
Eugénio Fonseca em entrevista ao programa 7MARGENS na Antena 1: “Carregamos em Portugal a vergonha de termos uma percentagem considerável de trabalhadores que vivem na pobreza” por causa dos baixos salários. Foto © Carlos Jorge Antunes/Antena 1
Há uma estratégia nacional de combate à pobreza, “mas parece que não conseguimos descolar das medidas avulsas”. O lamento é de Eugénio Fonseca, presidente da Confederação Portuguesa de Voluntariado (CPV). O também ex-presidente da Cáritas foi o convidado desta semana no programa 7MARGENS, da Antena 1, emitido na noite de sexta para sábado, 18 de Novembro, para comentar a mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial dos Pobres, sobre a qual publicou um conjunto de cinco artigos no 7MARGENS.
“Não há uma articulação dos diferentes sectores” de governação para enfrentar o problema da pobreza, que exige que haja uma “vontade política determinada”, diz, a propósito do VII Dia Mundial, proposto desde 1917 pelo Papa Francisco. “E é isso que tem faltado, tem faltado essa vontade política”, acrescenta. “Todos julgamos que o trabalho é essencial, e sem dúvida que é. Mas não basta o trabalho, tem de ser um trabalho digno, com salários dignos, porque em Portugal nós carregamos também a vergonha de termos uma percentagem considerável de trabalhadores que vivem na pobreza”, afirma ainda Eugénio Fonseca, referindo-se a realidades como um terço das pessoas que trabalham estarem a viver no limiar da pobreza, o crescente número de famílias monoparentais, a baixa escolaridade de muitos portugueses ou os 25% dos jovens portugueses que vivem no limiar da pobreza.
O perfil dos pobres mudou muito em Portugal, diz o ex-presidente da Cáritas. “Há pobres hoje – gosto mais de dizer pessoas em situação de pobreza – que têm o 12º ano, são licenciados.” E pergunta, falando das comunidades católicas: “Porque é que eles não integram os nossos grupos paroquiais de acção social? E em vez de se falar deles, que sejam eles a falar” e a dizer “dos seus próprios projectos de vida” e não outras pessoas que muitas vezes não conhecem “as causas verdadeiras que conduziram” à situação dos mais vulneráveis.
Esta situação pode levar, admite Eugénio Fonseca, a messianismos e populismos. “Porque as pessoas mais vulneráveis estão expostas a todo o tipo de medos.” O que o leva a fazer um apelo a “toda a classe política: olhe bem para o bem comum e não para o acesso às cadeiras do poder”.
Acerca das dificuldades dos jovens e dos jovens adultos, o actual responsável da CPV diz que há uma grande preocupação “com aqueles jovens que investiram na formação e que agora estão confrontados com a falta de trabalho e a opção que têm é emigrar”. Eugénio Fonseca lamenta que o país “esteja a ver os seus quadros a fugirem”, quando esses jovens serão “muito necessários” para aplicar programas de desenvolvimento o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ou a Agenda 2030. “Oxalá venha a estabilidade política que desejamos para que isso possa ser concretizável a curto prazo”, afirma.
Na entrevista, Eugénio Fonseca comenta vários trechos da mensagem do Papa para o Dia Mundial, que toma uma frase do livro bíblico de Tobite para tema: “Nunca afastes de algum pobre o teu olhar.”
O responsável fala ainda sobre algumas das reflexões do presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, que esta semana esteve reunida em Fátima. O bispo de Leiria-Fátima, José Ornelas, referiu-se às dificuldades que muitas famílias estão a atravessar, com os custos das rendas de casa ou dos alimentos, sem cuidados médicos ou com o aumento do fosso entre ricos e pobres.
Eugénio Fonseca explica ainda algumas das ideias que apresentou na série de cinco textos, entre as quais um “banco de horas” envolvendo católicos voluntários e especializados em diferentes áreas, ou a disponibilização de dados das instituições sociais católicas para conhecer a real dimensão da pobreza em Portugal.
A entrevista pode ser ouvida na íntegra no endereço do programa na RTP Play: https://www.rtp.pt/play/p12257/7-margens