Reportagem na sede em Lisboa

“Pressa” e uma “imensa alegria” entre os voluntários da JMJ, nos últimos dias antes do grande encontro com o Papa

| 25 Jul 2023

Voluntarios trabalham na sede da JMJ Lisboa. Foto Vítor Almeida

Mais do que pressa ou ansiedade, os voluntários da JMJ sentem “uma imensa alegria”, por poderem contribuir para algo “que vai mudar a vida de um milhão de jovens”, para melhor. Foto © Vítor Almeida.

 

A menos de uma semana do início da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), a sede do Comité Organizador Local, em Lisboa, fervilha de vida. Passam poucos minutos das nove da manhã e já há voluntários por todo o lado: uns carregam caixas pelos corredores do antigo edifício militar, outros deambulam ao telefone dando indicações a quem está do outro lado da linha (e possivelmente do mundo!), muitos estão ao computador nas inúmeras salas atribuídas às diferentes equipas, vários reúnem para acertar últimos pormenores. Lá fora, ouve-se um a trautear o hino da Jornada: “Há pressa no ar…”. E há pressa, literalmente, que a Jornada está quase aí. Mas, mais do que pressa ou ansiedade, o que estes voluntários sentem é “uma imensa alegria”, por poderem contribuir para algo “que vai mudar a vida de um milhão de jovens”, para melhor.

Quem o diz é Audrey Abatol, 33 anos, que no ano passado decidiu deixar o seu emprego em Cebu (Filipinas) para ser voluntária de longa duração na JMJ Lisboa 2023. Quando a JMJ aconteceu em Manila, a capital do seu país, ela tinha apenas cinco anos, mas aquela foi a Jornada mais participada da História (cerca de quatro milhões de jovens), e deixou “marcas profundas” na sociedade e em si própria, reconhece.

Apesar de ser de uma família “católica praticante”, Audrey considera que foi durante muito tempo uma “católica passiva”. “A verdade é que, devido a tudo o que ouvia sobre a JMJ de Manila, cresci com uma grande admiração por João Paulo II e tinha muita vontade de participar numa Jornada”, conta.

Depois de ser voluntária de curta duração na JMJ do Rio de Janeiro, em 2013, percebeu o que realmente acontecera: “Deus estava a convidar-me a descobrir mais a fé”. Voltou a inscrever-se na Jornada seguinte – Cracóvia 2016 – desta vez como peregrina. “Foi aí que Deus escavou bem fundo e senti que Ele me chamava a ser missionária”, recorda com emoção. Seis meses depois, juntou-se à comunidade Pure Heart Philipinnes, onde integrou missões junto dos jovens da sua ilha com o objetivo de “dar a conhecer a teologia do corpo” e aquilo que aprendera de João Paulo II: “Cada um de nós é uma bênção e tem a sua dignidade e tem direito a ser amado.”

Em 2021, aceitou trabalhar num colégio dos jesuítas, no aconselhamento vocacional. Licenciada em Psicologia, Audrey estava a gostar deste novo trabalho, “mas a chama da missão continuava acesa, e a queimar cada vez mais”. Quando um amigo lhe disse que seria voluntário na JMJ de Lisboa, sentiu que tinha de o acompanhar. Ele acabou por inscrever-se como voluntário de curta duração e só chegou no fim de semana passado, ela está em Lisboa desde novembro.

 

“Isto é a minha família”

Audrey Abatol, voluntaria JMJ Lisboa 2023. Foto © Clara Raimundo

Audrey Abatol, 33 anos, deixou o seu emprego em Cebu (Filipinas) para ser voluntária de longa duração na JMJ Lisboa 2023. Foto © Clara Raimundo/7MARGENS.

 

Audrey não se arrepende da decisão que tomou. “Muitas pessoas pensam que isto é uma loucura… Fazer 27 horas para atravessar o mundo e vir para aqui. Mas em todas as jornadas, senti sempre: ‘Isto é a minha família. Deus realmente ama cada um de nós e somos parte de uma mesma grande Igreja’”, conta. É essa mesma sensação que garante que os participantes terão. Porque “esta experiência muda a tua vida, muda-te para sempre, para melhor”.

É para que essa mudança também aconteça nas vidas das centenas de milhar de jovens esperados em Lisboa na próxima semana que Audrey tem estado a trabalhar. Integrada na equipa Caminho 23, a sua missão era concretizar “o sonho do Papa Francisco” de que todos os países estivessem representados na JMJ em Lisboa, tendo ficado encarregue de contactar as regiões da Ásia e Oceânia. “Conseguimos atingir o nosso objetivo”, diz, com um sorriso vitorioso. “Há países que são tão pequenos ou estão a atravessar tantas dificuldades económicas e políticas que a nossa ajuda é mesmo determinante”, sublinha. “Agora, preparamo-nos para acompanhá-los em Lisboa, para garantir que regressam aos seus países com a certeza de que valeu mesmo a pena.”

A trabalhar numa equipa completamente diferente, a dos Bispos, Juliet Amah chegou também em novembro de 2022, vinda do Gana, onde deixou o emprego como administrativa no Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar (SECAM). Devido à experiência profissional e ao facto de falar fluentemente inglês e francês por ter crescido entre o Togo e o Gana, foi fácil atribuir-lhe uma missão: “Tomar conta dos bispos, da inscrição à estadia, passando pelo transporte e tudo aquilo de que precisam”, descreve. De resto, Juliet já tinha integrado esta mesma equipa em Cracóvia, na sua primeira Jornada, nessa altura como voluntária de curta duração, experiência “maravilhosa” que a deixou com “vontade de mais”.

