
Papa despede-se do Arcebispo Ieronymos. Foto © Vatican Media
Cinco dias em viagem no extremo sudeste da Europa (Chipre e Grécia), cinco dias em que se cruzaram os temas dos refugiados, migrantes, populismos e democracia, por um lado; e diálogo ecuménico, intercultural e inter-religioso por outro. Para ouvir o Papa utilizar palavras diferentes mas insistindo em ideias que já afirmou em outras ocasiões: a possibilidade do “naufrágio” da civilização europeia por causa do que se passa no Mediterrâneo, a necessidade de resolver os problemas dos migrantes e refugiados, as críticas a quem os deixa morrer na costa líbia e, pelo contrário, promove a construção de muros e barreiras fronteiriças.
“Quem constrói muros perde o sentido da história, da própria história”, afirmou o Papa Francisco na conferência de imprensa, que já se tornou habitual, durante o voo de regresso a Roma, vindo da Grécia. “Se um Governo não pode acomodar mais do que um determinado número [de migrantes], deve dialogar com outros países, cada um cuidando do outro. É por isso que a União Europeia é importante”, acrescentou, defendendo que os migrantes devem ser “acolhidos, acompanhados, promovidos e integrados”, mas em todos os países: a falta de “harmonia” entre os Estados-membros da EU cria “guetos”, disse, de acordo com o resumo da conferência de imprensa publicado na Ecclesia.
Outra dimensão importante da viagem foi o diálogo ecuménico. Ainda nesta segunda-feira de manhã, o Papa teve uma audiência privada com o arcebispo ortodoxo de Atenas, Ieronymos II, tendo ambos assinado mensagens de diálogo e reconhecimento recíproco. O responsável da Igreja Ortodoxa Grega dirigiu-se ao Papa como “Santíssimo Irmão de Roma” e Francisco agradeceu-lhe pela “bondade fraterna, mansidão e paciência”.
O encontro seguiu-se à visita que o Papa fizera no sábado à sede do arcebispado, durante a qual dirigiu um pedido de perdão pelos erros cometidos pela Igreja Católica em relação aos cristãos orientais: “Acções e opções que pouco ou nada têm a ver com Jesus e com o Evangelho, antes marcadas por sede de lucro e poder – com vergonha o reconheço, da parte da Igreja Católica –, fizeram mirrar a comunhão. Deixamos, assim, que a fecundidade fosse comprometida pelas divisões. A história tem o seu peso e, hoje, sinto a necessidade de renovar aqui o pedido de perdão a Deus e aos irmãos pelos erros cometidos por tantos católicos.”
Sinal de divisões que se consumaram em 1054, com o chamado Cisma do Oriente, e que ainda permanecem no coração de algumas pessoas: o Papa foi insultado por um clérigo ortodoxo à entrada para o edifício, apelidando-o de “herege”.
Apesar das divisões que permanecem, o Papa referiu a possibilidade de um novo encontro, em breve, com o patriarca Cirilo, de Moscovo. Na próxima semana, o metropolita Hilarion, número dois do patriarcado de Moscovo, encontra-se com Francisco no Vaticano e um encontro entre os dois líderes pode acontecer na Finlândia. Mas o Papa está disponível para ir mesmo a Moscovo, se necessário, disse, de acordo com a transcrição das respostas do Papa no avião, que pode ser lida no portal do Vaticano: “Não há protocolos para o diálogo com um irmão. Irmão é irmão, antes de todos os protocolos. E eu e o meu irmão ortodoxo – quer o seu nome seja Cirilo, quer o seu nome seja Chrysostomos, quer o seu nome seja Ieronymos, ele é um irmão, somos irmãos e dizemos coisas um ao outro na cara.”
Na sua conversa com os jornalistas, o Papa criticou ainda a tentativa frustrada de suprimir as referências ao Natal, num documento da Comissão Europeia. Um “anacronismo”, considerou. “Tantas ditaduras procuraram fazê-lo”, lamentou, referindo-se a um documento de trabalho que previa passar a falar-se de “festas” em vez de Natal. Trata-se de uma “moda de um secularismo diluído, de água destilada”, que “não resultou na história.”