
Francisco dedicou a homilia na missa do segundo dia ao tema da paz, e a explicar como é possível alcançá-la. Foto reproduzida a partir do Twitter @presidence_RDC.
“Esengo – alegria!” Assim iniciou Francisco a sua homilia na missa da manhã desta quarta-feira, 1 de fevereiro, que decorreu no aeroporto Ndolo, em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo (RDC). E a mesma palavra descreve na perfeição o ambiente que se viveu do início ao fim da celebração. Um ambiente pleno de cor, música e dança, em que ressoou a mensagem do Papa: sim, a paz é possível, se escolhermos “romper a espiral da violência”.
“Trata-se duma opção: é dar espaço a todos no coração, é acreditar que as diferenças étnicas, regionais, sociais, religiosas e culturais vêm em segundo lugar e não são obstáculo; que os outros são irmãos e irmãs, membros da mesma comunidade humana; que cada um é destinatário da paz trazida ao mundo por Jesus”, afirmou Francisco perante os mais de um milhão de fiéis, mil padres e nove mil voluntários que preenchiam o recinto.
Agradecendo a presença de todos e assegurando que é grande a sua felicidade por finalmente estar na República Democrática do Congo, o Papa dedicou toda a sua alocução ao tema da paz, e a explicar como é possível alcançá-la.
O caminho da paz, disse então, nasce do perdão. E “o perdão nasce das feridas”, quando essas feridas “não deixam cicatrizes de ódio, mas tornam-se o lugar onde se dá espaço aos outros acolhendo as suas debilidades”, acrescentou o Papa. “Não se trata de esquecer tudo como se nada fosse, mas de abrir aos outros o próprio coração com amor.”
“Depõe as armas, abraça a misericórdia”

Dirigindo-se a todos os congoleses, Francisco assegurou que Jesus conhece as feridas deles. “Ele conhece as tuas feridas, conhece as feridas do teu país, do teu povo, da tua terra”, afirmou o Papa, reconhecendo que “são feridas que ardem, continuamente infetadas pelo ódio e a violência, enquanto o remédio da justiça e o bálsamo da esperança parecem nunca mais chegar”.
Depois, dirigindo-se em particular aos cristãos, disse em jeito de oração: “Que hoje seja o momento de graça para acolher e viver o perdão de Jesus! Seja o momento certo para ti, que carregas um fardo pesado no coração e precisas que seja tirado para voltar a respirar. E que seja o momento propício para ti, que, neste país, te dizes cristão e todavia praticas a violência; a ti diz o Senhor: ‘Depõe as armas, abraça a misericórdia'”.
E em seguida deixou uma sugestão aos presentes: “por que não escrever no vosso quarto, na vossa roupa, no exterior da vossa casa as suas palavras: A paz esteja convosco? Mostrai-as; serão uma profecia para o país, a bênção do Senhor sobre quem encontrais. A paz esteja convosco: deixemo-nos perdoar por Deus e perdoemo-nos entre nós!”.
Além do perdão, também a comunidade é uma “nascente da paz”, sublinhou o Papa na sua homilia. “Não há cristianismo sem comunidade, tal como não há paz sem fraternidade”, disse. E, alertando para o risco que muitos correm de “estar juntos, mas caminhar sozinhos, procurando na sociedade, mas também na Igreja, o poder, a carreira, as ambições”, Francisco afirmou que “o caminho é partilhar com os pobres: tal é o melhor antídoto contra a tentação de nos dividir e mundanizar”.
De acordo com o Papa, a terceira fonte da paz é a missão. “Irmãos, irmãs, somos chamados a ser missionários de paz, e isto nos encherá de paz”, assegurou. E insistiu: “É verdade! Enviados por Cristo, os cristãos são chamados, por definição, a ser consciência de paz no mundo”, e “sobretudo testemunhas de amor”, em vez de “indivíduos à procura dos próprios interesses”. Por isso, concluiu, “escolhamos ser testemunhas de perdão, protagonistas na comunidade, pessoas em missão de paz no mundo”.

A multidão aplaudiu as palavras do Papa e a celebração, em rito zairense, prosseguiu com o coro de 700 vozes a entoar cânticos nos quatro idiomas do país (Kikongo, Lingala, Tshiluba e Suaíli), enquanto um grupo de crianças fazia as respetivas coreografias em frente ao altar-palco.
O recado do cardeal Besungu

No final, o arcebispo de Kinshasa, cardeal Fridolin Ambongo Besungu, tomou a palavra para expressar a sua gratidão pela “bela e grandiosa missa” celebrada pelo Papa.
Reconhecendo que “o povo congolês hoje enfrenta uma crise multifacetada, conflitos armados, especialmente no leste do país, crise económica e miséria social”, o cardeal Besungu disse que os congoleses continuam, no entanto “a ser um povo confiante e cheio de esperança” e que “a presença reconfortante” do Papa “ao lado do seu povo sofredor é um verdadeiro incentivo”.
Na presença do presidente da República da RDC, Félix Antoine Tshisekedi Tshilombo, e dos representantes de diversas forças políticas, o cardeal recordou que a visita do Papa Francisco ao país “está a acontecer num ano eleitoral, que muitas vezes é uma fonte de tensão social e política” no país. “Com a mensagem que o senhor nos dirigiu sobre o tema ‘Todos reconciliados em Cristo’ e confiando nas suas orações, esperamos ver eleições livres, transparentes, inclusivas e pacíficas em nosso país este ano”, sublinhou.