
Graffiti numa parede em Gaza: o patriarca Pizzaballa denuncia a “política de desprezo como antecâmara da violência”. Foto © Newtown grafitti_Wikimedia Commons
“Estamos a assistir a uma violência cega e nunca antes vista, estamos quase à beira de uma guerra civil”, diz o patriarca latino de Jerusalém, Pierbattista Pizzaballa, para quem “a política de desprezo levadas a cabo por formações extremistas de direita – o desprezo é sempre a antecâmara da violência” é o que está por detrás da nova vaga de violência.
Neste domingo, o Papa Francisco voltou a referir-se ao tema, condenando a “inaceitável” morte de crianças no conflito entre Israel e Palestina: “Nestes dias, violentos confrontos armados entre a Faixa de Gaza e Israel aumentaram e arriscam-se a degenerar numa espiral de morte e destruição”, avisou, na sua alocução após a recitação da oração do Regina Caeli.
Francisco recordou ainda que várias pessoas ficaram feridas e “muitos inocentes morreram, entre eles também crianças”. “Isto é terrível, é inaceitável. A sua morte é um sinal de que não se quer construir o futuro, pelo contrário, querem destruí-lo”, afirmou, citado pela Ecclesia.
“O crescendo de ódio e de violência que atinge várias cidades de Israel é uma grave ferida para a fraternidade e convivência pacífica entre os cidadãos, que será difícil curar sem que se volte a abrir, imediatamente, o diálogo.”
O Papa pediu ainda o fim da lógica do “ódio e da vingança”, julgando que se pode construir a paz “destruindo o outro”: “Em nome de Deus, que criou todos os seres humanos iguais nos direitos, nos deveres e na dignidade, e que os chamou a conviver como irmãos, entre si, apelo à calma, pedindo a quem tem responsabilidade que faça cessar o fragor das armas e percorra os caminhos da paz, também com a ajuda da comunidade internacional”.
Desde segunda-feira que há ataques do Hamas contra Israel, com foguetes, e ataques de Israel contra a Faixa de Gaza, com bombardeamentos. Nos dias anteriores, tinha já havido confrontos entre palestinianos e militares israelitas, a ponto de, logo no domingo, 9, o Papa ter manifestado já a sua preocupação com a situação.
Até este domingo, morreram pelo menos 182 palestinianos na Faixa de Gaza, incluindo 52 crianças e 22 mulheres. Em Israel, há pelo menos 10 mortos.
“Crimes de guerra” e “despejos inaceitáveis”
Em declarações neste domingo à TSF, o director da agência das Nações Unidas para os refugiados palestinianos em Gaza, Matthias Schmale, condenou o que classificou como crimes de guerra. “Como trabalhador humanitário, diria que sim, há crimes de guerra a acontecer. O facto de pelo menos 13 crianças que iam às nossas escolas, terem sido mortas, sem qualquer motivo, é um crime de guerra. Para mim, matar civis é um crime de guerra”.
Também os patriarcas e líderes das igrejas cristãs de Jerusalém se mostraram “profundamente desanimados e preocupados” com a nova situação de violência armada em Jerusalém. “Esses acontecimentos, que ocorreram tanto na Mesquita de Al Aqsa como no (bairro) Xeque Jarrah, violam a santidade do povo de Jerusalém e de Jerusalém como a Cidade da Paz”, dizem, numa declaração conjunta publicada quinta-feira passada, dia 13.
Os líderes cristãos contestam ainda os despejos “inaceitáveis a que têm sido sujeitos os palestinianos. E acrescentam: “O carácter especial de Jerusalém, a Cidade Santa, com o actual status quo, obriga todas as partes a salvaguardar a já delicada situação da Cidade Santa”, diz o documento. “A crescente tensão, apoiada principalmente por grupos radicais de direita, põe em perigo a já frágil realidade em Jerusalém e nos arredores”, acrescenta o texto, apelando à intervenção da comunidade internacional para pôr fim às “acções provocadoras” – um apelo repetido também pelo Conselho de Igrejas do Médio Oriente.
Para o patriarca latino de Jerusalém, Pierbattista Pizzaballa, que vive há 30 anos na Terra Santa, “o que estamos observando hoje é o resultado de anos de política de desprezo e também de abandono”, diz, em declarações à agência SIR, da Conferência Episcopal Italiana, e que podem ser lidas em português no boletim informativo da Unisinos.
Pizzaballa denuncia também casos de agressão contra algumas famílias [cristãs], não por motivos religiosos, mas por serem árabes. “Fui chamado pelas paróquias que me pediram para fazer alguma coisa, promover encontros com judeus e muçulmanos, a fim de acalmar a situação. Entre as pessoas há tanta surpresa e grande preocupação por uma violência que explodiu de forma muito rápida e inesperada, sinal evidente de um cansaço que já vinha se formando há algum tempo.”
O patriarca considera que é “importante que as comunidades e os líderes religiosos” ajudem a “reconstruir a confiança”, mesmo se esse é um trabalho longo. “Não devemos ter muitas ilusões esperando resultados rápidos. É um trabalho que parte de longe, das escolas, em primeiro lugar, ensinando convivência, respeito, tolerância e direito”.