
Visão do inferno no painel do altar da Basílica da Santíssima Trindade, em Fátima. Obra da autoria do padre Marko Ivan Rupnik, que está a ser acusado de abusos. Foto © António Marujo/7Margens
Quando o caso Rupnik se tornou público no início de Dezembro do ano passado, ouvimos declarações de alguns altos representantes da Companhia de Jesus que se apressaram a sublinhar, e passo a citar: “Em primeiro lugar, não há menores envolvidos. Por outras palavras, trata-se de problemas entre adultos.” Em suma, dá-se a entender que aqui, neste caso, não aconteceu nada.
Desde então, temos assistido a acontecimentos que levaram as vítimas a encontrarem-se cada vez mais abandonadas à sua sorte, até que, no final de Setembro passado, assistimos ao que acreditávamos ser impossível: o cardeal Angelo Donatis, vigário geral da diocese de Roma, assinava um documento que deixava Rupnik imaculado e, portanto, impune.
Publiquei um artigo intitulado Rupnik, o protegido, porque essa era a realidade. Agora isso mudou. Rupnik já não é o protegido. Francisco levantou a prescrição para que se leve a cabo um novo processo.
Esperança para as vítimas; esperança para refazer um sistema que demonstra ter demasiadas falhas; esperança para uma Igreja que necessita ser reconhecida pela misericórdia e pela compaixão; esperança em poder iniciar processos de perdão e reconciliação.
Esperança de que todas as partes envolvidas reflitam porque, embora os abusos se deem entre adultos, não são um affair; esperança em que se incremente a atenção nos processos de seleção de candidatos e durante a formação porque, mesmo especialistas em acompanhamento, podem deixar passar um lobo inadvertidamente; e esperança também de que Rupnik receba os cuidados psiquiátricos e espirituais de que necessita.
O caso Rupnik também deveria marcar uma nova era na atenção às vítimas e fazer-nos reflectir sobre a necessidade de que não haja prescrição para qualquer tipo de abuso. Seja de que tipo for.
Cristina Inogés Sanz é teóloga e integra a comissão metodológica do Sínodo da Igreja Católica. Este texto foi inicialmente publicado na revista Vida Nueva. Tradução de Júlio Martin.