
Robert Francis Prevost foi nomeado prefeito do Dicastério para os Bispos a 30 de janeiro. Foto © Frayjhonattan, CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons.
Depois de 12 anos à frente do poderoso Dicastério para os Bispos, o cardeal canadiano Marc Ouellet acaba de ser substituído no cargo de prefeito por Robert Francis Prevost, um missionário da Ordem de Santo Agostinho e desde 2015 bispo da diocese de Chiclayo, no Peru.
A medida do Papa representa, para vários observadores, um passo no sentido de criar maiores horizontes temporais para uma igreja mais sinodal e missionária, a partir do lugar estratégico que é a escolha dos bispos nas dioceses de todo o mundo.
Em entrevista ao jornal digital espanhol Religión Digital, escassas horas depois da nomeação, Francis Prevost declarou: “fui missionário toda a minha vida e a única coisa que quero é servir a igreja com humildade, com enorme confiança no poder do Espírito”.
Sobre o projeto de sinodalidade na Igreja Católica, lançado pelo Papa, o bispo indigitado disse ir recorrer “ao espírito missionário para fazer parte desse serviço único à Igreja e, sobretudo, ver formas de acompanhar os bispos para que tenham abertura ao projeto do Papa”. Ao desejar “uma igreja sinodal e de comunhão”, o bispo Prevost afirmou não ter dúvidas de que o Papa “é guiado pelo Espírito Santo”. “Esta será uma tarefa árdua entre os bispos e em geral no que diz respeito a todos os agentes pastorais da Igreja”, acrescentou.
O novo prefeito, que tomará posse em 12 de abril, nasceu nos Estados Unidos da América (EUA) de pai descendente de franco-italianos e de mãe descendente de espanhóis. Estudou Matemática e Filosofia na Universidade de Villanova, na Pensilvânia, e só depois entrou na Ordem dos Agostinianos. Foi como membro dessa instituição religiosa que passou largos anos como missionário no Peru, tendo sido provincial nos EUA e, por dois mandados sucessivos, superior geral dessa Ordem.
Interrompeu estudos em direito canónico que tinha ido fazer para Roma, aos 27 anos, na Pontifícia Universidade de Santo Tomás de Aquino e foi já a partir da sua experiência missionária que defendeu a sua tese de doutoramento intitulada “O Papel do Prior Local da Ordem de Santo Agostinho”, classificada com suma cum laude (distinção e louvor).
Na qualidade de superior geral, viajou por todo o planeta, assumiu o pelouro das relações com os diferentes dicastérios da Cúria Romana e tornou-se poliglota, já que domina, além do inglês e do espanhol, italiano, francês, português, e, apenas como leitor, alemão e latim.
De volta a Chicago, sua província originária, em 2013, o Papa Francisco nomeou-o, no ano seguinte, administrador apostólico de Chiclayo e titular dessa diocese no ano seguinte. Além de ser, em segundo mandato, vice-presidente da Conferência Episcopal Peruana, o Papa nomeou-o em 2019 membro da então assim designada Congregação para o clero, e, no ano seguinte, da Congregação para os Bispos. Conhece já, por isso mesmo, os cantos à casa.
Ao assumir o novo encargo, Robert Francis Prevost ganhará o título de arcebispo e passará a ser também, por vontade do Papa, o novo presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, cargo que era até agora ocupado pelo seu antecessor.
Ouellet: um ‘peso pesado’ salpicado por dois casos de abusos

O cardeal Ouellet tornou-se um “peso pesado” do Vaticano e muito prestigiado entre a alta hierarquia da Igreja, sobretudo de pendor mais conservador. Diz-se que foi um dos nomes que circulou como papabile nos últimos dois conclaves e setores que acompanham os assuntos do Vaticano têm-no considerado um potencial candidato, em próximo conclave, dado o seu perfil moderado.
Apesar de se inserir numa linha não muito coincidente com a do atual Papa, foi considerado um seu colaborador fiel e quando o arcebispo e ex-núncio nos EUA, Carlos Maria Viganò, exigiu publicamente a demissão de Francisco, em 2018, por exemplo, Ouellet foi um cardeal que não hesitou em condenar vigorosamente esse gesto. Em declarações ao jornal National Catholic Reporter, que este meio de comunicação agora recordou, Ouellet disse, na altura, que os padres que não estão em comunhão com Francisco deveriam perguntar: “O que estou eu a fazer aqui?”.
Nos últimos tempos, e, em particular, desde agosto de 2022, a imagem do cardeal Marc Ouellet foi, no entanto, manchada pelo surgimento do seu nome numa lista de membros do clero do Canadá acusados de abusos de teor sexual, em pelo menos dois casos, no tempo em que ele foi arcebispo do Québec, entre 2002 e 2010.
Num dos casos, Ouellet saiu duplamente ferido, já que o nome do clérigo que o Vaticano designou para inquirir a vítima era um padre jesuíta amigo e colaborador próximo do próprio cardeal. O Vaticano acabaria por entender não haver matéria para agir contra o cardeal. Posteriormente, este anunciou a intenção de proceder judicialmente contra a denunciante. Os dois casos encontram-se ainda abertos na justiça do Canadá.