
O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, em 2012. Foto © Cancillería del Ecuador
A escalada repressiva contra a Igreja católica e outras confissões religiosas na Nicarágua sobe de nível e de gravidade: nos últimos dias o poder político congelou as contas bancárias das instituições católicas do país e acusou a Igreja de branqueamento de capitais. Aparentemente, a estratégia é criar uma situação de asfixia e, finalmente, de encerramento de serviços. “Estamos a assistir a níveis de perseguição religiosa nunca antes vistos”, comenta o opositor político exilado Juan Sebastián Chamorro.
Segundo informações que circularam nos últimos dias da Nicarágua, os responsáveis da Arquidiocese de Manágua e de todas as outras dioceses do país ficaram sem acesso às contas e sem acesso aos respetivos fundos. Deste modo, as paróquias ficam impedidas de pagar aos assalariados que trabalham nos seus serviços sociais, educativos e religiosos, bem como as contas de funcionamento.
A situação não ficou por aqui. Este sábado, 26 de maio, a Polícia Nacional anunciou que, na sequência de investigações, descobriu “centenas de milhares de dólares escondidos em sacos localizados em instalações pertencentes a dioceses do país”, acusando a instituição de “lavagem de dinheiro”. Por outro lado, “ordenou a apresentação de documentos que mostrem os movimentos das contas bancárias das dioceses em que interveio”.
Segundo as autoridades policiais, a igreja lidava alegadamente com fundos e recursos em contas bancárias “que tinham pertencido a pessoas condenadas por traição”.
Entretanto, o cardeal e arcebispo de Manágua, Leopoldo Brenes, que, tal como o Papa, tem sido comedido nos pronunciamentos, reconheceu em declarações à publicação Despacho 505, citadas pelo conhecido blog Il Sismografo, ter sido informado da suspensão das contas. O cardeal disse à mesma fonte que s bispos vão, em breve, analisar a situação, garantindo que “as contas da igreja estão em ordem”. Adiantou igualmente que só soube da acusação de lavagem de dinheiro pelas notícias.
Ignora-se se estas medidas governamentais têm alguma relação com a detenção, uns dias antes, de três padres católicos, párocos em diferentes dioceses nicaraguenses. O que diz o comunicado policial é que terá sido feita uma “remoção ilegal de recursos de contas bancárias sobre asquais recaíam ordens de congelamento e outras atividades ilícitas que ainda estão a ser investigadas, em dioceses de diferentes departamentos.
As movimentações do regime de Ortega têm sido interpretadas como uma tentativa de manietar a Igreja. A advogada Yonarki Martínez considera que se trata de um procedimento ilegal: “O levantamento do sigilo bancário é feito quando há indícios de um crime e para isso é necessária a autorização de um juiz, o procedimento utilizado não é o estabelecido pela Superintendência de Bancos”, afirmou a defensora dos direitos humanos, citada pelo site “100 Noticias”. “Informam que estão a investigar, mas no comunicado já surgem a condenar”, quando, através do Ministério do Interior, poderiam ter feito um pedido por escrito à Igreja, denunciou Martínez.
Uma outra advogada, Martha Patricia Molina, que tem feito relatórios das agressões sistemáticas do regime ditatorial nicaraguense contra a Igreja Católica, não se poderia esperar nada de diferente, quando é o próprio Daniel Ortega a condenar a Igreja em muitas ocasiões, chamando-lhe “terrorista”, “criminosa” ou “máfia organizada”.
Para Molina, existe um “uso arbitrário das leis do país” por parte das autoridades e a Conferência Episcopal do país deveria lançar “um S.O.S. urgente ao mundo”, porque, a seguir ao que já foi feito, não deixarão de “raptar mais religiosos e confiscar os bens imóveis da igreja”.
O político exilado Juan Sebastián Chamorro, por sua vez, escreveu na sua conta do Twitter:
“A ditadura acusa a Igreja Católica de lavagem de dinheiro, congela contas e associa a Igreja a atos de traição. Estamos a assistir a níveis de perseguição religiosa nunca antes vistos. No final, e como sempre acontece, será a Igreja que verá seus caixões passarem”.