
“Hoje faço tudo: zooms, vídeo-chamadas, Skype. Ainda estes dias estive quatro horas à conversa com bibliotecários de Penafiel, do Redondo, de Portalegre, e sei lá donde mais.” Foto © Miguel Veiga.
Aprendi muito – e continuo a apender – nesta pandemia.
Para já, não andar para aí sempre a queixar-me. Como diz um provérbio chinês que eu cito muito: “Se tem solução, por que é que te queixas? Se não tem solução, por que é que te queixas?”
O que não quer dizer que não me apeteça muito de vez em quando dar um berro – mas isso não é queixar-me, é mesmo ralhar: quando vejo pessoas sem máscara ou com a máscara no queixo, ou quando os vejo sem máscara e em bando. Aí, admito, perco a cabeça.
E eu, que era perfeitamente analfabeta em novas tecnologias, hoje faço tudo: zooms, vídeo-chamadas, Skype. Ainda estes dias estive quatro horas à conversa com bibliotecários de Penafiel, do Redondo, de Portalegre, e sei lá donde mais. E foi óptimo.
Mas para lá destas tecnologias, aprendi coisas bem mais importantes.
Aprendi que precisamos muito uns dos outros. Que uma palavra nossa pode fazer toda a diferença. Tenho uma lista de amigos que estão completamente sozinhos e são velhos, para quem eu ligo uma vez por semana. E estamos ali na conversa, e ao fim eles já se riem e sentem-se melhor, como sempre me dizem. E aos amigos que vivem no estrangeiro escrevo-lhes cartas e postais. Há dias o marido de uma amiga minha holandesa, que estava com lúpus, escreveu-me a dizer que ela tinha morrido e que as minhas cartas eram a única coisa que a animavam nestes últimos tempos.

…E de Cabo Verde chegou uma prenda em forma de história, por telefone…. Foto © Miguel Veiga.
E no primeiro confinamento aconteceu-me uma coisa muito engraçada. Liga-me um senhor, de Cabo Verde, a dizer que uma prima minha de Castelo Branco me tinha mandado uma prenda. Então o que era: ele é contador de histórias e as pessoas dão-lhe um número de telefone para ele ligar para lá e contar uma história. Passei meia hora deliciada a ouvi-lo. E no fim ainda me diz “também sou poeta, mas o meu pai é que era um grande poeta”. Pergunto-lhe o nome do pai: Corsino Fortes. Aí só não lhe caí nos braços porque estávamos ao telefone. O Corsino Fortes, para lá de tudo, tinha sido meu colega de faculdade e gostávamos muito um do outro… Grande dia…
E agora, de vez em quando, faço eu o mesmo: ligo para amigos e conto-lhes uma história ou leio-lhes um poema. Quando posso, também gravo vídeos com textos lidos por mim para lhes mandar.
Alice Vieira é escritora