O antigo padre chileno Fernando Karadima, que foi condenado pelo Vaticano por abuso sexual em 2011, e que foi o primeiro de uma sucessão de casos de abusos do clero revelados no Chile, morreu numa clínica em Santiago, capital do país. Tinha 90 anos.
A notícia da morte, ocorrida no último domingo, foi confirmada pela Agência France Presse (AFP), citada em vários meios de comunicação.
As três vítimas que denunciaram o caso reagiram: “Morreu Fernando Karadima, ex-padre católico que abusou sexual e espiritualmente de muitas pessoas, entre as quais nós. Tudo o que tínhamos a dizer de Karadima já está dito. Ele foi mais um elo desta cultura de perversão e encobrimento na Igreja”, escreveram, numa declaração pública, Juan Cruz (que entretanto já se encontrara com o Papa Francisco), o médico James Hamilton e o filósofo Andrés Murillo.
“Nós estamos em paz e vamos continuar a lutar para que esses crimes não voltem a ocorrer e por tantas pessoas que também viveram isto e ainda não conseguiram justiça”, acrescentam no texto.
Até hoje, ainda se desconhece o número exacto de pessoas que foram abusadas por Karadima, recorda o Crux, que acrescenta que o ex-padre foi expulso do ministério pelo Vaticano em 2018, naquela que até aí era a sentença mais grave aplicada a casos destes.
O caso Karadima esteve na origem de um dos principais escândalos de abusos clericais. De tal modo que, na sua visita, ao Chile, o Papa cometeu o erro – por ele mais tarde admitido – de dizer que o bispo Juan Barros não podia ser condenado enquanto não houvesse provas. O próprio Francisco ordenou uma investigação, que em 2300 páginas de documentos trouxe a lume muitos casos de abusos e de encobrimento, e que terminou com uma carta duríssima do Papa à Igreja no Chile e com um terço dos bispos a serem substituídos ou removidos – incluindo Barros, logo entre os primeiros.
Karadima, que esteve na paróquia de El Bosque, num dos bairros mais ricos da capital, construíra uma rede de ligações com políticos, empresários e outras elites do país. Apreciado pela dinâmica que criava na paróquia, era também considerado o mentor de alguns bispos.
O Crux recorda ainda que o antigo padre morreu sem ter reconhecido os seus crimes – e depois de a Justiça chilena ter arquivado o cas, acrescenta a AFP. Um dos irmãos mais novos de Karadima encontrou-se com o Papa em 2018 e apelou depois publicamente ao irmão que admitisse os seus erros e pedisse desculpa.
“Fernando, pede perdão. Não em silêncio a Deus, nas tuas orações, mas torna-o público, para que as pessoas te ouçam pedir desculpa pela dor que causaste às vítimas e a todos”, disse Óscar Karadima ao jornal La Tercera. “Fernando, és um homem que vai morrer. Como te atreves a morrer assim, como um homem orgulhoso que não pede desculpa?”