O que pode acontecer a um euro que se oferece ao Programa Alimentar Mundial (PAM) para dar de comer a alguém? Na oração de sapiência, proferida na celebração dos 38 anos de existência do Instituto Politécnico de Bragança (IPB), Pedro Matos, o português responsável pela ajuda de emergência do PAM, explicou o caminho que percorre um euro doado àquela organização. Que tem um outro programa em que, através de uma aplicação, alguém pode saber a quem foi atribuído, por exemplo, um pacote de leite oferecido.

Om Sultan está preocupada porque pode perder o seu filho por causa da malnutrição. Em Outubro de 2020, 360.000 crianças iemenitas corriam risco de morte por causa da fome, naquela que é ainda a crise mais grave que o PAM enfrenta. Foto: WFP/Mohammed Awadh
A celebração dos 38 anos e do dia do IPB – este ano de forma diferente do habitual, por causa da pandemia – decorreu no passado dia 28 de janeiro, com a presença de apenas algumas pessoas no campus e largas centenas, em todo o mundo.
Pedro Matos referiu-se, em pormenor, à atual estratégia do PAM: deixar de transportar alimentos de um lado para o outro, promovendo a sua aquisição nos mercados locais. A agência continua a levar e distribuir alimentos a quem necessita, quando não há outra possibilidade. Ao mesmo tempo, está a atribuir dinheiro às pessoas que apoia, que o podem utilizar na compra dos alimentos nos mercados locais, quando isso é possível. Ou então, em verdadeiros supermercados sociais criados e geridos pela agência das Nações Unidas. Para que as pessoas não recebam somente os alimentos, mas criem e mantenham como normal o hábito de ir às compras. Dos dez mil milhões de dólares que o PAM distribui, quase um terço já é feito desta forma.
Parece muito dinheiro mas, distribuído pelo número de pessoas alimentadas, é muito pouco. Pedro Matos deu o exemplo do Iémen, neste momento a operação mais cara do PAM. Todos os meses, a agência distribui 170 milhões de dólares. Parece uma cifra muito elevada. Contudo, tendo em conta que, com essa verba, se dá de comer a doze milhões de pessoas, significa que se consegue alimentar uma pessoa, com três refeições por dia, por apenas cinquenta cêntimos.
O responsável da organização que combate a fome em todo o planeta referiu também os cinco mil camiões, trinta barcos e cem aviões e helicópteros, que todos os dias circulam no mundo para levar alimentos a cem milhões de pessoas, de noventa países – e cujo trabalho valeu ao PAM o Prémio Nobel da Paz de 2020, como ele descreve no vídeo a seguir (a partir de 1h22’)
Três bancos: voluntariado, alimentos e roupas
A oração de sapiência feita por Pedro Marques foi uma das iniciativas que o IPB tem promovido, no sentido de cuidar de quem mais precisa. A atenção aos problemas mundiais complementa-se com a disponibilidade para colaborar com instituições nacionais, regionais e locais, entre outras, através do seu Programa de Voluntariado.
Esta iniciativa surgiu já há alguns anos, em articulação com instituições de solidariedade, culturais e ambientais ou de promoção do bem-estar animal, contribuindo para a integração dos seus estudantes na instituição e cidade que os acolhe. O programa pretende também apoiar os membros da comunidade académica mais carenciados ou com necessidades especiais.
Nos últimos meses, por causa da pandemia, foi ainda mais difícil do que nos anteriores, colocar os seus voluntários em entidades externas ao IPB. Por esse motivo, investiu-se mais no “voluntariado interno”, criando-se um Banco Solidário de alimentos e de roupas.
Inicialmente, foi na comunidade académica que se recolheram os primeiros géneros. Outras entidades – Cruz Vermelha, Unidade Local de Saúde e anónimos – têm contribuído de forma generosa para o Banco Solidário. Têm também surgido iniciativas de vários grupos de trabalhadores, docentes, unidades de investigação e associações de estudantes que têm alimentado esta ideia.

O Banco de Alimentos, de forma algo semelhante ao que o PAM está a fazer, funciona como um supermercado on-line. Os interessados inscrevem-se e, depois de um processo de triagem, é-lhes dado o acesso à “aquisição” de bens, sendo-lhes creditado semanalmente um valor que pode ser utilizado para “comprar” entre os géneros disponíveis na plataforma. O pedido é tratado por voluntários e os beneficiários são informados da data e da hora em que podem levantar os seus bens.
O Banco de Roupas está a ser organizado e pretende-se que tenha o aspeto de uma loja como tantas outras. As roupas são entregues a quem delas precisa. Tendo em conta que alguns estudantes utilizadores do Banco de Roupa são estrangeiros, muitas vezes oriundos de países quentes, optou-se pelo formato de “empréstimo”; ou seja, os estudantes usam a roupa pessoal ou de cama e devolvem-na, devidamente tratada, no momento da partida para os países de origem. Esta circularidade permite o não desperdício e a solidariedade para com os colegas que virão a seguir.
Com estas iniciativas, o IPB – instituição bem colocada nas classificações académicas internacionais – procura também dar atenção à formação solidária da sua comunidade e promover hábitos de atenção ao outro. Também a sustentabilidade e reutilização dos bens que tantas vezes se acumulam nas casas e acabam no lixo, quando ainda podem ser aproveitados por quem deles necessita, são outras preocupações.
