Jorge Sampaio, um laico cristão

| 23 Set 2021

Jorge Sampaio.

“Jorge Sampaio era um “laico cristão” em tudo o que esta expressão possa ter de estranho, mas inteiramente verdadeiro.” Foto: Jorge Sampaio. © António Pedro Ferreira/Expresso, cedida pelo autor.

 

Já tudo, ou quase tudo, foi dito e escrito sobre a figura do Jorge Sampaio. Assinalando a sua morte, foram, por muitos e de múltiplas formas, sublinhadas as diversas facetas definidoras da sua personalidade nos mais diversos aspetos.

Permitam-me a ousadia de voltar a este tema, para sublinhar um aspeto que não vi, falha minha porventura, sublinhado como considero ser merecido.

Conheci Jorge Sampaio há muitos, muitos anos, quando ambos fomos alunos na instrução primária, no Colégio Inglês, à época na rua da Quintinha, em Lisboa, perto do Instituto Britânico.

Voltámos a encontrar-nos, largos anos depois nas crises académicas, iniciadas com a publicação do célebre Decreto nº 40.900, nos finais da década de 1950, e intensificadas em princípios da década de 60 do século passado, com as greves académicas.

Foi, no entanto, com a sua candidatura vitoriosa à Câmara Municipal de Lisboa e, posteriormente, na primeira candidatura à Presidência da República, igualmente vitoriosa, e a minha participação (final de 1995 a final de 1998) no elenco do XIII Governo Constitucional que as nossas relações se estreitaram, construindo uma sólida amizade só interrompida no passado dia 10, com a sua morte. Devo, assim, antes de prosseguir, uma declaração de interesses: era e, de alguma forma, continuo a ser amigo de Jorge Sampaio.

Qual então o aspeto que gostaria de sublinhar, na vida de Jorge Sampaio e não me pareceu ver referido nas múltiplas intervenções a propósito da sua morte? Recorro ao título que escolhi para esta pequena nota pessoal: Jorge Sampaio era um “laico cristão” em tudo o que esta expressão possa ter de estranho, mas inteiramente verdadeiro. Era laico, referindo-o de si próprio, sem nunca o ter ouvido dizer ser agnóstico. Era cristão pelo seu exemplo de vida, pessoal e pública, como muitos testemunhámos, aqueles que viveram atentos à coisa pública nos últimos 30 anos. Como escreveu Leonete Botelho no Público (dia 10 do corrente) Jorge Sampaio conseguiu fazer todo o seu longo percurso de vida pública e brilhante desempenho político “sem ceder ao cinismo nem abdicar do humanismo e do sentido de missão que deve nortear a política”. Não existirão muito mais fortes expressões para qualificar as virtudes cristãs de um político.

Ao longo de todo este seu percurso, permitam-me que destaque dois ou três factos bem demonstrativos de toda a sua preocupação com o outro, com os irmãos, diria um cristão, principalmente com os mais débeis, os mais fracos e desprotegidos. Já não falo na sua enorme paixão pela libertação do povo timorense, da qual fez um marco essencial das suas Presidências. Falo de todo o seu labor, enquanto presidente da Câmara Municipal de Lisboa, deixando a marca indelével para o fim dessa chaga social que era, à data, o Casal Ventoso e as suas barracas (obra terminada pelo seu sucessor João Soares). Terminar com as condições degradantes de habitabilidade que aí se viviam, transferindo as suas populações para uma habitação condigna, é uma tarefa profundamente cristã.

Falo também “das gémeas de Baião”, tantas vezes referidas na altura da sua morte, às quais Jorge Sampaio deu condições para prosseguirem os seus estudos e, pessoalmente, acompanhou com amizade, proporcionando as condições de transporte necessárias para saírem da sua aldeia e continuarem a estudar, a caminho de uma vida melhor.

Falo ainda da Plataforma Global de Apoio aos Estudantes Sírios, recentemente alargada às raparigas e às meninas afegãs, a qual permitiu já, muito concretamente, a vinda de estudantes sírios para a Universidade do Algarve. Sobre este ponto merece a pena lembrar recentes palavras da vice-reitora para a Investigação e Internacionalização da Universidade, que afirma pretender continuar “não só a receber alunos pela Plataforma Global de Assistência a Estudantes Sírios, mas também aderir ao programa de emergência de bolsas de estudo e de oportunidades académicas para jovens mulheres afegãs, anunciado em Agosto por Jorge Sampaio”, o que bem demonstra da vitalidade desta iniciativa.

Jorge Sampaio demonstrou, permanentemente, ao longo da sua vida pública, esta constante preocupação com “o outro”, escolhendo sempre os mais desprotegidos, os mais pobres, os mais débeis socialmente, ao fim e ao cabo, aqueles que não têm vez, nem voz. Os pobres tão incessantemente lembrados pelo Papa Francisco. E se isto se passou na vida pública de Jorge Sampaio, ficámos a saber na cerimónia do seu funeral, no Mosteiro dos Jerónimos, pela boca de sua filha Vera que, a nível da sua vida mais íntima, na relação com os filhos, Jorge Sampaio tinha uma regra semelhante, ao ensinar os filhos a ser mais exigentes consigo mesmos do que com os outros e mais generosos para os outros do que para si.

Síntese maravilhosa de vida em benefício do outro.

E tudo isto vem de um Homem que se afirma laico. Que grande lição de cristianismo, na linha da mais pura doutrina. É na carta de S. Tiago (Tg, 2, 17,18) que podemos ler “Assim também a Fé: se ela não tiver obras está completamente morta. Mais ainda poderá alguém alegar sensatamente: Tu tens a Fé, e eu tenho as obras; mostra-me então a tua Fé sem obras, que eu pelas minhas obras te mostrarei a minha Fé”.

Jorge Sampaio, talvez sem nunca se ter apercebido, era afinal um Homem de Fé. Um laico cristão !!!

 

Fernando Gomes da Silva é engenheiro agrónomo.

 

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