
Frei Bento Domingues discursa na cerimónia de homenagem aos 30 anos de crónicas no jornal Público. Foto © Agência Ecclesia/HM
Nesta terça-feira, 3, O 7MARGENS e o Público organizaram uma sessão evocativa dos 30 anos de crónicas de frei Bento Domingues naquele jornal diário. O jornalista Jorge Wemans, responsável pelo convite ao frade e teólogo dominicano, explicou no início da sessão, que decorreu no auditório da redacção do Público em Lisboa, as razões do convite feito em 1992. É esse texto que a seguir reproduzimos.
A sessão integral pode ser vista em vídeo no endereço https://www.publico.pt/aovivo/detalhe/frei-bento-domingues-teologo-praca-publica-30-anos-401
Hoje é um dia muito feliz. Também poderia dizer, usando uma expressão cristã, é um dia bem-aventurado. Então, seja: hoje é um dia bem-aventurado – e como têm sido raros nos tempos que correm os dias de boa ventura!… – porque festejamos a vida, a fé, a escrita de um homem feliz, de um crente para quem a felicidade de cada um e de todos é não apenas uma referência teológica central, mas também, e talvez sobretudo, um modo de vida, um modo de procurar a vida. Felicitações, pois, para o Público e para o 7MARGENS que se juntaram para nos possibilitar esta festa.
Felizes estávamos também, o António Marujo e eu, quando, depois de várias conversas, fomos almoçar com o Frei Bento Domingues para o convidar a escrever uma crónica semanal neste jornal. Estávamos entusiasmados com o impacte que as suas crónicas, escritas quase um ano antes, a propósito da segunda visita do Papa João Paulo II a Portugal, tinham tido em quem não o conhecia. Estávamos certos de ter encontrado quem tirasse a religião da sacristia, mostrando como ela alimenta atitudes e culturas com repercussões no espaço público e como por sua vez se enriquece e é interpelada pela vida que ocorre na praça pública.
A escrita de Frei Bento Domingues revela-nos – sem proselitismo nem falsos pudores – as conceções antagónicas do ser humano, do homem e da mulher, que se escondem por detrás de algumas bizantinices eclesiais, ou nos debates que parecem ser sobre o sexo dos anjos, mas que na verdade nascem do enfrentamento de visões opostas sobre o destino da humanidade. Contudo, se o nosso autor é um decifrador dos enredos religiosos em cujos bastidores nos faz entrar, não se compraz em permanecer neles, pois ele é sobretudo um decifrador do enigma de se estar vivo, de viver. Da vida em sociedade.
Este homem de quem hoje celebramos três décadas de crónicas é, também, um precursor. Descobriu a alegria de acreditar no Deus de Jesus Cristo, muito antes de um Papa ter dedicado à alegria do Evangelho uma exortação apostólica inteira. Já era um cristão “fora da caixa” muito antes da expressão ter sido inventada. Se assim era desde o princípio, com o andar do tempo tornou-se também num cronista “fora da caixa”. E podia continuar com outros exemplos…
Contudo, prefiro sublinhar um outro aspeto. Não é por acaso que se assina uma coluna de opinião neste jornal todas as semanas durante 30 anos. Não há acasos que durem tanto tempo. Acontece que Frei Bento Domingues casa na perfeição com o Público. Ambos procuram o novo em detrimento do já conhecido, partilham o mesmo gosto pela liberdade, pelo rigor e pela constante procura do outro lado das coisas, do outro lado das pessoas, da outra perspetiva também possível, embora escondida, dos acontecimentos. Tal como Vicente Jorge Silva, Frei Bento Domingues é, como ele próprio afirma, “um insurreto”. Ambos habitados por aquela irreverência quase juvenil que é fonte da indignação que torna os imperativos de consciência urgentes, inescapáveis, incontornáveis.
Obrigado, Frei Bento Domingues!
