
O presidente Daniel Ortega está a ser acusado de perseguição à Igreja Católica no seu país. Foto © Cancillería del Ecuador
O núncio apostólico (embaixador do Papa), em Manágua, expulso; o canal de televisão da Conferência Episcopal da Nicarágua silenciado e um bispo perseguido pelo regime refugiado numa paróquia. Estes atos dos últimos dois meses dão a ideia do grau de perseguição que o regime do Presidente Daniel Ortega e da sua esposa e vice-presidente Rosario Murillo estão a fazer à Igreja Católica.
No início de março último, o regime que há mais de uma década vem calando as vozes dissonantes e que se mantém no poder através de eleições cuja validade a comunidade internacional não reconhece, expulsou o representante papal, o polaco Waldemar Stanislaw Sommertag.
Algo de parecido não se registava desde os tempos de Mao Tse-Tung, que procedeu de igual modo, em 1951.
Na última sexta-feira, 20, o Governo, através do Instituto Nicaraguense de Telecomunicações e Correios (Telcor) invocou questões de natureza administrativa para encerrar o Canal 51, da rede de televisão por cabo dos bispos nicaraguenses, que se encontrava sob a responsabilidade de Rolando Álvarez Lagos, bispo da diocese de Matagalpa, administrador apostólico da Diocese de Estelí e com o pelouro da comunicação no âmbito da Conferência Episcopal.
No dia anterior, este mesmo bispo, segundo informou num vídeo publicado no Facebook, tinha sido perseguido sistematicamente, de manhã até à noite, pela polícia sandinista. Depois de várias peripécias, isso levou-o a refugiar-se na paróquia de Santo Cristo de Esquipulas, nos arredores de Manágua.
Dado que este foi o culminar de perseguições da polícia e de grupos paramilitares, o prelado anunciou ter decidido iniciar naquele local, por tempo indefinido, um jejum de protesto e de oração.
Numa conferência de imprensa improvisada, em que esteve a agência EFE, o bispo foi claro: “O que eu acho é que não só de mim, mas dos pastores da igreja em geral”, o que o Governo quer “é uma Igreja muda, que não anuncie a esperança do povo (…) e [faça] a denúncia do pecado pessoal e das estruturas de injustiça”. No entanto, acrescentou, “se a Igreja se calasse, as pedras gritariam”.
Padres e leigos da diocese de Matagalpa emitiram, entretanto, um comunicado de solidariedade com o seu bispo, em que sublinham: “A nossa Igreja entende que a situação do país não é das melhores para expressar o pensamento em voz alta, a perseguição sofrida por nossos irmãos, como a de nosso bispo Dom Rolando José Álvarez, visa silenciá-la no seu serviço à verdade.”
Várias fontes não têm dúvidas em estabelecer uma relação direta entre a denúncia de perseguição feita pelo bispo e a decisão de encerrar o canal da Igreja. Diante da situação, os religiosos iniciaram um dia de jejum e oração para pedir o fim da perseguição contra a Igreja Católica que se gerou nos últimos dias.
Comentando a situação, o site romano Il Sismografo, que acompanha a atualidade religiosa no mundo, escreve que a Igreja na Nicarágua “tem estado, há vários anos, num crescendo insuportável, no centro de verdadeiras campanhas governamentais com o objetivo de intimidá-la, silenciá-la, eliminá-la, a ponto de se tornar, nas últimas semanas, uma das comunidades católicas mais perseguidas do mundo”.
Il Sismograf comenta ainda que o Papa e a diplomacia vaticana, sempre apelando para o argumento usual de que “o diálogo é sempre melhor que a rutura”, tentaram minimizar por muito tempo, muito tempo, o que aconteceu na Nicarágua, desde a crise de 2016, na qual foram mortos nas várias ondas repressivas mais de 400 pessoas e milhares acabaram na prisão ou em prisão domiciliária”.