
S. Francisco de Sales.
O Papa Francisco tornou pública uma carta apostólica que é um convite à descoberta de um santo e um “doutor da Igreja” que, segundo o documento, contém múltiplas pistas para viver hoje a alegria da vida cristã.
Intitulada Totum Amoris Est (Tudo pertence ao amor), a carta – divulgada esta quarta-feira, 28, dia em que se completaram quatro séculos sobre a morte de S. Francisco de Sales, patrono dos jornalistas e escritores – sublinha algum paralelismo entre o clima de “mudança de era” que se vivia nas últimas décadas do século XV e nas primeiras do XVI, por um lado, e os tempos atuais, por outro.
As guerras das religiões, a Reforma e a Contra-Reforma, o pós-Concílio de Trento, a abertura ao mundo e a exploração colonial definiram o clima e o contexto da atuação de Francisco de Sales. Este foi, em palavras de Bento XVI, citadas pelo Papa atual, “apóstolo, pregador, escritor, homem de ação e oração; comprometido na realização dos ideais do Concílio de Trento; empenhado na controvérsia e no diálogo com os protestantes, experimentando cada vez mais, para além do necessário confronto teológico, a eficácia da relação pessoal e da caridade; encarregado de missões diplomáticas a nível europeu e de tarefas sociais de mediação e de reconciliação”.
O autor de Introdução à Vida Devota e Tratado do Amor de Deus, obras que marcaram gerações, considera que “é o amor que dá perfeição às nossas obras”.
O Papa explica, na carta apostólica: “através da experiência, [Francisco de Sales] reconhecera o desejo como a raiz de toda a verdadeira vida espiritual e, ao mesmo tempo, como o lugar da sua adulteração. Por isso, bebendo com ambas as mãos da tradição espiritual que o precedera, compreendeu a importância de pôr o desejo constantemente à prova, através dum exercício contínuo de discernimento. O critério último para a sua avaliação, encontrara-o no amor”.
Sobre a relação entre ação e contemplação escrevia o doutor da Igreja: “Sabeis ou deveríeis saber que a contemplação em si mesma é melhor do que a ação e a vida ativa; mas, se na vida ativa se encontrar maior união [com Deus], então esta é melhor. Se uma irmã, que está na cozinha a olhar pelas panelas ao lume, tiver maior amor e caridade do que outra, não será o lume material a detê-la, antes pelo contrário ajudá-la-á a ser mais agradável a Deus. Sucede com bastante frequência estar unido a Deus na ação como se está na solidão; no fim, volto sempre à questão de ver onde se encontre maior amor.”
O Papa Francisco, neste surpreendente documento, desvenda um santo que foi capaz de aproveitar as vicissitudes da vida para “auscultar a vida dos outros e reconhecer, com sagaz discernimento, a atitude interior que une o pensamento ao sentir, a razão aos afetos e que designa pelo nome o ‘Deus do coração humano’”.
Como salienta Francisco, Papa, “foi na escola da Encarnação que [Francisco de Sales] aprendera a ler a história e situar-se nela com confiança”. E acrescenta: “é comovente a sua solicitude em reconhecer como indispensável o cuidado do que é humano”.
Na introdução que faz a esta figura grande da Igreja Católica, o Papa destaca ainda os seus “dotes de mediador e homem de diálogo” e de “inventor de práticas pastorais originais e ousadas, como os famosos ‘panfletos’, afixados por todo o lado e até metidos por baixo da porta das casas”, aspetos que podem ajudar a perceber por que é Francisco de Sales também o padroeiro dos jornalistas e escritores, proclamado como tal em 1923, pelo Papa Pio XI.
De resto, é interessante a atenção que o santo dava à cultura e às pessoas concretas. No prefácio do Tratado do Amor de Deus, escreve: “tive presente a mentalidade das pessoas deste século, e não podia proceder de outra forma; é muito importante ter em conta o tempo em que se escreve.”