
Centenas de sepulturas não identificadas foram descobertas em Marieval, província de Saskatchewan (Canadá). Foto: reprodução de reportagem da TV CBC.
A comunidade autóctone Cowessess anunciou esta quarta-feira, 23 de junho, ter feito “a descoberta horrível e chocante de centenas de sepulturas não identificadas”, no local de Marieval, província de Saskatchewan (Canadá), onde existiu durante quase um século um dos muitos internatos-escola de crianças compulsivamente arrancadas aos pais para serem “civilizadas”.
As buscas iniciaram-se no mês passado, depois de terem sido encontrados os restos mortais de 215 crianças, na localidade de Kamloops, junto à Indian Residential School, na província da Columbia Britânica, como o 7MARGENS já noticiou.
“É absolutamente trágico, mas não surpreendente”, escreveu na rede social Twiter Perry Bellegarde, chefe da Assembleia das Primeiras Nações, que representa mais de 900 mil autóctones no Canadá.

Reprodução do Twitter de Perry Bellegarde, chefe da Assembleia das Primeiras Nações.
O internato de Marieval recebeu crianças indígenas de 1899 a 1997, antes de ser demolido, dois anos depois, e substituído por uma escola de dia.
Calcula-se que perto de 150 mil crianças foram internadas à força em 139 escolas do mesmo tipo até aos finais do século XX.
Governo quer desculpas formais do Papa
Na sequência da primeira descoberta, desencadeou-se um braço de ferro entre o poder político e a Igreja Católica, que foi a responsável pela educação das crianças em muitos dos internatos. O primeiro ministro canadiano, Justin Trudeau, e membros do seu Governo têm vindo a exigir do Papa a assunção de responsabilidades e um pedido formal de desculpas aos povos das “Primeiras Nações” (designação que se refere aos descendentes dos povos originais do território que constitui hoje o Canadá).
O Papa já se referiu ao assunto, mas não foi tão longe quanto pretendiam os dirigentes daquele país.
Por sua vez, a Conferência Episcopal do Canadá anunciou em comunicado que, até o final do ano, uma delegação de povos e comunidades indígenas do país irá a Roma para se encontrar com o Papa Francisco. “Um projeto” – especifica-se – em que os bispos e as organizações nacionais First Nations, Métis e Inuit estão a trabalhar “há mais de dois anos”, e que foi atrasada pela pandemia. O encontro com o Papa contará com a presença de um grupo heterogéneo de “anciãos/guardiães do conhecimento”, sobreviventes das escolas residenciais e jovens de todo o país.
No Dia Nacional dos Povos Indígenas, assinalado no dia 21 de junho, o arcebispo Roger Damphousse, de Ottawa-Cornwall, fez publicar uma mensagem-vídeo em que assume as falhas da Igreja. “Como bispo, junto-me a outros bispos e líderes religiosos no Canadá para expressar as minhas desculpas. Como Igreja, falhámos”, reconheceu ele.
O arcebispo faz referência na sua mensagem-vídeo a essa página trágica da história canadiana e diz: “Como Igreja, falhámos não apenas porque não fomos testemunhas autênticas da caridade de Jesus Cristo, mas porque pecámos contra irmãos e irmãs que devíamos cuidar”. E acrescentou: “As palavras não podem anular a dor e não podem fazer com que as crianças voltem para as suas famílias.”
Damphousse afirmou ainda no vídeo: “Como membro da Igreja Católica e como bispo, estou desolado. Eu sei que não estou sozinho na minha dor. Uno a minha voz àqueles que pedem ao Santo Padre um pedido de desculpas aos povos indígenas do Canadá.”