
Dois judeus sefarditas lêem a Torá: são cada vez menos a faz-lo, na Europa. Foto © Sagie Maoz/Wikimedia Commons
Um novo estudo do Institute for Jewish Policy Research, publicado esta semana, revela que a percentagem de judeus a residir na Europa diminuiu 60% desde 1970. A pesquisa recua até ao final do século XIX, em que 88% da população judaica mundial vivia no continente europeu, e mostra que, neste momento, o número corresponde a apenas 9%: a proporção mais baixa em 1000 anos.
Intitulado “Os judeus na Europa na viragem do Milénio”, o estudo foi realizado por dois reconhecidos demógrafos judeus, o israelita Sergio DellaPergola e o russo Daniel Staetsky, e identificou 1,3 milhões de residentes na Europa continental, Reino Unido, Turquia e Rússia, que se descrevem como judeus. Em 1970, seriam 3,2 milhões.
Tal diminuição, depois da morte de cerca de seis milhões de judeus europeus durante o Holocausto, está ligada, sobretudo, à emigração de mais de 1,5 milhões de pessoas após a queda da Cortina de Ferro, sobretudo para os Estados Unidos da América.
O estudo foca o caso particular da Alemanha, onde a comunidade judaica se encontra em “estado terminal”. Mais de 40% dos 118 mil judeus que ali residem têm idade superior a 65 anos, e as crianças até aos 15 anos correspondem a menos de 10%. Essa realidade, semelhante à de países como a Rússia e a Ucrânia, “prenuncia altas taxas de mortalidade e um inevitável declínio populacional no futuro”, que já não tardará muito a chegar.
“A proporção de judeus residentes na Europa é quase a mesma que era na época do primeiro relatório da população judaica global, conduzido por Benjamin de Tudela, um viajante medieval judeu, em 1170”, indicam os autores do novo estudo, o mais abrangente de sempre alguma vez realizado no continente.
É certo que a evolução demográfica dos judeus na Europa teria sido “totalmente diferente” sem o impacto do Holocausto, afirma DellaPergola, citado pelo jornal Times of Israel. “Mas isso foi há 75 anos, e algumas das tendências que vemos hoje, e que estão a levar ao declínio, têm pouco a ver com o genocídio”, sublinhou. Entre essas tendências, encontram-se a taxa crescente de casamentos mistos e a diminuição da natalidade entre os casais judeus.
A França, onde reside a segunda maior população de judeus provenientes da diáspora (a seguir aos Estados Unidos), é responsável por grande parte do declínio na Europa Ocidental. Existem atualmente 449.000 judeus no país, em comparação com os 530.000 que ali residiam em 1970. De acordo com o relatório, só desde o ano 2000, 51.455 judeus franceses decidiram rumar a Israel, um número muito superior ao registado em qualquer outra nação da Europa Ocidental. A Bélgica, num distante segundo lugar, viu 2.571 judeus seguirem o mesmo caminho.
Na origem do êxodo de judeus franceses está a procura de um melhor nível de vida, mas também o medo do antissemitismo. “A França é hoje um lugar onde um professor de História pode ser decapitado na rua”, recorda DellaPergola, referindo-se ao assassinato do professor Samuel Paty, no passado dia 16, nos arredores de Paris.
Há, no entanto, algumas exceções ao quadro geral de declínio, todas elas em países onde a comunidade judaica ortodoxa tem uma grande expressão. São os casos da Áustria, Bélgica, Reino Unido e Suíça, em que o número de judeus “pode estar a crescer, ou pelo menos, a não diminuir”, de acordo com o relatório, que se baseia em dados dos censos oficiais, números fornecidos por instituições judaicas e ainda uma sondagem realizada pela União Europeia em 2018.
De qualquer forma, estas exceções não deverão reverter a tendência de declínio, defende o estudo. “Apenas em circunstâncias excecionais as tendências demográficas modificam radicalmente o seu curso”, escrevem os autores. Ainda que, reconhecem, tenham ocorrido modificações “mais de uma vez na demografia judaica europeia durante os últimos cem anos”.