Juliet Amah, voluntária JMJ Lisboa 2023. Foto © Clara Raimundo

Juliet Amah, 41 qanos, veio do Gana para acompanhar os bispos desde o processo de inscrição até à sua partida de regresso a casa. Foto © Clara Raimundo/7MARGENS.

 

Percebe-se pelo brilho dos seus olhos, mas faz questão de o dizer por palavras: está “extremamente feliz”, porque nesta JMJ “quase todos os países vão estar representados por bispos” – estão inscritos mais de 800, para já – e porque “está tudo a postos para os receber”, mas sobretudo porque se sente “realizada”.

Reconhecendo que não foi fácil adaptar-se a Portugal, a começar pelo clima e pela língua, e a terminar na comida “muito menos picante”, Juliet, que acaba de fazer 41 anos, só tem pena de não ter podido participar nas Jornadas quando era mais jovem. “Para os jovens de África, viajar para a Europa ou para a América é sempre muito dispendioso, além de ser mesmo muito complicado conseguir os vistos”, lamenta.

 

Tornar a Jornada mais próxima

É também para esses jovens, aqueles que não conseguem vir, que Luís Carlos, voluntário vindo da Colombia, está a trabalhar. Integrado na equipa de Comunicação, é um dos designers gráficos responsáveis pelas imagens que vão sendo publicadas diariamente no site e nas redes sociais da JMJ Lisboa 2023.

Se até agora o principal objetivo do seu trabalho era cativar o maior número de jovens a participar, a partir deste momento “a grande missão é estar perto daqueles que participam, mas também tornar a Jornada próxima daqueles que não podem vir”, explica.

Em Lisboa desde Fevereiro deste ano, Luís Carlos, 31 anos, ex-seminarista, compara o trabalho da sua equipa ao do semeador de uma das parábolas contadas por Jesus: “As imagens que desenhamos e publicamos são como as sementes e nós somos como os semeadores, que as lançamos e esperamos que elas germinem… Não vemos onde caem essas sementes, mas milhares de jovens vão acolhê-las e esperamos que germinem neles, que gerem neles alguma ação, alguma mudança”.

Enquanto Audrey e Juliet sentem que a maior parte do seu trabalho já está feito, Luis sente que, a cada dia que a Jornada se aproxima, “a urgência em dar cumprimento às tarefas é cada vez maior”. “E quando o Papa chegar o nosso trabalho vai ter de ser quase imediato”, assinala. “É um desafio grande, mas queremos mesmo transformar os meios digitais numa oportunidade, para que esta seja a Jornada mais próxima do maior número de jovens possível, mesmo que seja através dos seus smartphones”.

Luis Carlos, voluntário JMJ Lisboa 2023. Foto © Clara Raimundo

Luis Carlos, colombiano, já foi seminarista e trabalha desde fevereiro como designer gráfico na equipa de comunicação. Foto © Clara Raimundo/7MARGENS.

 

“Experimentei aqui um pedacinho de ceú”

Na mesma equipa que Luis, mas a trabalhar como tradutora, está Danielle Danowski, dos Estados Unidos da América. Consciente da importante missão que ainda tem pela frente, que “poderá implicar a grande responsabilidade de traduzir palavras dos bispos e do Papa durante a Jornada”, esta professora de Geografia de 37 anos reconhece que ser voluntário na JMJ exige sacrifícios, “mas o que se recebe é muito, muito mais do que se dá”.

Danielle, que cresceu no Michigan numa família luterana, se converteu ao catolicismo aos 12 anos, e “leu tudo o que havia para ler de João Paulo II” durante a adolescência, sabe do que fala. Esta é já a sua quarta Jornada (esteve em Madrid 2011 como peregrina, e nas seguintes – Rio de Janeiro, Cracóvia e Panamá – como voluntária) e garante: “A Jornada tem um impacto enorme na vida dos voluntários. Além do trabalho que desenvolvemos, rezamos todos os dias juntos, vamos à missa juntos, almoçamos juntos, aqui em Portugal fomos a Fátima a pé… E há algo maior que nos une a todos, é uma atmosfera verdadeiramente especial a que se vive na preparação da Jornada.”

No Rio, teve oportunidade de fazer parte do grupo de jovens que almoçou com o Papa num dos dias da JMJ. Desta vez, o mais provável é que só o veja “de muito longe”, contando que os turnos do trabalho como tradutora lhe permitam ir à vigília ou à missa final presididas por Francisco. Mas Danielle não está preocupada. “A experiência já valeu a pena, e mesmo que regressasse agora à minha vida ‘normal’ eu já estaria feliz”, diz, “porque já experimentei aqui um pedacinho de céu”.

Danielle Danowski, voluntária JMJ Lisboa 2023. Foto © Clara Raimundo

Esta é já a quarta Jornada em que a norte-americana Danielle Danowski participa, e a terceira como voluntária. Foto © Clara Raimundo/7MARGENS.

 

Para Rosa Pedroso Lima, porta-voz da JMJ Lisboa 2023, não restam dúvidas: “os voluntários são a base fundamental da construção do encontro”. A responsável, que tem acompanhado de perto o trabalho dos cerca de 700 voluntários que estão na sede da Jornada, diz que foi pessoalmente surpreendida pela “generosidade imensa que estas centenas de pessoas demonstraram ao darem o seu tempo, experiência e vida ao serviço da construção da JMJ”.

Neste momento, contabilizando todos os voluntários – de longa e curta duração, centrais e paroquiais – são já perto de 32 mil. “E foi precisamente aqui que começou o espírito da Jornada”, assinala. “Gentes de todas as idades (porque não há só voluntários jovens) que aceitaram ‘partir apressadamente’ e ultrapassaram obstáculos para abraçarem uma tarefa de transformação. E essa partilha é já uma conquista”, conclui.

 

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