No discurso proferido pelo bispo de Roma, Papa Francisco, para a apresentação do percurso pastoral para o Sínodo 2023, disse o seguinte: “Entretanto o Sínodo, ao mesmo tempo que nos proporciona uma grande oportunidade para a conversão pastoral em chave missionária e também ecuménica, não está isento de alguns riscos. Menciono três. O primeiro é o risco do formalismo. Pode-se reduzir um Sínodo a um evento extraordinário, mas de fachada, precisamente como se alguém ficasse a olhar a bela fachada duma igreja sem nunca entrar nela. Pelo contrário, o Sínodo é um percurso de efetivo discernimento espiritual, que não empreendemos para dar uma bela imagem de nós mesmos, mas a fim de colaborar melhor para a obra de Deus na história. Assim, quando falamos duma Igreja sinodal, não podemos contentar-nos com a forma, mas temos necessidade também de substância, instrumentos e estruturas que favoreçam o diálogo e a interação no Povo de Deus, sobretudo entre sacerdotes e leigos. Por que destaco isto? Porque às vezes há algum elitismo na ordem presbiteral, que a separa dos leigos; e, no fim, o padre torna-se o ‘patrão da barraca’ e não o pastor de toda uma Igreja que está avançando. Isto requer a transformação de certas visões verticalizadas, distorcidas e parciais sobre a Igreja, o ministério presbiteral, o papel dos leigos, as responsabilidades eclesiais, as funções de governo, etc.”
Este Francisco parece que adivinha o que poderá acontecer se o Povo de Deus ficar quieto e calado à espera que o clero clericalize todo o caminho sinodal. E está para tal, pelo menos no que se vai passando em Portugal. São os riscos apontados no seu discurso que se tornam factos de formalismos exigentes por parte dos poderes clericais. Chuvas de papéis já existem, com orações, cânticos, ordens de trabalho para reuniões, perguntas a efetuar nas reuniões, nomeações de responsáveis pelo trabalho do Sínodo em paróquias onde não existem, vejam bem!, conselhos de pastoral paroquial, ordens de seguimento de reuniões e de quem anima, melhor, preside, numa amálgama capaz de destruir o próprio parecer dos cristãos e cristãs. Já é horrível a não existência de conselhos de pastoral paroquial, dado que o pároco é o responsável por despoletar o processo da sua criação. Ouvimos: “Estamos a caminhar para lá, é preciso preparar os leigos”; é impressionante este controlo, que, afinal, o Sínodo condena nos seus dois documentos principais.
Não queria que esta grande oportunidade fosse por este caminho; tenho esperança de que se consigam ainda inverter as orientações pastorais que estão a ser seguidas e que fosse, realmente, uma oportunidade de conversão pastoral e não uma “organização de fachada” como refere o Papa Francisco; mas corremos, já, sérios riscos de o caminho estar “empedrado”. Falando sério, queria que o que disseram os leitores do 7MARGENS, que na maioria disseram não acreditar em mudanças pós-sinodais, fosse um engano; parece, ao que tudo leva a crer, que terão razão. Nem o caminho sinodal se irá prosseguir sem pedras; elas levantam-se cada vez mais e os entulhos já cobrem quase todo o caminhar, e quase não se vêem os caminhantes, ou seja, vêem-se sempre aqueles que é normal estarem em tudo, sob a batuta clerical.
Tenhamos, no entanto, a esperança que o poder do Espírito Santo sopre sobre a Igreja em Portugal; e faça aquilo que até hoje ainda não se conseguiu: a conversão pastoral do clero português.
Joaquim Armindo é diácono católico da diocese do Porto, doutorado em Ecologia e Saúde Ambiental.