
Marko Ivan Rupnik: os jesuítas querem que ele se mantenha na região de Roma. Foto © Centroaletti, CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons
O padre Marko Ivan Rupnik, acusado (e, em parte, julgado pelo Vaticano) por abusar de freiras, foi intimado pela Companhia de Jesus, de que é membro, a não se afastar da região de Roma, enquanto decorrerem inquéritos preliminares relativos a denúncias por parte de novas vítimas.
A informação acaba de ser divulgada pela redação em Itália da Agência Católica de Informação (ACIPrensa) que cita como fonte o padre Johan Verschueren, conselheiro geral e delegado para as Casas Jesuítas e Obras Interprovinciais de Roma. Este alto responsável da Companhia de Jesus e superior direto de Rupnik assegurou que lhe pediu para “não abandonar a região do Lazio”, em Itália, que inclui Roma e arredores.
Apesar de ter sido anunciado, no início de janeiro, que o padre Rupnik se encontra presentemente a viver num mosteiro, informações da Catholic News Agency referem uma resposta do seu superior que deixa a possibilidade de não ser assim. Tendo-lhe sido perguntado se Rupnik estava de facto num mosteiro, Johan Verschueren teve uma resposta inconclusiva: “Isso muito me surpreenderia”. Com base nesta resposta, a ACIPrensa levanta a possibilidade de os responsáveis dos jesuítas desconhecerem onde está aquele seu membro.
As investigações em curso, indicou o padre Verschueren, referem-se “às novas informações dos depoimentos e a algumas novas denúncias que foram apresentadas à nossa equipa de referência” (alusão ao grupo criado pelos jesuítas para receber e tratar este tipo de situações). Ele fez notar que “ainda não é altura” de fazer o ponto de situação sobre essas investigações, o que deverá ocorrer “em algum momento do mês de fevereiro”.
A quarta vítima conta a sua história
Entretanto, o italiano Domani voltou nesta terça-feira, 24, a este assunto, divulgando uma nova entrevista – a quarta – com outra religiosa da Comunidade Loyola, também de nacionalidade eslovena.
Klara (nome fictício) acusa Rupnik de, desde a adolescência, a ter manobrado para que não seguisse o curso de enfermeira (de que gostava para poder ajudar os outros, eventualmente como missionária) e pressionando-a para que entrasse no Instituto Loyola.
Uma vez aí, terá começado a abusar dela sexual e psicologicamente, desde os 22 anos, tendo ele, nessa altura, 32. O processo, pormenorizado na entrevista, foi idêntico ao de outros casos já vindos a público desde dezembro: manipulação psicológica, abuso sexual, eventualmente com envolvimento de outra religiosa, e agressão psicológica e emocional, quando ela começou a resistir às pretensões do agressor.
O padre Marko Rupnik não dá qualquer sinal de querer responder a mensagens de contacto por parte dos media, nomeadamente no Centro Aletti, onde costumava viver. Também do Vaticano não há qualquer declaração sobre este caso, o que está longe de contribuir para uma apreciação positiva da política seguida de combate aos abusos.
Enquanto isso, começam a conhecer-se algumas consequências. Na Eslovénia, repetem-se os pedidos e apelos a que ele entregue ao Estado o prestigiado prémio artístico que recebeu em 2000 e outros galardoados começam a manifestar incomodidade por se encontrarem na mesma lista de um abusador.

Jesus Cristo e Inácio de Loiola carregando a cruz, pormenor de mosaico de Rupnik na Cova de Santo Inácio (Manresa, Catalunha). Foto © Medol, CC BY-SA 4.0, via Wikimedia Commons.
Na Polónia, o jornal Life in Krakow relata que as vítimas de abusos, que desde 2019 se encontravam uma vez por mês para rezar no santuário dedicado a João Paulo II, em Cracóvia, acabam de decidir mudar de lugar: sentiam-se incomodadas por estarem num local cujo interior é decorado com os painéis de mosaicos do padre Rupnik.
Por sua vez, a Universidade Católica Francisco de Vitoria, em Espanha, mandou suspender os trabalhos de decoração da nova capela em construção, que se encontravam em fase de conceção e desenvolvimento pela equipa liderada por Marko Rupnik. A notícia veio na ACIPrensa.
Já em meados de dezembro a Pauline Books and Media decidiu retirar do mercado três traduções de livros de Rupnik para inglês. Uma semana antes, o bispo de Versalhes, em França, emitiu um comunicado conjunto com o pároco de Montigny-Voisins anunciando o cancelamento de uma obra de decoração da nova igreja desta paróquia, que tinha sido contratada ao padre Rupnik.
Papa fala pela primeira vez sobre o caso
Na entrevista dada pelo Papa Francisco a Nicole Winfield, jornalista da Associated Press [ver outra notícia no 7MARGENS], ela refere-lhe que a comunicação dos Jesuítas sobre o caso dos abusos do padre Rupnik não foi muito clara, dando conta ao Papa das dúvidas que ficaram sobre o modo como o assunto foi decidido.
Perante este âmbito delimitado da questão, a resposta de Francisco revela que o primeiro caso de abuso, relativamente recente, apreciado na então Congregação da Doutrina da Fé, em 2021, conduziu a um acordo, que envolveria uma compensação à vítima em dinheiro.
Quando, nesse ano, se descobre um percurso de abusos de há algumas décadas, com início na Eslovénia, percebe-se, afirma o Papa, “que se está a lidar com uma pessoa muito limitada, que por vezes é, no entanto, poderosa”.
Passando para um registo em abstrato e fazendo uma comparação com lideres nazis ou fascistas, que podem “fazer muito mal”, o Papa acrescenta: “não é uma limitação que os impede, é uma limitação que os torna delinquentes. E nisto ajuda muito a distinguir entre pecado e crime”.
“Os pecados, explica, são sempre perdoados. Somos todos pecadores. Mas o crime, sim eu perdoo, mas tu pagas, reparas o crime. E nisto tem de se ser muito claro. Não basta perdoar e que [quem é perdoado] não reincida. Não, não! É preciso reparar e ver como reparar. E alguns devem abandonar o estado clerical porque não podem continuar numa tal situação pastoral”.