
Pedro Strecht durante a apresentação do relatório final da Comissâo Independente, a 13 e fevereiro de 2023. Esta quinta-feira, o coordenador da comissão entregou a lista de alegados abusadores identificados nos institutos religiosos. Foto © Clara Raimundo/7MARGENS.
Pedro Strecht, coordenador da extinta Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa (CI), entregou esta quinta-feira, 27 de abril, ao presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), o bispo José Ornelas, uma lista de 17 nomes de alegados abusadores que foram identificados em dez institutos religiosos, na sequência do estudo realizado pela CI. O ato de entrega, que contou com a presença do historiador Francisco Azevedo Mendes, responsável pelo Grupo de Investigação Histórica da CI, concretizou-se com um envelope fechado, durante a assembleia geral da Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal (CIRP), que decorre até esta sexta-feira, em Fátima.
Dos nomes entregues, dez já morreram, dois estão no ativo, quatro já estão fora de atividade (dos quais dois não estão vinculados ao instituto) e um é desconhecido, de acordo com um comunicado da CIRP enviado ao 7MARGENS.
“Manifestamos a nossa profunda gratidão a todas as pessoas vítimas que deram o seu doloroso testemunho, o qual permitiu trazer luz à realidade dos abusos de menores no seio da Igreja. Deixamos uma palavra de coragem àquelas que ainda não foram capazes de falar sobre os acontecimentos trágicos que tocaram as suas vidas, para que consigam denunciar o crime abjeto que sofreram”, diz o texto. “Estamos unidos ao seu sofrimento, dor e revolta e queremos, sincera e humildemente, pedir-lhes perdão pelos abusos de que foram vítimas nos nossos Institutos”.
O documento sublinha ainda o “caminho de reparação” que a Igreja Católica está a fazer em Portugal, reafirmando a disponibilidade da CIRP para “acolher as vítimas que o desejem e garantir que não faltará o adequado apoio, seja ele psicológico, psiquiátrico, jurídico, financeiro ou espiritual, para a recuperação possível das feridas profundas que foram infligidas”.
De acordo com o comunicado, a distribuição dos nomes recebidos é a seguinte:
Irmãos Maristas | 2 não ativos e não vinculados ao Instituto |
Irmãs Reparadoras de Nossa Senhora de Fátima | 1 no ativo |
Missionários da Consolata | 1 falecido |
Ordem dos Frades Menores (Capuchinhos) | 1 no ativo |
Ordem dos Frades Menores (Franciscanos) | 2 falecidos e 1 não ativo |
Ordem Hospitaleira de São João de Deus | 1 não ativo |
Província Portuguesa da Companhia de Jesus (Jesuítas) | 4 falecidos |
Religiosas do Coração de Maria | 1 colaborador leigo falecido |
Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos) | 1 falecido |
Salesianos | 1 falecido e 1 desconhecido |
Em relação aos casos que já tinham sido noticiados – por exemplo, no caso dos jesuítas, são 12 –, a divergência tem a ver com o facto de esta lista ser relativa a nomes recolhidos pelo Grupo de Investigação nos arquivos das instituições, enquanto as próprias congregações tinham já recolhidos outros elementos internos.
Esta lista agora entregue será analisada por cada responsável, no sentido de fazer “uma adequada identificação dos alegados abusadores e das situações em que ocorreu o alegado abuso, de forma que seja possível tomar as medidas civis e canónicas previstas para estes casos”.
A CIRP – que reúne 132 Institutos Religiosos e Sociedades de Vida Apostólica existentes em Portugal (94 femininos e 38 masculinos) – começa por agradecer o trabalho desenvolvido pela CI ao longo do último ano, falando num “estudo essencial para compreendermos o contexto dos abusos de menores na Igreja e assim encontrarmos um novo rumo a seguir para evitar que estes crimes voltem a acontecer”, de acordo com o princípio de “tolerância zero” pedido pelo Papa Francisco.
À saída, o pedopsiquiatra afirmou aos jornalistas ter sentido “uma enorme disponibilidade para, perante erros do passado, construir o futuro de uma maneira diferente”. E acrescentou que, em nome da CI, foi também falar, a propósito de abusos sexuais, de “prevenção e de formas de atuação, tanto agora, já, no presente, em relação àqueles que foram vítimas no passado, mas, sobretudo, numa melhor construção do futuro”.
Sobre o Grupo VITA – Grupo de acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal, apresentado na quarta-feira, Pedro Strecht referiu aos jornalistas “a importância de ter sido constituído” e de ter “um tempo de três anos para funcionar”.
Também a CIRP saúda, no seu comunicado, a criação do Grupo Vita, coordenado pela psicóloga Rute Agulhas, e que tem como uma das suas tarefas a elaboração de um manual de prevenção de situações de abuso sexual sobre crianças e adultos vulneráveis na Igreja Católica em Portugal.
Pedro Strecht deixou ainda um apelo para que o tema dos abusos sexuais não seja esquecido “na sociedade em geral” e expressou “um agradecimento profundo de toda a anterior Comissão Independente à comunicação social”, considerando que o trabalho dos media foi essencial para que a mensagem da comissão chegasse a mais pessoas.
Para o próximo dia 2 de maio está marcada a ida da CI à audição parlamentar na Assembleia da República, na sequência de uma decisão aprovada por unanimidade no passado dia 8 de março. Serão ainda ouvidos sobre o tema dos abusos de menores, além da Comissão Independente, a CEP, o Corpo Nacional de Escutas, o Instituto de Apoio à Criança, a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e ainda a ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, sobre as recomendações deixadas pela CI, “algumas das quais a concretização carece de intervenção legislativa”.