Situação agrava-se na Nicarágua

ONU vai investigar direitos humanos no regime de Daniel Ortega

| 1 Abr 2022

Entre outro tipo de práticas atribuídas pela ONU ao regime de Daniel Ortega e da esposa, que é vice-presidente, a resolução refere “atos de intimidação, assédio e vigilância ilegal ou arbitrária de defensores dos direitos humanos, prisões arbitrárias e intimidações. Foto: Direitos reservados.

 

A ONU vai enviar um grupo de três especialistas para investigar a situação dos direitos humanos na Nicarágua, na sequência de vários casos que colocam em evidência situações graves de violação daqueles direitos. A resolução, cuja finalidade é “reunir, preservar e analisar informações e evidências” nessa matéria, foi adotada nesta quinta-feira, 31 de março, pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU. O período em análise será entre abril de 2018, quando eclodiu uma revolta popular, e a atualidade.

Proposta por nove governos – Equador, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Paraguai e Peru – a resolução contou com o patrocínio de cerca de meia centena de estados. Os investigadores têm um mandato inicial de um ano, devendo “identificar os responsáveis” por abusos e violações de direitos humanos.

O documento, que foi aprovado por 20 países, com votos contra de sete e abstenção de outros 20, expressa preocupação com “a deterioração da democracia e a situação dos direitos humanos na Nicarágua”, onde ocorreu “um aumento das restrições ao espaço democrático e a repressão da dissidência”.

Entre outro tipo de práticas atribuídas pela ONU ao regime de Daniel Ortega e da esposa, que é vice-presidente, a resolução refere “atos de intimidação, assédio e vigilância ilegal ou arbitrária de defensores dos direitos humanos, prisões arbitrárias e intimidações. E exige igualmente a libertação imediata dos detidos injustamente e a investigação de casos de assédio a líderes políticos, jornalistas, ativistas e outros críticos do regime de Ortega, lamentando ainda a “falta de responsabilização” de funcionários do aparelho repressivo, bem como a proibição de manifestações pacíficas e de ações judiciais sem o devido processo.

 

Embaixador denuncia em direto ditadura no seu país

O caso da recente morte do preso político Hugo Torres, um histórico ex-guerrilheiro sandinista que morreu em 12 de fevereiro após meses de detenção “em condições ultrajantes”, é também referido.

A procuradora-geral da Nicarágua, que interveio por videoconferência antes da votação da resolução, afirmou a “rejeição absoluta”, pelo seu Governo, desta resolução e de outras que têm sido tomadas no mesmo sentido no Conselho de Direitos Humanos.

Recorde-se que o regime de Ortega colocou na prisão todos os potenciais candidatos às últimas eleições presidenciais, que se realizaram em novembro último. Nas vésperas desse ato, o Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) aprovou uma resolução na qual exigiu a libertação imediata desses candidatos e de todos os presos políticos naquele país, aprovada com 26 votos a favor, sem votos contra e 7 abstenções. Porém, o regime não deu ouvidos a esse pedido.

O próprio embaixador da Nicarágua junto da OEA, um ex-jornalista, íntimo do Presidente nicaraguaio, no cargo há apenas cinco meses, sentiu-se no dever de se rebelar contra o seu governo e o casal que dirige o país, num ato que formalizou em 23 de março último, numa intervenção ao vivo, feita numa reunião de embaixadores da organização. “Denunciar a ditadura do meu país não é fácil, mas calar e defender o indefensável é impossível. Eu tenho que falar, mesmo que esteja com medo”, acrescentou.

“Às vezes somos muito duros com aqueles que, depois de viverem erradamente, decidem canalizar as suas vidas pelos caminhos do bem e da justiça”, comentou, em referência ao caso do embaixador, o bispo nicaraguense Sílvio Báez, bispo auxiliar de Manágua, que vive exilado em Miami desde 2020.

 

Núncio apostólico declarado “persona non grata”
Waldemar Stanislaw Sommertag nuncio nicaragua foto facebook Comunidad Cristiana San Ramon

O núncio apostólico em Manágua, o arcebispo polaco Waldemar Stanislaw Sommertag, foi expulso do país no início de março. Foto retirada da página de Facebook da Comunidad Cristiana San Ramon.

 

Os bispos católicos, que já foram considerados “terroristas” por Ortega, têm procurado gerir uma situação que, no dia-a-dia, é extremamente complicada, com bispos e padres a serem permanentemente ameaçados e perseguidos, sobretudo desde os levantamentos populares de 2018 contra o aumento do custo de vida.

O caso mais recente foi o do núncio apostólico em Manágua, o arcebispo polaco Waldemar Stanislaw Sommertag, que, no início do mês de março deste ano, foi considerado pelo regime  “persona non grata”, tendo sido expulso, de facto, do país.

O diplomata atuou, sobretudo entre 2018 e 2021, como intermediário entre o Governo e as famílias de muitos dos jovens detidos nas manifestações. Mas, nos últimos tempos, perante o agravar da situação de muitos deles, começou a designar os detidos por “presos políticos”, o que irritou o poder. Uma primeira reação foi retirar ao núncio a prerrogativa, comum entre os embaixadores do papa em muitos países, de serem o “decano do corpo diplomático”. Em 18 de novembro de 2021, Ortega assinou um decreto em que acabou com essa distinção.

Como explica a jornalista Inés San Martin, correspondente do jornal Crux junto do Vaticano, “quando um embaixador é expulso de um país, normalmente o diplomata correspondente também é expulso”. No entanto, neste caso, isso não aconteceu, já que a embaixadora da Nicarágua junto da Santa Sé, Eliette Ortega Sotomayor, tinha deixado o cargo em agosto de 2021, e Ortega nunca a substituiu.

 

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