
Os jornalistas Maria Ressa e Dmitry Muratov foram os escolhidos entre 329 nomeações ao Prémio Nobel da Paz deste ano.
“Pelos seus esforços para salvaguardar a liberdade de expressão, que é uma pré-condição para a democracia e uma paz duradoura”, os jornalistas Maria Ressa, das Filipinas, e Dmitry Muratov, da Rússia, partilham o Prémio Nobel da Paz 2021. A novidade foi anunciada esta sexta-feira, 8 de outubro, em Oslo, por Reiss-Andersen, presidente do Comité Nobel e membro da Fundação com o mesmo nome. O prémio constitui um tributo ao jornalismo sério e de qualidade, que investiga e não se cala perante as pressões e os poderes, bem como a todos os jornalistas que procuram pô-lo em prática.
Nos dois casos, estamos perante conceituados profissionais que afrontaram regimes autoritários que perseguem os que publicam o que não convém a quem manda.
Condenada por lei publicada depois do “crime”
Maria Ressa foi em criança para os Estados Unidos e regressou ao seu país natal para chefiar o escritório da CNN nas Filipinas. Em 2012, decidiu fundar o jornal online Rappler, que aposta num jornalismo de investigação que tem posto a nu práticas abusivas de altos funcionários públicos e do governo.
Para o Comité Nobel, Rappler chamou a atenção pública para a “polémica e assassina campanha antidrogas do regime de Duterte”, cujo número de mortes “é tão alto que a campanha se assemelha a uma guerra travada contra a própria população do país”. Ressa e o jornal que dirige também documentaram como as redes sociais estão a ser usadas para “espalhar notícias falsas, assediar oponentes e manipular o discurso público”.
Sobretudo depois de Duterte ter chegado ao poder, o meio de comunicação e a sua principal responsável começaram a ser pressionados pela justiça, acusados de fuga a impostos, ciber-difamação, entre outros motivos. Atualmente encontra-se em liberdade sob fiança, depois de ter sido condenada em 2020 a mais de seis anos de prisão.
Esta condenação levou membros da Igreja Católica e da hierarquia nas Filipinas, um país fortemente católico, a virem a público em apoio de Maria Ressa. Falando criticamente sobre o julgamento de 2020, o bispo Broderick Pabillo, administrador apostólico da arquidiocese de Manila, descreveu o veredicto de culpado como “perseguição” à liberdade de imprensa.
“Essa perseguição é feita usando a lei, com as suas aplicações distorcidas e rígidas, para lhe dar uma aparência de legalidade”, disse Pabillo.
Vale sublinhar que o artigo que levou à condenação de Ressa foi publicado quatro meses antes da lei invocada para a condenar.
Rússia: corrupção, fraudes eleitorais, “fábricas de trolls”
Dmitry Andreyevich Muratov é há décadas um defensor da liberdade de expressão na Rússia, trabalhando, no dizer do Comité Nobel, “em condições cada vez mais desafiadoras”. Em 1993, foi um dos fundadores do jornal independente Novaia Gazeta, sendo desde 1995 o seu editor-chefe.
“O jornalismo baseado em factos e a integridade profissional do jornal – observa o Comité do prémio – tornaram-no uma importante fonte de informações sobre aspetos censuráveis da sociedade russa raramente mencionados por outros meios de comunicação”. Entre os aspetos críticos estão a corrupção, a violência policial, prisões ilegais, fraude eleitoral e “fábricas de trolls”.
Comentando para a agência Tass este reconhecimento, Muratov, que não atendeu a chamada que lhe iria anunciar o prémio, disse que o mérito era da Novaia Gazeta e aproveitou para dedicar o Nobel da Paz aos vários colegas que foram assassinados na Rússia, pelo exercício da sua profissão de jornalista, nomeando-os: “É para Igor Domnikov, para Iura Shchekochikhin, para Anna Stepanovna Politkovskaia, para Nastia Baburova, para Natasha Estemirova, para Stas Markelov. Isto é para eles”.
O Comité Nobel teve de fazer a sua escolha entre 329 nomeações ao Prémio Nobel da Paz de 2021, dos quais 234 eram indivíduos e 95 eram organizações. A opção foi por Maria Ressa e Dmitri Muratov porque “a liberdade de expressão e a liberdade de informação ajudam a garantir um público informado” e esses direitos são “pré-requisitos cruciais para a democracia e proteção contra guerra e o conflito”.
O Prémio vai ser entregue no dia 10 de dezembro, aniversário da morte de Alfred Nobel.