Centenas de pessoas disseram, esta sexta-feira, um sentido adeus a Arlindo Magalhães, o presbítero que foi para elas uma referência ao longo das quase cinco décadas em que esteve à frente da Comunidade Cristã da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia.
De forma surpreendente, o “ecumenismo na prática” fez-se visível na celebração, dois dias depois do início da Semana da Oração pela Unidade dos Cristãos.
Já na véspera, apesar da chuva e do vento que fustigavam quem se atreveu a “subir o monte” para rezar na presença do corpo do padre Arlindo, a igreja se encheu com muitas pessoas.
Com o bispo do Porto a presidir e mais três bispos e dezenas de padres a concelebrar, fizeram-se ouvir os cânticos “históricos” daquela comunidade, alguns deles criados expressamente para ali serem cantados.
O bispo Manuel Linda pôs em evidência, no ministério de Arlindo Magalhães, a relação com a Palavra de Deus, através do ensino, da homilia e outras formas. Sublinhou igualmente o trabalho catecumenal por ele desenvolvido na comunidade, orientado “para que as pessoas tomassem nas suas próprias mãos o projeto do evangelho”. Com esta aposta na novidade, sublinhou, Arlindo tornou-se “um homem do futuro, não do passado”.
O bispo do Porto destacou, nesta linha, a aposta que ali foi feita na formação de uma comunidade, não centrada sobre si mesma, mas “aberta a todas as comunidades, à grande comunidade… com tudo o que a faz, incluindo as dificuldades”.
Finalmente, depois de partilhar o teor de uma carta dos últimos anos, que recebera do padre Arlindo, na qual ele comunica a decisão de ir suspender o catecumenato, ao fim de mais de 40 anos em que houve um ou por vezes dois grupos em funcionamento, o bispo referiu-se à atenção que na Serra do Pilar foi dada aos laços de união e fraternidade, no plano do ecumenismo, que ainda hoje perduram.

Missa do funeral do p. Arlindo Magalhães, presbítero da Comunidade da Serra do Pilar. Foto © Manuel Pinto
O ecumenismo voltou à assembleia, já quase no final da celebração, quando, no momento de ação de graças, o bispo Jorge Pina Cabral, da Igreja Lusitana, se levantou para lembrar os caminhos que a Comunidade da Serra do Pilar e a Comunidade do Torne, territorialmente vizinhas, desbravaram ao longo de mais de quarenta anos, desde que o padre Arlindo iniciou ali o seu ministério.
“Eram vizinhos que viviam perto mas estavam longe”, disse ele, “até que perceberam que tinham algo mais que os unia: a mesma fé em Jesus Cristo”. E desde 1980, uma vez por mês, juntaram-se para rezar, alternadamente na “Serra” e no Torne. Foi o ecumenismo posto em prática de forma duradoura e efetiva, que explicou a presença do bispo da Igreja Lusitana naquele momento, assim como do bispo emérito lusitano, Fernando Luz Soares, e de um grupo de cristãos da Comunidade do Torne.
A intervenção foi sublinhada por uma salva de palmas.
Ainda em ação de graças foi lido um poema de Manuel Neto da Silva, que, originalmente, foi criado e musicado per Fernando Lapa para a comunidade da Serra. Deixamos aqui o texto:
Quando abrires as fronteiras do universo
e encerrares as fronteiras do viver
estaremos diante do teu Reino
Pois vais restaurar todas as coisas!
Quando forem destruídas as cidades
e a ruína assolar a Criação,
estaremos diante do teu Reino
porque queres a Nova Criação!
Quando o corpo for o pó de que é formado
e a vida em nosso sangue se extinguir,
estaremos diante do teu Reino
porque tu prometeste a Paz eterna!
Quando a luz deixar vazio o nosso olhar
e a nossa voz já não se ouvir entre outros
estaremos diante do teu Reino
porque tu és o Deus da nossa Morte!
Quando a morte dos homens peregrinos
for a entrega da Vida à Esperança
estaremos diante do teu Reino
porque és o Deus Vivo e Verdadeiro!
(Manuel Neto da Silva)