
Entre as medidas de apoio da liderança chinesa, ainda que sem calendário de implementação, incluem-se a redução dos custos da educação para as famílias. Foto: Direitos reservados.
A República Popular da China anunciou, no início desta semana, que os casais passam a poder ter até três filhos. Esta é uma resposta do Politburo do Partido Comunista Chinês aos resultados do último recenseamento da população, os quais apontam para um cenário de desaceleração demográfica que coloca em risco os planos de crescimento económico e de base para o recrutamento militar no país.
Em 11 de maio último, o instituto chinês para a estatística divulgou os dados relativos a 2020, segundo os quais a população ultrapassava 1.400 milhões, com uma queda de 18 por cento relativamente aos nascimentos do ano anterior. Cada mulher em idade fértil tem em média 1,3 filhos.
O ritmo não tem parado de descer desde 1953. Primeiro, com a política de apenas um filho por casal, imposta em finais dos anos 70, a orientação era deliberadamente controlar o crescimento populacional, mas a queda drástica de nascimentos começou a refletir-se na faixa produtiva.
O Banco Central da China recomendou ao Governo, em nome do vigor económico do país, que acabasse com a política de controlo da natalidade. Este, porém, em reunião presidida pelo líder máximo, optou por aliviar o limite em vigor, de dois filhos por casal, imposto em 2016. Além disso, aumentou a idade da reforma dos trabalhadores e instituiu benefícios aos casais que tenham filhos.
De acordo com a Reuters, entre as medidas de apoio da liderança chinesa, ainda que sem calendário de implementação, incluem-se a redução dos custos da educação para as famílias, o aumento do apoio fiscal e habitacional, e a garantia dos interesses jurídicos das mulheres trabalhadoras.
No entanto, o problema do país parece cada vez mais residir na resistência dos casais jovens a terem filhos. Sobretudo nos grandes centros urbanos, os elevados custos com a habitação e os serviços de cuidados das crianças tornam a vida dos casais muito difícil sem uma política de apoios do Estado.
O regime de planeamento estatal da natalidade, segundo o Washington Post, mostrou ter sido um falhanço e resultado no descontentamento popular devido aos métodos usados, em que se chegou a recorrer a abortos forçados, esterilizações e multas de valor elevado.
Mesmo sem chegar a esses extremos, um estudo recente publicado pela ONG Human Rights Watch denunciava a discriminação das mulheres que engravidavam sob a cobertura dos dois filhos por casal.
Intitulado Take Maternity Leave and You’ll Be Replaced: China’s Two-Child Policy and Workplace Gender Discrimination (em português, “Goza de licença de maternidade e serás despedida”: A política chinesa dos dois filhos e a discriminação de género no local de trabalho), este relatório de 37 páginas foi no encalço de sinais dessa discriminação em documentos judiciais, inquéritos, redes sociais e reportagens nos media.
“Ao pressionar no sentido de uma taxa de natalidade mais alta sem proteções adequadas de emprego, o Governo chinês deu aos empregadores uma licença para perseguir e discriminar”, afirma o autor do estudo.
“A política de três filhos é um passo à frente, mas a questão é: se a política de dois filhos não levou a que as pessoas tenham mais, isso acontecerá com uma política de três?” pergunta Sun Xiaomei, professora da China Women’s University, citada pelo Washington Post.
Tal como no mundo ocidental, as novas gerações preferem desistir de ser pais para manter o seu próprio padrão de vida. A diferença está na existência de sistemas, ainda que muito desiguais, de segurança social.
Uma pesquisa no popular microblog Weibo da agência noticiosa Xinhua revela que 29.000 entre 31.000 utilizadores responderam que não queriam três filhos, segundo o trabalho da Reuters já citado.