
Maria e o Menino, pormenor da obra “Descanso na Fuga para o Egito” (1594-1596), Caravaggio / Wikimedia Commons
Neste dia nasceu Jesus
Todos os anos vos conto como foi
Para que se mantenha viva a Sua memória
Esperava-O desde que me lembro
Mesmo antes do Anjo já sonhava com Ele
Mas quando soube que O tinha em mim, estremeci
Ao perceber que se cumpria a Sua Presença
Em que eu acreditei sempre
No dia seguinte a vida seguiu igual
Só eu estava diferente
O mistério indizível crescia em mim
Sentia a Salvação mexer-se no meu ventre
E apesar dos enjoos normais acreditava
Quando chegou a altura de partir
Custava-me andar e não foi fácil a viagem
Sentada no burrico sonhei com Jesus feito homem
Também Ele assim entrava em Jerusalém
E entre o pó e o calor imenso acreditei
Procurámos pousada quando chegámos
E eu humanamente pensei que as portas se abririam
Mas a noite e o frio caíram sobre nós
Somente a natureza nos abrigou numa gruta
E limpando uma manjedoura continuei a acreditar
Quando chegou o momento fiz força como as outras mulheres
E como elas gritei encostada a José
No silêncio só ouvia a respiração melodiosa dos animais
No céu uma estrela em particular brilhava ardentemente
E envolto em sangue e palha segurei e acreditei no Filho de Deus
O seu corpo quente estava mudo e inerte
E conheci a agonia que me iria acompanhar
Chorando e gemendo disse “Meu Deus porque me abandonaste?”
E docemente o apertei contra o meu peito e o beijei
E diante dos meus olhos chorou pela primeira vez, e eu acreditei
Naquele momento aquela criança divina era apenas o meu filho
Cortei o cordão que nos ligava com os meus dentes
A sua primeira ceia foi o meu leite
O que aconteceu depois já o sabeis, Jesus entrou na história
E eu continuei a amá-lo, acreditando sempre
Liomarevi (pseudónimo literário), 26 de Dezembro de 2020