
Passagem do Mar Vermelho. Iluminura no Ritual de Vartan, de T’Oros Roslin, 1266, Jerusalém. Patriarcado arménio.
Perante a escalada de hostilidades no conflito entre a Arménia e o Azerbaijão, que nas últimas semanas voltaram a disputar o enclave de Nagorno-Karabakh, vários líderes religiosos do Azerbaijão condenaram os ataques por parte da Arménia, que na semana passada atingiram uma área residencial em Ganja, a segunda maior cidade do país, noticiou este sábado a agência turca Anadolu Agency. Um arcebispo arménio aponta, por seu lado, responsabilidades à Turquia, acusando-a de estar a usar o Azerbaijão para atacar a comunidade cristã da região.
“Nós, líderes religiosos do Azerbaijão, declaramos que estamos unidos ao povo, ao Estado e ao nosso presidente neste caminho certo. Exigimos a implementação das resoluções do Conselho de Segurança da ONU, que estipulam a saída incondicional do exército arménio dos territórios ocupados do Azerbaijão”, escreveram os representantes religiosos numa declaração conjunta.
O texto foi assinado pelo Grão Mufti do Cáucaso, Allahsukur Pashazadeh, pelo bispo da Igreja Ortodoxa Russa, Alexandr, pelos líderes das comunidades judaicas, Milikh Yevdayev e Aleksandr Sharovsky, e ainda da Igreja Cristã Alban Udi, Robert Mobili.
Os responsáveis das diversas Igrejas organizaram uma reunião conjunta, durante a qual o Grão Mufti fez questão de deixar um agradecimento ao presidente turco Recep Tayyip Erdogan, e a Ali Erbas, responsável pelo gabinete da presidência para os Assuntos Religiosos.
Um dia antes, o primaz da diocese de Artsakh (a designação arménia para Nagorno-Karabakh) da Igreja Apostólica Arménia, Pargev Martirosyan, afirmara à agência espanhola EFE que a Turquia estava a utilizar o Azerbaijão para atacar a comunidade cristã no enclave e a perpetrar um “terceiro genocídio” contra a mais antiga nação cristã do mundo. Tanto Martirosyan como o patriarca e Catholicos dos Arménios, Karekin II, consideram, todavia, que este “nunca foi um conflito religioso“.
“Desrespeito chocante pela vida”, denuncia Amnistia
Já esta segunda-feira, 20 de outubro, a Amnistia Internacional (AI) emitiu um comunicado denunciando a utilização de armamento pesado no conflito, particularmente em áreas povoadas, e pedindo que o recurso ao mesmo “pare imediatamente”.
Peritos da equipa de resposta de crise desta organização de defesa dos direotos humanos analisaram as provas disponíveis e concluíram que tanto a Arménia como o Azerbaijão estão a usar armas pesadas de grande alcance em zonas residenciais densamente povoadas, “no que parece ser uma violação da lei humanitária internacional”.
A Amnistia afirma que mísseis balísticos e salvas de rockets conhecidos pela sua falta de precisão estão na origem das mortes de civis dos últimos dias na região e considera estar perante um “desrespeito chocante pela vida e pelas leis da guerra”.
“As evidências de fotos e vídeos mostram os danos devastadores que essas armas podem causar, já que hospitais e escolas foram destruídos, e outras infraestruturas civis vitais, como estradas e redes de comunicação, danificadas”, afirma Denis Krivosheev, diretor da AI para a Europa Oriental e Ásia Central, citado num comunicado enviado ao 7MARGENS.
“Estamos mais uma vez a apelar a todas as partes no conflito que deem prioridade à proteção dos civis e ao respeito pelo Direito Internacional Humanitário. O uso desse tipo de armas e sistemas de armamento em áreas povoadas deve parar imediatamente”, insiste o responsável da Amnistia Internacional.
O regresso deste conflito, há três semanas, já provocou oficialmente cerca de 700 mortos, mas os números reais serão certamente superiores, com cada uma das partes a alegar ter dizimado milhares de inimigos. No passado sábado, foi anunciada uma “trégua humanitária”, mas os dois Estados já se acusaram mutuamente de desrespeitar o cessar-fogo e ter realizado novos ataques.
A guerra entre os dois países, que estalou depois do desmembramento da antiga União Soviética, em 1989, já provocou pelo menos 30 mil mortos.
(Sobre a situação de guerra dos últimos dias pode ouvir-se no programa Estado de Sítio, da TSF, uma entrevista ao jornalista Paulo Nunes dos Santos, que esteve em reportagem no território.)