
O padre Lucas Perozzi, brasileiro, estava em Kiev quando começou a guerra, e por lá ficou até hoje. Foto captura de ecrã
A guerra começou há 12 meses e o Padre Lucas Perozzi, um brasileiro de 37 anos que pertence ao Caminho Neocatecumenal, praticamente nunca abandonou o seu posto. Vigário da Igreja da Dormição da Virgem Maria, em Kiev, sobressaltou-se, como todas as pessoas, quando as sirenes tocaram nas primeiras vezes a anunciar a iminência de ataques aéreos, mas agora, diz, já está acostumado a isso. A tal ponto que já nem liga muito. Nem ele, nem os outros. “As pessoas habituam-se. Acostumam-se a ouvir as sirenes, acostumam-se a essa forma de vida, acostumam-se a tudo…”, refere numa entrevista que concedeu à Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS).
No entanto, isso não significa que não haja um alarme interior, um medo escondido. “Queira-se ou não, isso fica debaixo do subconsciente da pessoa”, explica. Há um ano, tinha a guerra apenas começado, o padre Lucas contava que era difícil viver numa cidade a ser bombardeada. Agora, fala de uma cidade que já se habituou ao ruído das sirenes e que ganhou novas rotinas. Como a de sobreviver sem electricidade às vezes durante muitas horas por dia. “Os bombardeamentos são uma coisa do quotidiano. O problema que nós temos agora é outro. Há muitos cortes de luz, e as pessoas ficam muito tempo sem energia e então vêm aqui à Igreja porque nós conseguimos ter electricidade graças à ajuda de diferentes organizações, como a Fundação AIS, por exemplo…”
Os geradores e as placas solares oferecidos à paróquia fazem toda a diferença. “As pessoas vêm para aqui e trabalham aqui. Temos duas ou três salas que abrimos e elas ligam os computadores, as coisas deles e trabalham aqui na paróquia. Muita gente também vem pedir para fazer um chá…. Temos até uma máquina de café.”
Mas há coisas que não se esquecem. A brutalidade dos combates, as imagens de destruição, as mortes, a violência. Lucas Perozzi conta-nos o que vê. “Muita gente vem aqui também falar dos seus problemas, pelo que estão a passar. As pessoas estão muito nervosas. Nota-se isso simplesmente a conduzir, na cidade. A agressividade das pessoas…. E nota-se também no aumento muito grande de casos de depressão e de suicídios. E tudo isso é por causa da guerra. Tudo isso é por causa do ‘stress’ que as pessoas estão a viver por causa da guerra”, diz o sacerdote.
A guerra está omnipresente mesmo quando não se fala disso, mesmo quando não se quer até saber das notícias. A guerra está presente em todo o lado, mudou a vida de todas as pessoas. É como uma sombra. Novos fiéis, mas a mesma dificuldade. Como falar do amor aos inimigos num país em guerra? “Eu não preciso de explicar, porque eles têm muito claro quem é o inimigo. Nós todos temos muito claro quem é o inimigo…” Mas, mesmo assim, o padre brasileiro nunca deixou de pregar o amor mais radical e foi sempre escutado e todos sempre acolheram as suas palavras “sem revolta”. Isso, diz, “consola-o”.