
Nesta foto das execuções sumárias em Inn Dinn, em setembro de 2017, divulgada pela Reuters, podem ser vistas duas armas manufaturadas localmente pela junta militar de Myanmar, refere o estudo do SAC-M.
A junta militar de Myanmar (Birmânia) tem vindo a massacrar o seu povo com armas fabricadas com materiais e componentes que lhe estão a ser vendidos por pelo menos 13 países, que incluem três da União Europeia, os Estados Unidos da América, o Japão, a Rússia e a China.
A informação consta de um estudo do SAC-M, Special Advisory Council for Myanmar (Conselho Consultivo Especial para a Birmânia), intitulado “Negócio Fatal: Fornecendo a Produção de Armas pelos Militares de Myanmar”, tornado público esta segunda-feira, 16 de janeiro, que tem por objetivo rastrear o armamento e o seu uso, bem como mapear as dezenas de fábricas dependentes da Direção (militar) da Indústria de Defesa daquele país asiático. Uma nota geral sublinha que o sustento do fabrico de armamento na Birmânia é assegurado de forma decisiva por empresas e grupos ligados ao setor, oriundas em muitos casos de países que se dizem democráticos, alguns dos quais contestam a política da junta militar, em termos públicos e oficiais.
Na sequência do golpe militar de fevereiro de 2021, que depôs o governo da prémio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, a Junta que (re)tomou o poder realizou execuções sumárias, massacres, repressão violenta de manifestações pacíficas e outros atentados aos direitos humanos, reiteradamente denunciados por diversas organizações internacionais.
As próprias religiões que estão presentes no país têm sido severamente atingidas, com ataques a espaços de celebração e perseguição aos ministros do culto.
Com base na análise de depoimentos de testemunhas e de evidências fotográficas e videográficas relativas a essas violações de direitos humanos, os especialistas do SAC-M identificaram o tipo de armamento utilizado pelos agentes de segurança e pelos militares, o qual traz, em geral, a marca da indústria local.
Esta conclusão vai ao encontro de uma tendência que acompanha o poder militar no país há algumas décadas, de desenvolver localmente o fabrico de armamento como espingardas, metralhadoras, armas antitanque e antiaéreas, mísseis e lançadores de mísseis e sistemas de artilharia e defesa aérea. Porém, para se tornarem autossuficiente, os militares necessitam de importar ou adquirir matéria-prima, tecnologia, peças e licenças de produção.
“Há empresas estrangeiras que estão a capacitar os militares de Myanmar – que são dos piores violadores dos direitos humanos do mundo – para produzirem muitas das armas que usam para cometer atrocidades diárias contra o povo”, disse Yanghee Lee, integrante do SAC-M e ex-relator especial da ONU para Myanmar.

Entre os países onde essas empresas estão sediadas, surgem mencionados no relatório agora divulgado a França, a Áustria, a Alemanha e, ainda, a Rússia, Estados Unidos, Índia, China e Japão, entre outros. Por sua vez, refere o documento, Singapura funciona como “um ponto de trânsito estratégico para volumes potencialmente significativos de itens” e como sede de corretoras de negócios” entre os países de origem e as fábricas de armamento dos militares birmaneses. Taiwan, por sua vez, funcionaria como “um importante ponto de trânsito” para a “compra de máquinas (…) de alta precisão, inclusive de fabricantes europeus” com o mesmo destino.
Lee enfatizou que as empresas estrangeiras têm “responsabilidades morais e legais para garantir que os seus produtos não facilitem violações dos direitos humanos contra civis” e que “não fazer isso torna-os cúmplices dos crimes bárbaros dos militares de Myanmar”.
O SAC-M recomenda, assim, que os Estados de origem identificados neste relatório investiguem e, conforme o caso, iniciem procedimentos administrativos e/ou legais contra as empresas envolvidas nestas atividades, dado que estas “têm a responsabilidade de respeitar os direitos humanos”.
Dados da Associação de Assistência a Presos Políticos da Birmânia, citados pela Associated Press, indicam que mais de 2.700 civis foram mortos em atos violentos, incluindo 277 crianças, enquanto mais de 13 mil pessoas foram detidas.