
“Podemos dizer que a maior lição que a covid-19 nos deixa em herança é a consciência de que todos precisamos uns dos outros”, sublinha o Papa na sua mensagem. Foto © Vatican Media.
O Papa desafia a Humanidade inteira a, passados três anos sobre o início da pandemia de covid-19, parar e colocar a questão: “O que é que aprendemos com esta situação?”. Na sua mensagem para o 56º Dia Mundial da Paz, que se assinala a 1 de janeiro, Francisco deixa já a sua resposta: “é juntos, na fraternidade e solidariedade, que construímos a paz, garantimos a justiça, superamos os acontecimentos mais dolorosos”.
Divulgada esta sexta-feira, 16 de dezembro, a mensagem do Papa começa com um convite inspirado na primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses a “permanecer despertos, a não nos fechar no medo, na dor ou na resignação, não ceder à dissipação, nem desanimar, mas, pelo contrário, a ser como sentinelas capazes de vigiar vislumbrando as primeiras luzes da aurora, sobretudo nas horas mais escuras”.
Porque, segundo o Papa, “embora apareçam tão trágicos os acontecimentos da nossa existência sentindo-nos impelidos para o túnel obscuro e difícil da injustiça e do sofrimento, somos chamados a manter o coração aberto à esperança, confiados em Deus que Se faz presente, nos acompanha com ternura, apoia os nossos esforços e sobretudo orienta o nosso caminho”.
O caso da pandemia, que Francisco reconhece “ter transtornado inclusive as áreas mais pacíficas do nosso mundo, fazendo emergir inumeráveis fragilidades” é exemplo disso, pois trouxe consigo lições importantes. “Podemos dizer que a maior lição que a covid-19 nos deixa em herança é a consciência de que todos precisamos uns dos outros, que o nosso maior tesouro, ainda que o mais frágil, é a fraternidade humana, fundada na filiação divina comum, e que ninguém pode salvar-se sozinho”, sublinha. “De facto, as respostas mais eficazes à pandemia foram aquelas que viram grupos sociais, instituições públicas e privadas, organizações internacionais unidos para responder ao desafio, deixando de lado interesses particulares. Só a paz que nasce do amor fraterno e desinteressado nos pode ajudar a superar as crises pessoais, sociais e mundiais”, defende Francisco.
“O vírus da guerra é mais difícil de derrotar”

A guerra na Ucrânia “juntamente com todos os outros conflitos espalhados pelo globo, representa uma derrota não apenas para as partes diretamente envolvidas mas também para a humanidade inteira”, diz Francisco. Foto © Olha Romaniuk.
Superado “o pior da noite da pandemia de covid-19, eis que se abateu sobre a humanidade uma nova e terrível desgraça”, assinala o Papa na sua mensagem, referindo-se à guerra na Ucrânia. “Assistimos ao aparecimento doutro flagelo – uma nova guerra – comparável em parte à covid-19 mas pilotado por opções humanas culpáveis. A guerra na Ucrânia ceifa vítimas inocentes e espalha a incerteza, não só para quantos são diretamente afetados por ela, mas de forma generalizada e indiscriminada para todos, mesmo para aqueles que, a milhares de quilómetros de distância, sofrem os seus efeitos colaterais: basta pensar nos problemas do trigo e nos preços dos combustíveis”, acrescenta.
Francisco reconhece que “não era esta, sem dúvida, a estação pós-covid que esperávamos ou por que ansiávamos” e que esta guerra, “juntamente com todos os outros conflitos espalhados pelo globo, representa uma derrota não apenas para as partes diretamente envolvidas mas também para a humanidade inteira”.
E enquanto para a covid-19 se encontrou uma vacina, “para a guerra ainda não se encontraram soluções adequadas”, lamenta, até porque “o vírus da guerra é mais difícil de derrotar do que aqueles que atingem o organismo humano, porque o primeiro não provem de fora, mas do íntimo do coração humano, corrompido pelo pecado”.
Perante este cenário, o que fazer, então? Francisco retoma a ideia inicial da sua mensagem: “não podemos continuar a pensar apenas em salvaguardar o espaço dos nossos interesses pessoais ou nacionais, mas devemos repensar-nos à luz do bem comum, com um sentido comunitário, como um ‘nós’ aberto à fraternidade universal”, insiste. Na opinião do Papa, “não se pode ignorar um dado fundamental: as variadas crises morais, sociais, políticas e económicas que estamos a viver encontram-se todas interligadas, e os problemas que consideramos como singulares, na realidade um é causa ou consequência do outro”.
Assim, deixa algumas propostas concretas: repassar o tema da garantia da saúde pública para todos; promover ações de paz para acabar com os conflitos e as guerras que continuam a gerar vítimas e pobreza; cuidar de forma concertada da nossa casa comum e implementar medidas claras e eficazes para fazer face às alterações climáticas; combater o vírus das desigualdades e garantir o alimento e um trabalho digno para todos, apoiando quantos não têm sequer um salário mínimo e passam por grandes dificuldades; desenvolver, com políticas adequadas, o acolhimento e a integração, especialmente em favor dos migrantes e daqueles que vivem como descartados nas nossas sociedades.
Tudo isto “na esperança de que, no novo ano, possamos caminhar juntos valorizando tudo o que a história nos pode ensinar”, conclui.