
“Infelizmente, o trabalho, com frequência, é refém da injustiça social e, em vez de ser um meio de humanização, torna-se uma periferia existencial”, afirmou o Papa durante a audiência geral desta semana. Imagem obtida a partir da transmissão em vídeo.
O trabalho clandestino e toda a atividade que é feita em condições que degradam a dignidade dos trabalhadores estiveram esta quarta-feira, 12 de janeiro, no centro das preocupações do Papa Francisco, na alocução que fez na habitual audiência geral.
A figura de José, esposo de Maria, continuou a ser o mote da sua catequese, como há semanas vem acontecendo. Desta vez, centrou-se na sua condição de operário. Explicou que a palavra grega utilizada para designar o trabalho de José tanto pode significar carpinteiro como marceneiro. Em qualquer caso, implicava uma gama diversificada de atividades, algumas delas exigentes e duras. Também não seriam muito bem pagas, já que, observou Francisco, quando ele foi com Maria fazer a apresentação do menino Jesus, levaram a oferta que a lei prescrevia para os mais pobres: um casal de rolas ou de pombas.
“Este dado biográfico sobre José e Jesus – continuou – faz-me pensar em todos os trabalhadores do mundo, especialmente naqueles que trabalham arduamente em minas e em certas fábricas; naqueles que são explorados através do trabalho não declarado; nas vítimas do trabalho (…), nas crianças que são obrigadas a trabalhar como adultos e naquelas que vasculham as lixeiras em busca de algo útil para conseguir umas moedas”.
Ainda a propósito do trabalho não declarado, denunciou que os trabalhadores saem sempre a perder, porque não descontam para a reforma e porque ficam indefesos, em caso de algum acidente de trabalho ou mesmo da perda do posto de trabalho.
Sobre os desempregados, chamou a atenção não apenas para o aspeto da sobrevivência, mas também da dignidade ferida das pessoas que não podem trabalhar. “O que dá dignidade é ganhar o pão, e se não dermos ao nosso povo, aos nossos homens e mulheres, a capacidade de ganhar o pão, é uma injustiça social naquele lugar, naquela nação, naquele continente”, defendeu o Pontífice.
Depois de ter pedido um tempo de silêncio, recordando os que, em especial durante a pandemia, se viram sem trabalho e desesperados de procurar chegaram a pôr fim à vida, o Papa prosseguiu: “O trabalho não é apenas um meio de ganhar a vida: é também um lugar onde nos expressamos, nos sentimos úteis e aprendemos a grande lição da realidade, o que ajuda a vida espiritual a não se tornar espiritualismo. Infelizmente, porém, o trabalho, com frequência, é refém da injustiça social e, em vez de ser um meio de humanização, torna-se uma periferia existencial”.
Nova escapadela do Vaticano

Francisco foi visitar uma loja de discos em Roma, cujos donos são seus amigos. Foto: Direitos reservados.
Mas o Papa, pelo menos de longe a longe, sabe fazer os seus intervalos, se é que se podem chamar intervalos.
Esta terça-feira, 11, ao fim de um longo dia de atividade, lembrando-se de uma promessa que tinha feito há mais de oito anos, saiu fora de muros do Vaticano num Fiat 500 branco, e foi… A uma loja de discos. Estava frio em Roma e era já escuro, mas ainda assim a chegada do homem de branco foi notada por algumas pessoas que, com o passa-palavra, rapidamente se converteram num pequeno grupo concentrado perto da porta, já que ninguém podia entrar.
Pouco mais de dez minutos depois, a porta abriu-se, o Papa saiu, ouviu-se alguém gritar: “Santo Padre!”, mas ele entrou no carro e partiu.
Quem gritou “Santo Padre” foi um jornalista espanhol que, por mero acaso, ia a passar por ali e que, depois de alguma insistência com os donos da loja, conseguiu uma explicação para a visita: Bergoglio, enquanto padre, arcebispo e cardeal costumava ficar alojado perto da loja de discos e era um cliente que foi fazendo amizade com os donos. Quando foi eleito, estes foram apresentar-lhe felicitações e ele prometeu, um dia, visitá-los. Cumpriu agora a promessa. Em agradecimento, recebeu um disco de música clássica. Se comprou algum não se ficou a saber.