
Fachada da Igreja San Domenico, em Martina Franca, a primeira a ser assaltada. Foto © Vito Manzari:Wikimedia Commons
Fereidoun, um afegão de 31 anos, não comia há dias. Por isso decidiu voltar a roubar o conteúdo de uma caixa de esmolas. Após a igreja de S. Domingos, foi a vez da do Monte Purgatório, ambas em Martina Franca, (próximo do porto de Brindisi, no sul de Itália, a 330 quilómetros de Nápoles e 500 de Roma).
É uma história de caridade e de resgate, escreve Marina Luzzi no jornal Avvenire, que publicou a história, traduzida por Rui Jorge Martins na página do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.
Mas esta é também “uma história que denuncia um sistema, de acolhimento, que viu muitos migrantes encontrar-se de um dia para o outro na rua, mesmo tendo requerido asilo político”, acrescenta a jornalista.
No assalto, as câmaras de videovigilância filmaram Fereidoun, que acabou detido pela polícia. O padre Martino Mastrovito descobriu-o, e, depois de o ter denunciado, pediu para lhe falar. A história do afegão resumia-se a privações e fome, “aquela que é verdadeira, que faz doer o estômago, e nenhum de nós sabe o que faria, como reagiria perante este estado de indigência”.
“Fiquei muito sensibilizado quando se justificou, dizendo que preferiu roubar uma igreja sem fazer mal a ninguém, em vez de roubar uma idosa. Quer dizer que tinha o sentido da gravidade do que estava a fazer. Reiterou-me que ninguém o ajudava, e eu disse-lhe que ele nunca tinha pedido ajuda, porque se o tivesse feito, teria recebido seguramente mais do que os oito euros e quarenta e cinco cêntimos que estavam na caixa de esmolas”, contou o padre ao Avvenire.
Martino Mastrovito arranjou então um lugar para Fereidoun poder dormir e ofereceu-lhe a possibilidade de resgate. Agora, em conjunto com os seus colaboradores e a comunidade, está a tentar obter-lhe um trabalho.
“Tenho o mandato de fazer um projeto para tornar uma ala [da instituição de acolhimento que coordena], que já usamos para as pessoas sem-abrigo, um lugar para ampliar a hospitalidade, que viva graças à Providência”, explica.
O pároco sonha que o espaço se torne “um lugar da solidariedade”, inspirado na encíclica Fratelli tutti, nome que quer dar ao projeto.
“Este homem precisava de uma oportunidade, e estamos a tentar dar-lha. Não esperava todo este clamor, e tenho a dizer a quem levantou algumas polémicas sobre a sua nacionalidade ou sobre a sua religião [é muçulmano], que nós ajudamos todos, quem quer que peça, nacional ou estrangeiro, cristão ou de outra fé”, afirmou o padre Martino, citado ainda no jornal italiano.
Fereidoun, cujo nome curiosamente se lê “freedom” (liberdade), confiando-se a colaboradores próximos do pároco, disse-lhe: “Bendigo as câmaras, porque Deus, apesar do meu gesto, usou-as para ajudar-me.”

Lenda de São Martinho em sombras chinesas. Ilustração da revista Coisas de Criança reproduzida de vídeo disponível no YouTube.