
“Vejo gestos que me encantam. Um cuidado superior com os desprotegidos…” Foto: Voluntários na associação Virar a Página (Braga), a preparar refeições solidárias. © Catarina Soares Barbosa.
Estes duros meses, quase um ano, em que vivemos com a pandemia causada pela covid-19, têm-me levado a refletir sobre tantos e tantos assuntos, temas, coisas… Há algo que tenho tanta vontade de dizer e repetir em público: não percam a esperança – iremos vencer e ultrapassar esta crise pandémica!
A saúde e o bem-estar dos nossos entes queridos, como também daqueles mais frágeis, em todos os sentidos e padrões, é uma das minhas profundas e grandes inquietações. E não posso esquecer que o actual presente me conduz à incerteza do futuro no que respeita ao trabalho, gravemente lesado devido à pandemia. Curiosamente, e em simultâneo com um punhado de reticências, nasceram grandes aprendizagens, e refiro-me ao facto irrefutável de que vivemos cada dia com uma maior intensidade interior. Descobri/mos que, afinal, sei/sabemos fazer muito além do que está relacionado com a minha/nossa atividade profissional.
Quando é que este flagelo irá passar e quando poderemos regressar à vida normal? É uma pergunta que coloco várias vezes. Como homem de fé a resposta que encontro para mim e para os meus, tal como a que tenho para todos ao meu redor, é para acreditarmos nos desígnios de Deus Bem Dito e que tenhamos confiança que todos – e acredito mesmo que sejam todos, muito particularmente cientistas, médicos, enfermeiros e pessoal hospitalar – estão a trabalhar de sol-a-sol, incansavelmente, no sentido de parar e travar esta terrível pandemia.
Vejo gestos que me encantam. Que me comovem. Uma forte e intensa solidariedade entre vizinhos. Um cuidado superior com os desprotegidos, conhecidos ou desconhecidos. Infelizmente, os meus olhos também alcançam gestos diferentes, gestos que me revoltam e que traduzem o quanto o Homem ainda precisa de caminhar para ser fraterno. Não posso deixar de mencionar essa gula cega pela vacina de tantos que não constavam na lista de prioridade e passaram à frente numa atitude de puro egoísmo.
A pandemia lembra-nos a nossa insignificância diante do universo, ensina-nos que devemos cuidar mais e mais dos que estão na idade de ouro e daqueles que não possuem família. Trouxe-nos, este vírus, não só o medo permanente da morte, como também a solidão iminente, de estarmos mais connosco do que antes.
Creio que devemos mudar, em cada um de nós e na nossa vida colectiva, o egocentrismo e a urgência de apenas pensar no nosso umbigo. A nossa vida tem tanta importância como a vida dos outros e sem a vida dos outros a nossa vida fica mais frágil.
Atrás de uma tragédia sanitária vem sempre uma crise social e económica. É uma verdade indubitável. Parece-me importante prestar atenção, muita atenção, aos sectores que têm sido mais castigados de entre os quais relevo, por exemplo, o turismo e a restauração. E arranjar soluções para que não se deixe afundar dois setores que são de imensa relevância para um país que se quer ligado ao mundo.
Isaac Assor é oficiante dos serviços religiosos na Sinagoga Shaaré Tikva (Portas da Esperança), em Lisboa