para os aspectos positivos deesta discussão multilateral para o planeta, não só para combater as alterações climáticas, mas também para conseguir tratados como a Convenção sobre a biodiversidade ou a Convenção sobre a Qualidade do Ar.
“O desastre já o vemos, mas não queremos agir”, diz António Assunção. “Marchámos no ano passado pelo interior de Portugal e toda a gente dizia que sabia que os incêndios são derivados da crise climática. O que falta é começar a agir perante a crise”, acrescenta o jovem activista no debate. Beatriz Zoccoli sugere ainda gestos quotidianos como fazer compras a granel ou usar detergentes concentrados para que cada pessoa possa dar o seu contributo para o combate à emergência climática.
António, filho de Rita Reino Assunção, que escreveu no 7MARGENS um testemunho sobre ser mãe de um jovem activista pela justiça climática, referiu ainda o problema das guerras, para afirmar que a acção climática implica também uma oposição mais sistemática às guerras: “É lógico que sim, somos pela vida e pelas pessoas, não pelos interesses” de uma reduzida percentagem da população que lidera governos e empresas, afirma.
Definindo o activismo que tem privilegiado uma luta pela “democracia radical e disrupção”, António Assunção contesta o sistema que continua a privilegiar o uso de combustíveis fósseis.
Como salvar, então, o planeta? As diferentes formas de intervenção complementam-se e são todas muito importantes, defende Francisco Francisco Ferreira, que apesar de tudo se diz encorajado por “algumas coisas que fomos conseguindo”. Mas a solução, concordam todos, é deixar de utilizar os combustíveis fósseis e passar de um modelo que privilegia o consumo para outro que assuma da natureza aquilo que ela pode dar para o que precisamos no dia-a-dia.
A mudança “traz sempre desconforto à vida das pessoas”, admite Beatriz Zoccoli, que lembra que “sustentabilidade não é só ambiente, também é justiça social e questões de base, seja de habitação, saúde ou educação”, sugerindo a diminuição do consumo de proteína animal (carne e peixe) na alimentação, a redução da utilização do automóvel e ter atenção a épicas de muito consumo como o Natal que se aproxima. “O desconforto do nosso dia-a-dia vai ser maior e aí vamos ter de ser forçados a tomar decisões.”
Os católicos devem “parar de legitimar um sistema que é destrutivo e participar em manifestações” ou protestos de acção directa”, diz António Assunção, dando o exemplo de grupos de católicos que fecharam vários gasodutos nos Estados Unidos. “É preciso parar com a destruição”, diz.
Nas notícias publicadas nos últimos dias no 7MARGENS, Beatriz Zoccoli registou o Fórum sobre violência doméstica, que decorre a 23 e 24 deste mês em Lisboa, António Assunção referiu a ida do Papa à COP28, e Francisco Ferreira as notícias que apelam a um cessar-fogo entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza.
Como sugestões culturais, os três convidados do 7MARGENS na Antena 1 foram todos para os livros: Francisco Ferreira propôs A Terra Tem Sede, sobre o qual aliás publicou esta semana um texto no nosso jornal, António Assunção sugeriu Tudo Pode Mudar – Capitalismo vs. Clima, de Naomi Klein, e Beatriz Zoccoli trouxe a Terra Americana, livro de Jeanine Cummins, que conta a história da travessia de uma mãe e de um filho do México para os Estados Unidos, fundo à morte da família às mãos dos narcotraficantes e à procura de uma vida melhor.
Tudo para escutar nas plataformas digitais ou na RTP Play, no endereço https://www.rtp.pt/play/p12257/7-margens